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Em entrevista, o deputado estadual fala sobre a importância de um projeto de segurança pública calcado nos direitos humanos para o desenvolvimento da democracia e a necessidade de uma política penitenciária para o combate às facções criminosas. Critica também a concentração dos meios de comunicação, que, segundo ele, foi uma das principais pautas não enfrentadas pelo PT apesar da sua relevância para a esquerda
Por Eduardo Sá, no Fazendo Media
Após ganhar popularidade com o seu combate às milícias do Rio de Janeiro, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) vem numa crescente eleitoral. Com muito menos recursos e tempo de televisão, chegou ao segundo turno nas eleições para prefeito carioca no ano passado. Derrotou o PMDB, que detém o poder no Estado há mais de uma década, mas perdeu para o bispo Marcelo Crivella (PRB).
Na entrevista, Freixo fala sobre a importância de um projeto de segurança pública calcado nos direitos humanos para o desenvolvimento da democracia e a necessidade de uma política penitenciária para o combate às facções criminosas. Critica também a concentração dos meios de comunicação, que, segundo ele, foi uma das principais pautas não enfrentadas pelo PT apesar da sua relevância para a esquerda. Novas linguagens e o retorno ao trabalho de base são as prioridades dos movimentos atualmente, apontou o deputado. A conversa ocorreu um dia antes (15/02) de o PSOL protocolar um pedido de impeachment do atual governador Luiz Fernando Pezão.
Quais os equívocos e virtudes da campanha das Eleições para prefeitura do Rio em 2016?
A dinâmica do Rio é tão grande que a gente pensa pouco sobre o que aconteceu ano passado, somos sempre atropelados por um cotidiano muito intenso. No dia seguinte da eleição já chegou o pacote do Pezão aqui (Alerj), então emendamos direto e teve pouco tempo de avaliação e reflexão pois fomos engolidos pela agenda política. Mas foi uma campanha vitoriosa, que deu para ter vitória política mesmo não tendo a vitória eleitoral. Chegamos ao segundo turno num momento muito desfavorável, pouquíssimas candidaturas com perfil de esquerda no país que chegaram ao segundo turno. A esquerda saiu derrotada não só no Rio de Janeiro. Foi uma eleição muito pulverizada tanto pela direita quanto pela esquerda, e com apenas 11 segundos de televisão. Tínhamos uma dificuldade muito concreta pela frente, e viramos em cima do PMDB na última semana após o debate na Globo. Isso já é uma vitória política, embora a gente quisesse ganhar e tenha se organizado para isso. Seria bom para o Rio de Janeiro e para a esquerda, o nosso programa de cidade era muito melhor do que o Crivella apresenta hoje independente de qualquer orientação ideológica.
Uma virtude da campanha é que nos preparamos muito, reunimos centenas de pessoas para a construção do nosso programa. Milhares de pessoas opinaram sobre a sua área, dos especialistas aos usuários dos serviços públicos. Tínhamos um programa bem completo e uma equipe inclusive com especialistas de fora da cidade com capacidade técnica e competente. Vivemos uma crise muito grande, precisamos de gente boa. Qualificamos bastante o debate no segundo turno, mas a nossa limitação é da esquerda como um todo que precisa entrar na questão religiosa. Estamos nos organizando para isso, você tem 25% da população do Rio de Janeiro que é evangélica. A esquerda, na qual estou incluído, cometeu o erro de nunca olhar para essa população e fazer um debate político sobre isso. Se você parte do princípio que todo evangélico é reacionário e de direita, você já perdeu qualquer disputa majoritária na cidade. Foi um erro que cometemos, não houve disputa no meio evangélico por uma pauta progressista. Onde está escrito que o evangélico é conservador? A orientação religiosa pode ser, mas o cara necessariamente não. Estamos tendo acesso a uma pesquisa em que nos últimos 5 anos cresceu 60% no Brasil as religiões.
