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Por Jarid Arraes
Na noite de ontem aconteceu o primeiro debate entre presidenciáveis, realizado e transmitido pela Rede Bandeirantes de televisão. Há muito a ser discutido a partir do debate que a Band exibiu e é importante dar o pontapé inicial sob uma ótica feminista, trazendo visibilidade para questões negligenciadas no período eleitoral; entre elas, os temas relacionados aos direitos das mulheres, como a legalização do aborto e a naturalização do machismo.
Eduardo Jorge (PV) e Luciana Genro (PSOL) fizeram, de fato, um ótimo papel na hora de pautar assuntos "polêmicos"; ambos assumiram a defesa da legalização do aborto e falaram em favor da vida das mulheres. No entanto, Eduardo Jorge acabou escorregando em uma clássica atitude machista que, por ser tão naturalizada em nossa cultura, passa facilmente despercebida: o uso da aparência física de uma mulher, a candidata Marina Silva (PSB), como gancho para piada e ferramenta de desqualificação.
Em meio ao debate, Eduardo Jorge comentou que se fosse feita uma auditoria da dívida pública, ela sairia "magrinha como a Marina", colocação que foi reproduzida em suas redes sociais. A candidata, por sua vez, manteve uma feição dura e prontamente foi defendida por muitas feministas que acompanhavam e comentavam a discussão. Afinal, esse tipo de provocação é desnecessária e qualquer argumento poderia ser facilmente proferido sem que fosse preciso recorrer ao machismo.
As mulheres que se candidatam a cargos políticos enfrentam uma forte repressão misógina e são frequentemente avaliadas por suas roupas e características físicas, algo que não acontece na mesma proporção com os candidatos do sexo masculino. Marina, especificamente, é alvo de muitas piadas a respeito de seu cabelo, sobrancelhas e corpo por não se enquadrar no padrão de beleza, além de ser uma mulher negra que não demonstra ter o hábito de usar maquiagem. Independente do que qualquer pessoa ache, Marina tem o direito de ser como é e não deve ser desqualificada ou debochada por isso. Esse princípio é válido para todas as mulheres.
Eduardo Jorge foi assertivo e íntegro quando perguntou se Aécio Neves (PSDB) concordava com a criminalização das mulheres que abortam e se saiu ainda melhor quando fez a defesa da legalização do aborto. Sua contribuição nessa luta é importante para o feminismo brasileiro e pelo reconhecimento do valor de seu posicionamento é que essa reflexão se faz tão necessária. Para lutar pelos direitos das mulheres e facilitar a conscientização da população, todas as pessoas que se envolvem com a defesa das ideias feministas precisam se abrir para uma constante revisão de seus posicionamentos, hábitos e opiniões. A construção de um mundo livre do machismo é um trabalho contínuo e sempre há o que melhorar.
Identificar o machismo cotidiano não é tão fácil e não é confortável quando percebemos que o sexismo parte de nós mesmos. Apesar disso, confiando em seu senso crítico e boa vontade, proponho que Eduardo Jorge reconsidere suas estratégias retóricas e, quem sabe, se retrate publicamente. A criminalização da mulher que aborta existe também por causa do machismo, que deve ser desconstruído em todos os âmbitos. Somente assim a mulher brasileira poderá viver com autonomia, sendo senhora absoluta de seu corpo - seja ele magrinho ou não.
Foto de capa: Reprodução