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Existem, evidentemente, conceitos e narrativas diversas, mas todos, de linhagens de pensamento jurídico diversas, reconhecem o fenômeno da degradação intensa da democracia constitucional e dos direitos fundamentais ocorrentes, dependendo do país, com papel mais relevante de um dos poderes estatais ou agindo em comum.
Por Pedro Serrano
Desde 2007, tenho trabalhado com a ideia de medidas e decisões de exceção, algo diferente dos governos de exceção do século XX, mas também portadoras do autoritarismo extremo.
Trata-se de trabalho acadêmico, incluindo meu pós-doutorado, que se deu por conta da leitura de diversos juristas e alguns filósofos e cientistas políticos que identificavam, com nomes e narrativas diversas, esse mesmo autoritarismo contemporâneo que esvaziava de sentido as Constituições Democráticas do pós-guerra e seus direitos.
Dworkin chama de perda do "common ground", Bobbio de novo despotismo, Claus Roxin de populismo penal punitivo , Ferrajoli de Poder Desconstituinte, Agamben, Carpentier, Codaccioni, Goupy, Rafael Valim, Georges Abboud, Lenio Luiz Streck, Fernando Hideo I. Lacerda e, modestamente, eu, chamamos de medidas, decisões ou Estado de Exceção, Boaventura Santos de democracia de baixa ou baixíssima intensidade, além de muitos outros, a lista é imensa.
Existem, evidentemente, conceitos e narrativas diversas, mas todos, de linhagens de pensamento jurídico diversas, reconhecem o fenômeno da degradação intensa da democracia constitucional e dos direitos fundamentais ocorrentes, dependendo do país, com papel mais relevante de um dos poderes estatais ou agindo em comum.
Quando fiz meu pós-doutorado identifiquei o sistema de justiça como agente dessas medidas e decisões de exceção na América Latina. Trato a noção de sistema de justiça não como o conjunto de instituições da justiça democrática, o que não teria sentido, mas sim de legisladores, julgadores, promotores, policiais, advogados, mídia comercial e a ralé, no sentido de Hanna Arendt .
Hoje mais autores, não poucos, adotam posição semelhante a minha.
Pode-se discordar de tudo isso, achar que vivemos em democracia plena e intensa eficácia dos direitos ou ter divergências de fundo com a própria ideia de exceção ou de poder desconstituinte (Ferrajoli cunhou o conceito).
O que não se pode é ter por absurdo o conceito de Estado de Exceção ou de medidas de exceção, em verdade são temas debatidos há mais de 100 anos na ciência política e no direito e autores de valor, como os que citei, de alguma forma, mesmo que em outros termos, enxergam o fenômeno da exceção ou do poder desconstituinte no interior das democracias contemporâneas.
Soube que a jovem, ativa e culta filosofa Djamila Ribeiro, tem sido criticada por ter usado a expressão Estado De Exceção em Londres, como se fosse uma bobagem pelo caráter democrático constitucional do ocidente e do Brasil serem inquestionáveis. Como se os poderes de estado não os tivessem como realizar, inclusive o Judiciário.
Me parece que tais críticas não provem de discordância de fundo ou teórica com o conceito de Djamila, mas de algum nível de desinformação quanto ao debate do tema, que por formas e narrativas diversas e realizado em quase todo mundo ocidental e em suas principais Universidades.
Como falei a discordância sempre pode ocorrer e é bem vinda se fundamentada adequadamente. Não se pode, contudo, atribuir erro primário ao termo e seus pressupostos, até porque, basta ler a lista de autores que citei (e são muitos mais) para ver que, no mínimo, Djamila está muito bem acompanhada no "erro".
Foto: Olmo Calvo (Commons)