"Não sei o que deu na cabeça do Bolsonaro", diz Marco Aurélio, do STF, sobre ação contra governadores

"O presidente parece gostar de crise", disse o ministro, indicando que a Corte vai rejeitar a ação que pede o fim das medidas restritivas decretadas por governos estaduais

Marco Aurélio durante sessão do STF (Foto: Carlos Moura/SCO/STF)
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O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), sinalizou em entrevista ao jornalista Josias de Souza, neste sábado (20), que a Corte deve rejeitar a ação protocolada por Jair Bolsonaro que tenta derrubar os decretos de restrição de locomoção de pessoas adotados pelos governadores do Distrito Federal, da Bahia e do Rio Grande do Sul.

"Não sei o que deu na cabeça do Bolsonaro para entrar com essa ação", disse o ministro, que ainda sugeriu que a motivação de Bolsonaro ao entrar com a ação é responsabilizar o próprio Supremo pelas consequências da pandemia.

"O presidente quer atribuir responsabilidade ao tribunal, como ele vem fazendo. Mas o que ele tem que fazer de verdade é coordenar os trabalhos de enfrentamento da crise sanitária. Precisa assumir a liderança. Mas o presidente, ao invés de estabelecer a coordenação nacional da crise bate de frente com os governadores. Qual é o objetivo? O presidente parece gostar de crise", disparou o magistrado.

As medidas de restrição, rechaçadas por Bolsonaro, vêm sendo adotadas por governadores de todo o país como forma de conter o avanço da pandemia diante da ineficiência do governo federal. Especialistas apontam que, sem vacinação em massa, a única medida eficiente para amenizar os efeitos da crise sanitária é o isolamento social. O presidente, no entanto, ataca essas medidas como forma de desviar a atenção e se eximir da responsabilidade pelo agravamento da pandemia no Brasil, que atualmente é o novo epicentro mundial do vírus.

"Meu exército não vai cumprir decreto"

Em conversa com apoiadores na manhã desta sexta-feira (19), Bolsonaro pregou desobediência civil contra os decretos de governadores e prefeitos pelo isolamento social para conter as medidas de propagação do coronavírus.

Em tom de ameaça, Bolsonaro se referiu a “meu Exército” em relação às Forças Armadas, incitando apoiadores a transgredirem as medidas de contenção da pandemia, e disse que “jamais decretaria o lockdown no Brasil”.

“Jamais decretaria o lockdown. E tem mais: o meu Exército não vai para a rua para cumprir decreto de governadores. Não vai. Se o povo começar a sair de casa, entrar na desobediência civil, não adianta pedir o Exército, porque meu Exército não vai. Nem por ordem do Papa. Não vai”, afirmou, exaltado.

Pressionando o STF, Bolsonaro sinalizou que pode adotar medidas “duras” caso a Corte não decida a seu favor.

“Onde é que nós vamos parar? Será que o governo federal terá que tomar uma decisão antes que isso aconteça. Será que a população está preparada para uma ação do governo federal dura no tocante a isso? O que é dura? É para dar liberdade para o povo, para dar o direito do povo trabalhar”, disse, voltando a falar de ditadura.

“Não é ditadura, não. Uns hipócritas ai falando de ditadura, uns imbecis. Agora um terreno fértil para ditadura é exatamente a miséria, a fome, a pobreza”, afirmou, voltando a ameaçar: “Vai chegar o momento… eu não gostaria que chegasse o momento, mas vai acabar chegando. Espero que essa minha ação no STF no dia de ontem, que os decretos falam simplesmente em toque de recolher. E o que é toque de recolher? Isso aí é em países ditatoriais. Estão aplicando a legislação de estado de sítio, prevista na Constituição, que não basta eu decretar estado de sítio, o congresso tem que validar embaixo. E governadores e prefeitos humilhando a população dizendo que estão protegendo a vida. Ora, bolas, vocês estão matando a população”.