O PSOL protocolou junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (30), uma ação solicitando que a Corte derrube a decisão da Câmara e do Senado, desta segunda-feira (29), que normatizou o chamado orçamento secreto e suas famigeradas emendas do relator. A prática permite a liberação de dinheiro público para parlamentares não identificados (diferentemente das emendas parlamentares convencionais) e acabou servindo como uma ferramenta espúria para a compra de votos por parte do governo Bolsonaro no Legislativo.
No início do mês, atendendo a uma ação do próprio PSOL, o STF havia suspendido a execução do orçamento secreto e determinado a divulgação dos parlamentares beneficiados com as emendas. Câmara e Senado, no entanto, decidiram manteve os dados dos beneficiados em sigilo.
A nova ação do PSOL aponta que a aprovação da resolução "burla" a decisão da própria Corte. "O Ato Conjunto do Congresso Nacional e o PRN nº 4/2021 não garantem transparência nem publicidade, especialmente porque não permitem relevar quem são os parlamentares requerentes das emendas ao relator-geral", afirma o partido.
A manutenção dessas emendas, segundo a legenda, "não esconde suas intenções de burlar a decisão do STF, ao permitir que apenas as solicitações a partir da vigência do Ato, sejam conhecidas do público".
"A decisão liminar referendada, ao revés do Ato, manda que se conheça, com ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas de relator-geral (RP-9)", prossegue a ação.
Em 2020, as emendas do relator somaram mais de R$ 30 bilhões, enquanto em 2021 a previsão inicial era de R$ 29 bilhões, valor que foi reajustado e diminuído após reuniões de congressistas com a equipe econômica do governo.
Técnicos do Câmara e do Senado, que já haviam se pronunciado de forma contrária a esses valores imensos, afirmam que tal mudança colocará na legalidade um esquema que põe muito poder na mão de um deputado só: o relator-geral do Orçamento.
O que é o orçamento secreto e por que ele é considerado corrupção
Parlamentares atendem a suas bases eleitorais por meio de emendas, que são fatias do orçamento destinadas a algum tipo de obra, projeto ou ação, nas áreas de educação e saúde sobretudo, nos estados e municípios. Para conseguir a liberação desse dinheiro há uma série de burocracias e a obrigatoriedade de se comprovar a real necessidade desses recursos, que são liberados pelo Legislativo.
Essas chamadas emendas podem ser reivindicadas por um só deputado, por uma bancada de um determinado partido ou segmento, ou ainda por comissões de deputados. O processo para liberação do recurso é rígido e para os órgãos de transparência é possível monitorar quem é o parlamentar, ou a bancada, que pleiteou os valores, além de saber qual é o destino do dinheiro.
No entanto, uma nova “espécie” de emenda parlamentar foi criada a partir de 2019, chamada de “emenda do relator”. Tal procedimento é considerado uma aberração em termos de transparência, já que só é possível identificar quem receberá o dinheiro e qual será a aplicação dele, sem revelar quem foi o deputado que o “conquistou”. A emenda vem no nome do relator do orçamento, uma figura genérica que muda de ano para ano na Câmara dos Deputados.
Como o nome do parlamentar que foi “agraciado” com milhões de reais não é revelado, os cientistas políticos e integrantes de órgãos de transparência classificam o controverso instrumento como um verdadeiro esquema de compra de integrantes do Legislativo (parlamentares) por parte do poder Executivo (governo), que passa a distribuir bilhões de reais para deputados que não têm rosto, nem nome, e que em troca votam favoravelmente aos interesses do Palácio do Planalto.
O dinheiro utilizado no pagamento dessas obscuras emendas de relator sai de um montante denominado “orçamento secreto”, que na prática acaba servindo como um fundo (ou um caixa) de onde saem bilhões de reais que “mimam” aqueles deputados que, por acaso, possam dar seus votos aos interesses do presidente da República e de seu governo.