Por Leonardo Fernandes, no Brasil de Fato
Graduado em filosofia, o paranaense Gilberto de Carvalho foi um dos mais próximos assessores e conselheiros do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em 2011, assumiu como Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, ficando durante todo o primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff.
Hoje, Carvalho se dedica às ações de solidariedade ao ex-presidente, preso em Curitiba, desde o dia 7 de abril. Ao Brasil de Fato, o ex-ministro fala sobre a situação política pré-eleitoral no Brasil, o papel do Judiciário no golpe de estado em 2016 e as linhas gerais de um possível novo governo petista, a partir das eleições de 2018. Confira:
Brasil de Fato: Além de companheiro de militância, assessor, consultor, o senhor é sobretudo um grande amigo do ex-presidente Lula. Como o senhor tem acompanhado a prisão dele nesses últimos meses?
Gilberto de Carvalho: Como não podia ser diferente, o primeiro sentimento é de muita tristeza porque o ser humano Lula é uma figura muito particular no aspecto da relação. Ele se relaciona muito com o outro, é uma pessoa muito aberta ao outro. Eu costumo dizer que a elaboração do pensamento do Lula, das formulações dele, das decisões, estão muito vinculadas ao diálogo. O pensamento do Lula não é um pensamento dedutivo como dos intelectuais, é um pensamento dialógico, ou seja, surge do diálogo. A coisa que ele mais faz é ouvir pontos de vista diferentes e depois, num dado momento, ele faz uma síntese. Ele sempre nos disse, quase como um bordão, que quanto mais se se ouve, mais você tem chance de acertar e menos chances de errar. E ele é incapaz de ficar sozinho.
Eu lembro que quando estávamos na presidência, às vezes eu via que ele estava cansado e colocava uma folga no meio da agenda pra ele ficar sozinho no gabinete. E quando menos esperava tinha alguém lá dentro, que ele tinha mandado chamar pra conversar. Então para esse cara, a solidão é um fator muito cruel, custa muito. E ele só não entra em depressão porque ele tem uma força espiritual muito grande. Eu sempre digo que o Lula herdou da mãe dele uma energia… E eu tenho uma crença de que a mãe dele acompanha espiritualmente muito fortemente ele. Porque senão ele entraria numa depressão. Então tem esse aspecto que eu quero acentuar, da crueldade que é para um cara desses ficar sozinho.
Além disso, tenho um sentimento de profunda revolta pela injustiça. Deve ser muito duro para ele ser encarcerado por alguma coisa que ele tem absoluta certeza de que ele não deve. O Lula, como todo ser humano, tem muitos defeitos, mas se tem um que não tem é o de se apropriar daquilo que não é dele. Esse cara nunca levou uma esferográfica para casa no governo. E por que? Porque é a virtude dele. A paixão dele é a política, a vocação dele é a política. A Marisa vivia reclamando muito pelo fato de que ele não cuidava das coisas da casa, da família, das preocupações materiais dos filhos. Ele era completamente absorvido pela questão da política. E para todos nós essa situação é difícil, sobretudo porque a gente sabe também que esta prisão se insere no esquema da perpetuação ou da continuidade do golpe.
Para o golpe, é essencial tirá-lo do páreo para que não haja uma interrupção desse processo elaborado internacionalmente e que se verifica no Brasil através dos traidores da pátria. Para eles, deixar o Lula solto e livre significaria uma grave ameaça à continuidade do projeto deles, porque ele ganharia a eleição. Então esse conjunto de sentimentos nos deixa muito mal. Ontem [domingo, 15/7] completaram 100 dias, ou seja, 100 amanheceres, 100 entardeceres, 100 noites em que ele está preso, longe do seu povo, sem poder fazer aquilo que é a paixão dele que é a política. Então tudo isso nos deixa muito revoltados, profundamente tristes mas, ao mesmo tempo, é uma injeção para que a gente não desanime. E nós vamos lutar até o final.
Qual é a sua convicção em relação à possibilidade de Lula ser candidato nas eleições desse ano?
Olha, nós faremos de tudo para transformar no mais alto custo possível essa tentativa deles de impedirem a candidatura do ex-presidente Lula. Eles ficam, através dos colunistas pagos por eles, tentando nos convencer a colocar um plano B. Não peçam para que nós pratiquemos esse absurdo, que é tirar o Lula da eleição, porque é o povo que quer o Lula na eleição.
No entanto, o episódio do domingo retrasado [8/7] não deixa dúvida de que eles não terão escrúpulos e farão o possível e o impossível, o legal e o ilegal, para impedir a candidatura dele. Por que? Porque está no cerne da lógica do golpe. Então vai ser uma batalha muito dura.
Não será nem a tecnicalidade, nem a competência dos advogados, que é importante, ou muito menos qualquer conversa com juízes, ministros, que vai tirá-lo da cadeia.
Só há uma forma de tirá-lo da cadeia: um levante popular, uma mobilização muito forte, uma radicalização do processo, seja de que forma for, que faça com que eles sintam que está ameaçada a estabilidade do país, e aí, por uma razão de força maior, libertem o Lula. Por isso que nós estamos apostando num processo de mobilização muito forte, daqui até o dia 15 de agosto.
No dia 15 nós vamos à Brasília, e estamos convidando todo o povo brasileiro para que assuma esta tarefa: eu vou registrar Lula. E nós temos que colocar dezenas de milhares de pessoas lá, ao lado das outras mobilizações, da marcha que será feita pelos movimentos da Via Campesina, do dia 10, que esperamos que seja um dia de paralisação nacional, da greve de fome que começa agora no dia 31, na linha da radicalidade que nós queremos dar para essa luta. Só assim nós vamos tirar o Lula da cadeia.
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