PM ameaça integrante de bloco: “Não tenho nenhuma cerimônia em quebrar cara de mulher”. Ouça o áudio aqui

Integrantes do Bloco Agora Vai foram agredidos por PMs com cassetetes e balas de borracha. Tudo foi documentado e será enviado à corregedoria

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O Agora Vai é um dos mais tradicionais blocos da retomada do carnaval paulistano. Desfila há 15 anos. Entre os seus integrantes saem vários artistas, músicos, gente que sabe o que faz e faz com paixão. O bloco, como tem sido em todo o carnaval, saiu mais uma vez, na última terça-feira (5), na Zona Oeste da cidade, na região da Barra Funda. Só que, desta vez, a Polícia Militar resolveu intervir no que considerou ser alguma espécie de desobediência e partiu com cassetetes e balas de borracha pra cima dos seus integrantes. Um dos policiais chegou a dizer depois, no batalhão, que não tinha "cerimônia para quebrar cara de mulher". O que os policiais não contavam é que tudo fosse detalhadamente documentado pelos integrantes do bloco. Uma grande quantidade de áudios, vídeos e depoimentos será entregue à corregedoria da Polícia Militar para os devidos procedimentos legais. Todas as orientações foram seguidas De acordo com a artista Paula Klein, de 42 anos, diretora do Bloco, o grupo seguiu todas as orientações previstas para dispersão e não havia motivo para atuação violenta da Polícia Militar. "A Polícia Militar sempre foi grande parceira do nosso bloco. O relacionamento é ótimo há 15 anos e esse ano não foi diferente. Por isso que a ação nos surpreendeu. Mandaram um pessoal despreparado para lidar com o público de Carnaval. Trataram foliões como marginais. O Carnaval foi manchado pela polícia", disse. Ironicamente, um de seus diretores, o músico Lincoln Antônio, lembra que “o clima das manifestações de 2016 em torno do impeachment da presidenta Dilma Roussef e do golpe que se seguiu foram temas muito recorrentes nas criações musicais dos blocos no carnaval do ano seguinte. O Bloco Agora Vai na ocasião fez o que considero sua marcha-enredo mais política, completamente em tom menor e com grande dramaticidade na letra. Num trecho, cantamos: ‘Jurema, aguenta / a bala é de borracha e o spray é de pimenta’”, escreveu em seu Facebook. Que mais virá? Lincoln acrescenta: “mal sabíamos na época que era apenas o começo de um regime de exceção onde a repressão vai se tornando instrumento fundamental. Pois foi nesse carnaval de 2019, quando o bloco completa 15 anos, que alguns de seus foliões puderam sentir na pele a cena descrita na música”. De acordo com ele, o método da PM tem sido rigorosamente o mesmo, “já experimentado em outros blocos e regiões da cidade: descer o cacete, melhor explicando, bombas de gás lacrimogêneo, spray de pimenta, balas de borracha, cassetetes. Sem conversa, sem explicação, sem motivo. Não se viu nenhuma cena de briga, vandalismo, nenhuma ocorrência que justificasse a ação. Eram os foliões da paz, do amor e da alegria que viram seu carnaval não ir por água abaixo, porque a chuva ‘ajuda a gente a se ver’, mas o carnaval interrompido pela violência, arbitrariedade, repressão. Vários feridos e feridas, incluindo este que lhes escreve. A dor física e a dor moral. Guerra ao cidadão, guerra ao folião, guerra ao carnaval e à cultura popular de rua”, finalizou perguntando: “Que mais virá?”, completa. "Aponta o dedinho não, se aproxima não" O pessoal foi tentar prestar queixa na sede da 3ª Companhia do 4º Batalhão da PM, em Perdizes, responsável pelo patrulhamento da área. A atriz Thaís Campos Soares, de 36 anos, namorada de Lincoln foi ameaçada por um dos policiais, que disse: "Aponta o dedinho não, se aproxima não. Você vai tomar um atropelo aqui, estou falando para você, toma distância. Não tenho nenhuma cerimônia em quebrar cara de mulher, não. Você presta atenção”, bradou. De lá, o grupo decidiu então deixar o 4º Batalhão e registrar a ocorrência no 91º Distrito Policial (Ceasa). Lá, recebe a resposta de que o caso não pode ser registrado e que as vítimas devem procurar a Corregedoria. Os feridos disseram que pretendem denunciar o caso. Quem também ficou ferido após ser atingido com um tiro de bala de borracha nas costas foi o professor Alexandre Rosa, de 36 anos. Segundo ele, o policial que o atingiu agiu depois de ter visto que ele estava filmando o que estava acontecendo. "Peguei o celular e comecei a filmar durante a correria. A PM agiu com muita violência sem nenhuma necessidade, estava tudo muito tranquilo e tinha criança e família. Ouvi quando o policial falou: 'Atira naquele que está filmando'. Virei e saí correndo e senti o tiro nas costas", relatou. A diretora Paula Klein disse que pretende reunir queixas de truculência policial não só no seu bloco para fazer uma representação ao Ministério Público. Nota da PM Em nota, a Secretaria da Segurança Pública disse que a Polícia Militar foi acionada "por conta de interdição de via pelo Bloco Agora Vai, na rua Brigadeiro Galvão, após o horário permitido". "As equipes policiais fizeram contato com os organizadores do evento, solicitando a desobstrução da rua, mas sem acordo. Para restauração da ordem pública, foi necessária a intervenção direta para desobstrução da via pública ocupada sem autorização, com técnicas de controle de distúrbios civis no local." Sobre o comportamento do policial que ameaçou a atriz, a SSP disse que a "instituição não compactua com eventuais desvios de conduta, colocando-se à disposição da vítima para formalização de denúncia por meio da Corregedoria da Polícia Militar". Com informações do Estadão Conteúdo