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Por RBA
Dois anos e três meses depois da condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, determinada pelo juiz Sérgio Moro em 4 de março de 2016, o Supremo Tribunal Federal, por 6 votos a 5, considerou essa medida inconstitucional e incompatível com o Estado democrático de direito. O tribunal proferiu a decisão na tarde desta quinta-feira (14) ao julgar as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, de iniciativa do PT e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), respectivamente. A arguição do PT é de abril de 2016, um mês depois de Lula ter sido obrigado a comparecer a um interrogatório no aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
Votaram contra a condução coercitiva os ministros Gilmar Mendes (relator), Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli, Marco Aurélio e Celso de Mello. A favor, foram vencidos Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Em voto enfático, o ministro Marco Aurélio comparou a condução coercitiva a um “justiçamento”. “Não somos saudosistas, não temos a menor saudade de regime de exceção no Brasil. Hoje o regime é essencialmente democrático”, disse. “Ninguém devolve ao acusado inocente a liberdade perdida a partir de um ato do força do Estado, discrepante da ordem jurídica.”
De acordo com Marco Aurélio, a medida judicial “na maioria das vezes só retrata o desgaste do cidadão perante seu semelhante”. “A Constituição Federal revela que não há razão de ser para ela a não ser o desgaste irreparável do conduzido”, afirmou. “É um ato gravoso e que solapa o perfil do conduzido. Cerceia a liberdade de ir e vir, (é) um ato que fragiliza o homem e coloca em dúvida o próprio caráter”.
Para Celso de Mello, a condução coercitiva é inadmissível tanto sob o ponto de vista do princípio da autoincriminação, como da presunção de inocência. O magistrado citou termos como "fascismo" e "totalitarismo" para embasar sua argumentação.
“A lei protege os que são acusados, impedindo que sejam entregues ao arbítrio das autoridades”, disse o decano da Corte, citando doutrina. “Produzir prova contra si mesmo é contra o principio da presunção de inocência.”
Dias Toffoli, também contrário à medida adotada por Moro, declarou em seu voto: "É chegado o momento que o STF na tutela de liberdade de locomoção impeça interpretações criativas, que atentem contra o direito fundamental de ir e vir e a garantia do contraditório, ampla defesa e não autoincriminação".
Também voto vencedor, Ricardo Lewandowski afirmou que a jurisprudência do STF quanto à condução coercitiva foi “construída a partir de casos de pessoas pobres, desempregadas, subempregadas e de pequeno poder aquisitivo”.
Gilmar Mendes, afirmou que não se pode permitir a prisão com fins de interrogatório. “A prisão para interrogar não encontra abrigo em nenhuma constituição democrática. Não venhamos fazer discurso que é em benefício do rico ou do pobre”, disse, uma indireta a Luís Roberto Barroso. Citando Pedro Aleixo, acrescentou: “Se validarmos fórmulas autoritárias, o que o guarda da esquina vai fazer?”.
Entre os votos vencidos, Alexandre de Moraes se manifestou dizendo que a medida é constitucional, se o réu tiver se negado a comparecer anteriormente.
Luís Roberto Barroso, coerente com seus votos recentes, inclusive no julgamento do habeas corpus de Lula em 5 de abril, se manifestou contra a “impunidade". Segundo Barroso, "há um surto de garantismo mal travestido de bem".