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POLÍTICA
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Por Renata Mielli*
Otavinho, como era conhecido, foi um dos donos de jornais mais paradigmáticos da história recente. Conduziu seu jornal com um olho no mercado e outro na opinião. Fez reformas importantes para o jornalismo, obrigando outros impressos tradicionais a se renovarem.
Sua Folha, foi o primeiro - talvez um dos poucos - jornal a assumir editorialmente a defesa de direitos humanos. Mas, na economia e na política, nunca pestanejou em defender os extratos mais ricos da sociedade, o rentismo e a agenda neoliberal.
Foi o seu jornal que classificou a ditadura militar de Ditabranda e, ao fazer isso, jogou na lata do lixo toda essa postura progressista que tentou cultivar. Um amigo jornalista lembrou ontem do almoço em que o diretor de redação da Folha humilhou Lula ao perguntar se ele seria mesmo candidato a presidente mesmo sem saber inglês ou possuir um diploma de nível superior. Lula se levantou e foi embora.
Otávio era arrogante, era um dos expoentes da elite econômica cultural, e agia como tal. Seu jornal adotou nos últimos anos a mesma linha dos outros veículos da mídia hegemônica tradicional - contribuiu para a criminalização da política, para cindir a sociedade, espalhando preconceito e ódio. Foi esse jornal que num “furo de reportagem” estampou em manchete de capa uma ficha falsa de Dilma Rousseff no período da ditadura, em plena campanha eleitoral de 2014.
Naquela ocasião, a preocupação com a desinformação (fake news) ainda não tinha virado moda. Se tivesse, certamente a etiqueta que esta notícia receberia das agências de checagem seria falso. A nossa moral cristã tem uma mania de, depois da morte, canonizar as pessoas. Que Otavinho seja lembrado pela história pelo que fez de positivo, mas também pelo que fez de negativo para o jornalismo e para o Brasil.
*Jornalista, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e secretária geral do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.