As bancadas ruralistas são reflexos disso nas instâncias de poder a nível nacional…
Elas mostram de alguma maneira isso, né. Então se você somar os evangélicos com os seguidores de Bolsonaro e outros, acaba com qualquer disputa e foi o peso que a gente teve na eleição de segundo turno. Na avaliação dos equívocos fica uma grande lição, que é disputar espaços fora das nossas bolhas e dos espaços tradicionais.
Vocês há muito tempo denunciam as falcatruas do PMDB e finalmente o Cabral foi preso e o Pezão w sua chapa estão com sua última eleição cassada pela justiça. Mas mesmo assim o Picciani foi reeleito pela sexta vez na presidência da Alerj e eles têm maioria com 14 dos 70 deputados na casa. O que muda, de fato?
Não é uma derrota qualquer na cidade do Rio, e demonstra um pouco a fragilidade deles. A prisão do Cabral atinge diretamente sua principal liderança política, e o Picciani e outras lideranças podem a qualquer momento passar por isso também. O PMDB do Rio tem uma chance de desmoronar dependendo das investigações, daí concluimos que um grupo muito criminoso tomou de assalto o poder no Rio de Janeiro. O modus operandi do governo, seu funcionamento, era criminoso. Qual a principal acusação ao Cabral? Formação de quadrilha, que era o governo. Ele não está sendo preso porque além de governador tinha uma formação de quadrilha traficando armas escondidas do Sudão, e sim por conta das suas decisões enquanto governador favorecendo redes de empreiteiras e determinadas atividades econômicas. Tendo benefícios de campanha, propina, aí envolve Tribunal de Contas, Ministério Público, poder judiciário e as demais teias dessa estrutura de poder corrupta. É muito sério, porque são dez anos.
A gestão do Cabral coincide com a minha entrada na vida pública, me elejo deputado quando ele se elege governador. Então acompanhei todo esse procedimento deles, e o Estado do Rio hoje está falindo porque tem uma relação direta com esse modus operandi de governar. São os empréstimos, os endividamentos, uma relação nefasta entre o público e o privado atendendo a interesses privados e não aos públicos.
A cabeça está sendo presa, mas a engrenagem se mantém no funcionamento da máquina. Tanto é que a Alerj está votando às pautas cercada de polícia e volta e meia tem bomba afastando a população.
Antes eles votavam de porta aberta, sinal que não é a mesma coisa. Quando o Piccini teve minoria aqui? Nunca. Ele foi reeleito pela sua base governamental, não é a sua relação com a sociedade. A base de deputados elegeu ele, e só o PSOL e um deputado da REDE votaram contra. Inclusive o PT votou nele.
Você tem batido na tecla da CPI das Isenções Fiscais há algum tempo, além da questão da UERJ e CEDAE, que em função desses estouros e a crise veio à tona.
A CPI deve ser implementada depois do carnaval. Temos uma crise econômica grande, que é de receita e não de despesa. O Estado não entrou em crise porque gastou muito, ele deixou de arrecadar. O governo diz que deixa de arrecadar em função da queda do barril de petróleo, mas o que dizemos é que existe uma queda do barril com um impacto significativo da crise petrolífera mas há também uma queda de receita por parte de benefícios fiscais irresponsáveis, da não cobrança da dívida ativa. O pagamento indevido de uma dívida com o Governo Federal, esse tipo de avaliação dessa dívida e os empréstimos. Há uma má gestão também, são empréstimos sucessivos que o governo Cabral e Pezão pegam e pelo menos três deles em dólar. Então, se o câmbio explode a economia do Rio explode também.
