Entidades ligadas à EBC querem que MPF investigue aluguel milionário de novela bíblica da TV Record

A TV Brasil contratou a novela “Os Dez Mandamentos”, que já passou na TV Record. Por cada um dos 242 episódios, Bolsonaro vai pagar R$ 13.252,35 à emissora do bispo Edir Macedo

Jair Bolsonaro e Edir Macedo - Foto: Reprodução/YouTube
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A Frente em Defesa da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) e da Comunicação Pública publicou carta aberta onde pede que o Ministério Público Federal investigue os R$ 3,2 milhões pagos pela estatal à Record TV para exibir a novela bíblica “Os Dez Mandamentos”.

Após desistir de acabar com a TV Brasil – chamada por ele de TV Lula na campanha eleitoral -, Jair Bolsonaro (Sem partido) transformou a emissora pública em um antro para agradar apoiadores na mídia aliada.

A partir desta segunda-feira (5), a TV Brasil passou a transmitir diariamente a novela Os Dez Mandamentos, que foi ao ar pela TV Record em 2015.

Por cada um dos 242 episódios, Bolsonaro vai pagar R$ 13.252,35 à emissora do bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd).

De acordo com o documento, “a exibição da novela é mais uma amostra das interferências na EBC pelo governo Bolsonaro”.

E prossegue: “este licenciamento fere os princípios, previstos na lei, da complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal, visto que a novela já foi exibida em emissora comercial”.

A EBC, por sua vez, em resposta à coluna de Mônica Bergamo, afirmou que “a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) informa que está ampliando a grade de programação da TV Brasil com o desenvolvimento de novos conteúdos proprietários como jornalismo e programas culturais. Vale informar que a EBC sempre adquiriu conteúdos de outras emissoras, produtoras nacionais e internacionais”.

Leia, abaixo, a íntegra da carta aberta da Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública:

O anúncio oficial de que a TV Brasil exibirá a novela “Os 10 mandamentos”, produzida e veiculada diversas vezes na RecordTV, representa uma afronta à Lei 11.652/2008, que criou a Empresa Brasil Comunicação (EBC), determinando nos objetivos da empresa pública que “é vedada qualquer forma de proselitismo na programação das emissoras públicas de radiodifusão”.

A exibição da novela é mais uma amostra das interferências na EBC pelo governo Bolsonaro. Após nomear militares sem aptidão para assumir um conglomerado de mídias públicas, a nomeação do atual mandatário, Glen Valente, ex-integrante da Secretaria de Comunicação de Bolsonaro e ex-diretor do SBT, busca o total controle e desvirtuamento da missão da empresa, que parece ser preparada pela própria direção para ser privatizada.

Este licenciamento fere os princípios, previstos na lei, da complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal, visto que a novela já foi exibida em emissora comercial; da promoção do acesso à informação por meio da pluralidade de fontes de produção e distribuição do conteúdo; e do estímulo à produção regional e independente.

Quando solicitados, gestores da EBC se recusaram a informar os valores pagos pela exibição da novela. O contrato foi encontrado no Diário Oficial da União com o pagamento de R$ 3,2 milhões pela exibição da produção. A medida levanta sérias suspeitas sobre possíveis favorecimento a determinados grupos por meio da aquisição de um produto que não coaduna com a missão da empresa, feita sem licitação ou qualquer tipo de concorrência pública.

Além disso, a temática da novela - a história bíblica - tem sido apropriada pela Igreja Universal, por meio da RecordTV, para amplificar a ideologia e o conservadorismo de um único segmento religioso cristão, o neopentecostalismo na sociedade. A ação que também desvirtua os princípios legais da EBC da não discriminação religiosa.

Em 2014, o Conselho Curador da EBC, extinto ainda no governo Temer, garantia a participação popular na empresa e instituiu uma faixa da diversidade religiosa após audiência e consulta pública sobre o tema, inovando a discussão sobre pluralidade e diversidade de crença no país. Na época, por meio de concurso, foram escolhidas duas séries abordando a religião e espiritualidade. A exibição da novela bíblica, com a visão específica de uma igreja, vai contra todos esses princípios de tolerância e de respeito à diversidade religiosa brasileira que, no próprio cristianismo, é muito mais amplo que uma única linha do segmento evangélico.

O anúncio da exibição da novela ocorre no momento em que a própria existência da EBC está ameaçada pelo governo federal. A empresa foi incluída recentemente no Plano Nacional de Desestatização (PND), com o objetivo de ter seu patrimônio vendido para posterior privatização ou mesmo sua extinção, numa clara afronta à previsão Constitucional de existência de um sistema público de comunicação.

Esperamos que o Ministério Público Federal tome as providências necessárias, investigue e solicite as devidas punições para os responsáveis por irregularidades.


Leia, abaixo, a íntegra de nota enviada à coluna pela EBC:

A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) informa que está ampliando a grade de programação da TV Brasil com o desenvolvimento de novos conteúdos proprietários como jornalismo e programas culturais.

Vale informar que a EBC sempre adquiriu conteúdos de outras emissoras, produtoras nacionais e internacionais. Entre os produtos adquiridos pela EBC, por exemplo, estão o programa “Brasil Visto de Cima” das Organizações Globo e as séries britânicas “Os Mosqueteiros” e “Sherlock” licenciados pela BBC.

Fizemos uma avaliação detalhada da importância de ter um conteúdo com audiência recorrente na grade. A novela “Os Dez Mandamentos” cumpre esse objetivo, além de agregar valor à grade e à emissora.

A Empresa reitera seu compromisso com os princípios legais norteadores da radiodifusão pública brasileira, inclusive a não discriminação religiosa, assegurando obras com finalidades educativas, artísticas, culturais, científicas e informativas buscando maior atenção e competividade na busca do interesse do maior número de telespectadores."