Prisões de ativistas que se manifestam contra o governo Bolsonaro têm se tornado cada vez mais comuns. Muitas dessas detenções têm como base a Lei de Segurança Nacional (LSN), mecanismo criado na ditadura militar para punir opositores ao regime.
Apesar de a Câmara dos Deputados ter aprovado, em maio, o texto-base de um projeto que extingue a LSN e cria a Lei de Defesa do Estado Democrático, a matéria ainda precisa ser apreciada pelo Senado. A herança da ditadura militar, portanto, segue em voga e sendo usada contra críticos de Bolsonaro.
Foi essa a lei utilizada, por exemplo, no inquérito policial aberto contra o influenciador Felipe Neto pelo fato de ele ter chamado Bolsonaro de "genocida". O mesmo mecanismo serviu de base para a detenção do ativista Rodrigo Pilha, que estendeu uma faixa de protesto contra o presidente, e também para a prisão, em março, de um jovem de Uberlândia que fez uma postagem crítica, em tom de piada, contra o titular do Palácio do Planalto.
André Mendonça e a explosão de inquéritos
Dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) e repassados à Fórum revelam que o número de inquéritos policiais abertos com base na Lei de Segurança Nacional explodiram durante a gestão de André Mendonça no Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).
Mendonça teve, recentemente, seu nome confirmado pelo presidente Jair Bolsonaro como indicado para a vaga deixada por Marco Aurélio Mello, que se aposentou, no Supremo Tribunal Federal (STF).
Entre 2020 e 2021, período em que Mendonça comandou o MJSP - em março deste ano ele foi nomeado advogado-geral da União -, foram abertos 58 inquéritos policiais com base na LSN. Somando o ano de 2019, quando Sérgio Moro era o titular da pasta, o total de inquéritos com base na lei oriunda da ditadura salta para 84.
Para se ter uma ideia, entre 01/01/2000 e 08/04/2021, foram registradas a abertura de 187 inquéritos com base na LSN. Ou seja, o número de procedimentos abertos somente durante o governo Bolsonaro representa 42,9% do total - sendo 29,9% ao longo da gestão de Mendonça na Justiça.
Na resposta à solicitação de Ivan Valente sobre o total de inquéritos abertos com base na LSN, o Ministério da Justiça se recusou a fornecer informações sobre quem foram os autores dos pedidos de investigação, seus alvos e quais foram os desfechos.
Lei de Defesa do Estado Democrático
A Câmara dos Deputados aprovou, em maio, o texto-base da Lei de Defesa do Estado Democrático, projeto que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN).
A proposta tipifica no Código Penal, por exemplo, crimes contra as instituições democráticas; o funcionamento das eleições; e a cidadania. Entre os crimes estão golpe de Estado, interrupção do processo eleitoral, comunicação enganosa em massa e atentado ao direito de manifestação.
A Lei de Segurança Nacional é de 1983, período em que o país ainda vivia sob ditadura militar. A deputada Margarete Coelho (PP-PI), relatora da proposta, classificou a LSN como “último bastião de um regime de exceção”.
O texto-base tipifica dez novos crimes: atentado à soberania; atentado à integridade nacional; espionagem; abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; interrupção do processo eleitoral; comunicação enganosa em massa; violência política; sabotagem; atentado a direito de manifestação.
Não serão considerados crimes contra o Estado Democrática de Direito: manifestação crítica aos poderes constitucionais; atividade jornalística; reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, reuniões, greves, aglomerações ou qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais.
A matéria ainda precisará passar pro apreciação do Senado para, se aprovada, entrar em vigor.