Foram anos de uma gestão do PMDB temerária e irresponsável para além da estrutura corrupta, um modelo de desenvolvimento que gerou uma crise financeira aguda. Isso precisa ir para conta do PMDB e agora eles querem solucionar essa crise cortando despesa, e não continuam resolvendo o problema da receita. Fecham restaurante popular, dizem que não vai ter mais concurso público, aumentam a taxa previdenciária do servidor em mais 8%, etc. Onde vão diminuir a despesa e aumentar a receita? No servidor e na população mais pobre para continuar governando para quem sempre governaram. Quando falamos que precisa de uma CPI das Isenções Fiscais é porque se há uma crise de receita, é por que o Estado deixou de cobrar impostos de grandes empresas que não necessariamente trouxeram algum benefício. Não sou contra as isenções fiscais, desde que elas tragam desenvolvimento econômico e geração de emprego. Se você trouxer uma empresa que vai gerar milhares de empregos numa região onde não tem, beleza, benefício fiscal. Mas trazer uma empresa para dar R$ 380 milhões de benefício fiscal, que ela deixa de pagar vários impostos, e ela gera 400 empregos não dá. Ah, mas se não der o beneficio ela não vai se instalar, dizem. Vamos ver, será? Mas o importante é: o que estamos ganhando com esse benefício em cada um desses setores? Segundo o cálculo do Tribunal de Contas, são R$ 150 bilhões que o estado do Rio deixou de arrecadar com a política de isenção fiscal dos últimos anos.
Empresas que devem ao governo foram beneficiadas com isenções com valores superiores aos definidos, tipo Coca Cola, Pepsi, etc, todas multinacionais, que são financiadoras de campanha do Pezão. Quer dizer, a empresa recebe isenção e depois financia. A gente entrou com uma ação de improbidade administrativa contra ele. Aliás, a ação que ganhamos de 2014 no TRE por 3 votos a 2 consegue a liminar com a cassação da chapa. Ele está recorrendo no TSE por uma razão simples: tinha empresas, que são grandes, ganhando aditivos nos seus contratos (ou seja, você faz um contrato de R$ 3 bilhões e ganha R$ 700 milhões de aditivo, por exemplo). E ao ganharem esse aditivo uma semana depois viraram doadores de campanha do PMDB. Isso deixa muito claro esse abuso de poder econômico, empresas contratadas para prestar serviços ao governo prestavam serviço à campanha como gráficas, por exemplo.
Vivemos uma conjuntura muito delicada com um impasse em que até que ponto a esquerda apóia ou não o PT, na medida em que qual o limite da sua responsabilidade nesse processo? Como está essa dinâmica na esquerda daqui para frente?
Esse é um momento importantíssimo, o PT tem uma responsabilidade muito grande da crise da esquerda. É óbvio, era o grande partido que estava no governo federal e a gente não titubeou em relação à questão do golpe. Desde o momento inicial fui para todos os palanques denunciar o golpe e apoiar a democracia. Apoiei a Dilma no segundo turno mesmo discordando profundamente do seu governo. Fiz um apoio crítico, sempre separei as duas coisas, mas o PT tem grande responsabilidade sobre a crise ética da esquerda. Tem uma enorme responsabilidade sobre a imagem do desgaste da esquerda.
O PSOL tem uma possibilidade muito grande, não é necessariamente uma realidade. O PSOL no Rio é muito mais forte que o nacional, por exemplo. Mas tem a possibilidade de construir uma alternativa de esquerda nacional, não acho que o PT consiga mais uma vez. Não é isso o que vejo das bancadas, então cabe ao PSOL construir esse projeto que ainda não tem. Isso não se dá só com candidatura, se dá também com trabalho de base. Acho que a esquerda e não só o partido, mais que fazer trabalho de base tem que se refazer na base.
Quando você diz refazer remete à juventude, que tem desenvolvido outras formas de militância que não necessariamente passam pelos partidos, sindicatos, etc…
A juventude é fundamental para a renovação, mas não só. Acho que você tem que reinventar mesmo as linguagens. Hoje vivemos num mundo com outra linguagem, que é diferente da década de 80 e 90. A comunicação tem um nível de velocidade e espaços que não são os mesmos onde se fazia política nas décadas de 80 e 90. Não adianta você ficar naquele tempo não entendendo o que está acontecendo hoje, e 2013 deveria ter servido para nos alertar disso. Porque as convocações não passam mais pelo mundo organizativo da política.
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Foto: Marcelo Santos Braga