O PT tem três deputados com direito a voto no Conselho de Ética da Câmara. Se votarem pela interrupção do processo que investiga Eduardo Cunha, ajudarão a enterrar o que ainda resta da credibilidade do partido. Se votarem pela continuidade, abrirão caminho para que o presidente da Casa seja julgado e cassado, mas arcarão com o custo de uma nova aliança entre ele e a oposição para deflagrar o impeachment de Dilma
Por Wagner Iglecias*
Há trinta anos o PT tinha uma bancada de apenas oito deputados federais. O Brasil, na época regido pela Constituição imposta pela ditadura militar em 1967, ainda elegia o presidente da república pelo chamado Colégio Eleitoral, no qual só votavam deputados federais e senadores.
Por ampla maioria, o Diretório Nacional petista decidiu por boicotar aquela votação. Mas três deputados furaram o boicote e votaram na chapa Tancredo Neves/José Sarney. Tancredo, avô de Aécio Neves, concorria contra Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo.
A eventual vitória de Maluf seria, na visão de alguns, o adiamento da volta da democracia e uma espécie de continuidade do regime militar, ainda que sob comando de um civil. Os três petistas que votaram em Tancredo acabariam expulsos do partido pouco depois.
Hoje, trinta anos depois, o PT, com uma bancada muito maior que aquela de 1985, e já bem diferente daquele pequeno partido de trinta anos atrás, se depara com uma terrível coincidência: tem três deputados com direito a voto no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
A pauta desta vez não é a eleição do presidente da República, mas a continuidade ou não do processo que investiga o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e que pode resultar na sua cassação.
Se votarem pela interrupção do processo, os três deputados petistas ajudarão a enterrar o que ainda resta da credibilidade do partido. Serão acusados nos jornais de amanhã de terem sido responsáveis pela manutenção de um corrupto à frente do terceiro cargo mais importante da República. Atrairão ainda maior ódio da opinião pública midiatizada contra o partido.
Se votarem pela continuidade do processo, abrirão caminho para que Cunha seja julgado e cassado, e com isso terão de arcar com o custo de Cunha aliar-se novamente à oposição capitaneada por Aécio Neves, neto de Tancredo, e deflagar o processo de impeachment de Dilma, essa idéia fixa do PSDB e afins, sedentos para retomar o controle do Estado brasileiro e impor ao país uma agenda ainda mais a direita do que esta agenda de Dilma.
(*) Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP)
(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)