A Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco) divulgou nota, nesta terça-feira (5), em que defende o afastamento do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, por conta das revelações de que ambos mantêm offshores em paraísos fiscais.
De acordo com a entidade, a permanência de Guedes e Campos Neto em seus cargos é "escandalosa". "A divulgação dos documentos do Pandora Papers evidencia outra artimanha dos super-ricos para não pagar impostos como o restante da população brasileira. A revelação da manutenção de offshores por figuras públicas como o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, coloca em xeque a permanência de ambos nos cargos que ocupam", diz um trecho da nota.
Segundo revelação feita na série Pandora Papers, investigação conduzida pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), Guedes e Campos Neto possuem movimentações financeiras através de offshores nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso fiscal no Caribe. Offshore é o termo usado para se referir empresas e contas bancárias abertas em territórios onde há menor tributação.
As denúncias contra o ministro da Economia apontam que ele pode ter lucrado R$ 14 milhões com a valorização do dólar, somente durante o seu mandato à frente da pasta. A Lei de Conflito de Interesses proíbe esse tipo de comportamento. Se o ministro fez investimentos internacionais por meio de sua empresa enquanto já estava no cargo, cometeu crime.
"Possuir offshores em paraísos fiscais representa clara situação de conflito de interesse de duas figuras centrais no comando da política econômica, mesmo não sendo necessariamente crime a propriedade de offshores. Guedes e Campos Neto lucram no exterior com dólar alto enquanto a situação econômica do país se degrada. Com a denúncia tornada pública por vários veículos da imprensa, se guardassem algum vestígio ético, ambos deveriam deixar imediatamente as funções públicas que exercem", argumenta a Fenafisco.
A entidade aponta, ainda, que "as offshores são largamente utilizadas de forma ilícita por empresas e indivíduos para evadir divisas e lavar dinheiro" e propõe, para mitigar o problema, "uma reforma tributária ampla, social e justa, com a tributação dos super-ricos e isenção das camadas mais pobres da sociedade".
"Não é suportável para o Brasil seguir com as atuais regras fiscais que penalizam os mais pobres com sobrecarga de impostos, enquanto os super-ricos têm mais de 70% de sua fortuna blindadas de tributação, sonegam impostos e ainda escondem dinheiro em paraísos fiscais", atesta a federação.
Improbidade administrativa
Parlamentares de oposição também defendem o afastamento de Guedes e Campos Neto de seus cargos através de representações no Ministério Público Federal (MPF).
Uma dessas ações é a protocolada pelo deputado Ivan Valente (PSOL-SP) nesta segunda-feira (4). À Procuradoria da República no Distrito Federal, o congressista aponta suposto crime de improbidade administrativa por parte do ministro da Economia e do presidente do Banco Central.
"Diante da gravidade dos fatos expostos, é imprescindível a instauração de procedimento por parte deste parquet para que sejam apurados os fatos amplamente denunciados pela imprensa e, caso confirmada a existência de empresas em paraísos fiscais em nome do Ministro de Estado da Economia PAULO GUEDES e do Presidente do Banco Central ROBERTO CAMPOS NETO, que seja proposta ação de improbidade administrativa em face de ambos, solicitando seu afastamento e responsabilização pela infração da Constituição e das normas mencionadas, bem como a reparação por eventuais prejuízos causados ao erário e à população", diz um trecho da representação.
Segundo Ivan Valente, são "graves" os indícios de que as empresas dos membros do governo tenham realizado investimentos "cujo valor ou cotação foi afetado pelas decisões do Ministério da Economia e do Banco Central".
O deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) também entrou com representação no MPF para apurar as denúncias. “É um escândalo, é gravíssimo. Viola frontalmente o artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal e, portanto, deveria levar à demissão do Ministro. Nós, da Oposição, vamos propor a convocação do Ministro e do presidente do Banco Central para prestar esclarecimentos à Câmara dos Deputados e entrar com representação no Ministério Público Federal (1ª instância) por improbidade administrativa contra ambos”, afirmou.
Convocação ao Senado e Câmara
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou nesta terça-feira (5), dois requerimentos de convite ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Eles devem explicar por que mantém recursos em contas offshore no exterior.
A Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados já havia aprovado mais cedo a convocação de Paulo Guedes. Ele terá que explicar suas movimentações financeiras no exterior através de offshore em paraíso fiscal.
Os requerimentos aprovados pela CAE dos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jean Paul Prates (PT-RN) foram originalmente apresentados como convocação apenas para Paulo Guedes. Durante a reunião, os parlamentares concordaram convertê-los em convite, estendido também a Roberto Campos Neto. O ministro da Economia e o presidente do Banco Central sugeriram a data de 19 de outubro para a audiência pública.
Apuração preliminar na PGR
Diante da pressão de parlamentares, o procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, abriu nesta segunda-feira (4) uma “apuração preliminar” sobre a notícia de que Guedes e Roberto Campos Neto possuem offshores nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso fiscal no Caribe.
A “apuração preliminar” aberta por Aras sobre o caso não configura uma investigação de fato, mas apenas um processo de “esclarecimentos”, que pode, posteriormente, originar um inquérito.
“Trata-se de uma notícia que foi publicada pela imprensa. Com todo respeito à mídia, não podemos fazer investigações com base em notícias. O PGR fará, como de praxe, uma averiguação preliminar. Vamos ouvir algumas pessoas e requisitar documentos. Depois é que vamos fazer um juízo de valor se é necessário pedir a abertura de um inquérito no Supremo Tribunal Federal, que é o foro para quando há ministros de Estado citados”, disse o PGR.