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O líder do PSOL na Câmara dos Deputados fala sobre o Projeto de Lei que o partido protocolou nesta quarta-feira, que visa regulamentar os conselhos populares; ele afirma que agora ninguém pode dizer que há interferência na prerrogativa do Legislativo
Por Marcelo Hailer
Em resposta à derrubada do decreto presidencial que busca regulamentar e sistematizar os conselhos populares de participação social, a bancada do PSOL na Câmara dos Deputados apresentou, nesta quarta-feira (29), um Projeto de Lei que tem como base o texto do decreto presidencial, com algumas alterações no que diz respeito a prerrogativas postas no texto original.
“Essa iniciativa é do Legislativo. Protocolamos ontem (quarta-feira) e vamos pedir um regime de urgência no começo da semana. Agora, eles não podem dizer que uma iniciativa do Legislativo é uma interferência do Executivo ou que tira as prerrogativas do Legislativo. A prerrogativa nossa (deputados) é apresentar um projeto de lei e estimular a participação popular”, explica o líder da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados, Ivan Valente (SP).
Além da questão dos conselhos populares, Valente também comentou a respeito da regulação econômica dos meios de comunicação e disse que essa deve ser a pauta principal. “A democratização da mídia é uma palavra de ordem chave. Agora, o governo financia a mídia de várias maneiras: ou com propaganda governamental, ou com empréstimo etc. A potência que o governo tem para democratizar os meios de comunicação, impedir um monopólio e tomar iniciativa democratizante, ela é grande. Agora, sabendo que vai enfrentar dificuldade, que vai levar porrada. Agora, se não fizer, vai levar porrada do mesmo jeito”, analisa o parlamentar.
Fórum - Como você classifica a derrubada do Plano Nacional de Política Social?
Ivan Valente – Isso acabou se tornando uma queda de braço e, antes da eleição, entre uma visão de participação social e popular, que não tem uma grande novidade em termos de poder popular, pois são conselhos que já existem. É uma política nacional de participação social e a criação de um sistema de participação social. Agora, as categorias já existem, os conselhos estão aí, as conferências nacionais estão aí. É mais uma sistematização do que uma novidade.
Mas os setores conservadores, os partidos mais à direita e não só eles, partidos da própria base do governo fizeram dessa questão, antes da eleição e agora depois, uma queda de braço sobre uma visão de política de participação social no Brasil. E inclusive barbaridades foram faladas em plenário: que era uma prerrogativa do Legislativo, que era uma visão bolivariana... Deus nos ouça se fosse! (risos). E, mais ainda, de que eram sovietes que estavam sendo implantados via Secretaria Geral da Presidência.
Há toda uma ideologização do debate e, passadas as eleições e o descontentamento de aliados, como o do PMDB, visando uma disputa futura (presidência do Congresso Nacional), impuseram um isolamento governamental numa lógica de que seria uma visão esquerdista que estaria em jogo. Eles derrotaram, quiseram imprimir, com o apoio da grande mídia, nessa direção. A aceleração do processo de votação, que foi comandada pelo próprio presidente da Casa (Henrique Alves-PMDB), evitando uma obstrução maior... A aliança que o PMDB fez com todos os partidos da base e da oposição de direita mostrou o isolamento do governo, mas teve muita simbologia.
Fórum – Vocês protocolaram um Projeto de Lei com texto similar ao do decreto do governo federal.
Valente – Nós, do PSOL, para responder à falsidade de vários argumentos de que isso retirava a prerrogativa do Legislativo, de que era uma interferência do poder Executivo, nós apresentamos um projeto ontem (quarta-feira), protocolamos um Projeto de Lei que tem a base essencial do decreto, mas retira uma prerrogativa de coordenação que vem da Secretaria Geral da Presidência. Ele coloca o próprio sistema funcionando, sendo autogestionado. O sistema existe, de participação social e popular, e tiramos algumas, por exemplo: o governo é que comandava a conferência de educação, meio ambiente, podia adiar ou não, a convocação ficava muito na mão dele (governo). Estabelecemos de que, no mínimo de dois em dois anos, haveria de ter as conferências e fixamos a paridade obrigatória entre sociedade civil e Executivo.
Fórum – Essa paridade já funciona nos conselhos atuais, né?
Valente – Sim, a maioria já funciona assim, só que ele (decreto) não tinha essa prerrogativa direta, que era obrigatória essa paridade. Na verdade, demos um tom mais movimentista e mais sociedade civil do que ele era. E essa iniciativa é do Legislativo. Protocolamos ontem e vamos pedir um regime de urgência no começo da semana. Agora, eles não podem dizer que uma iniciativa do Legislativo é uma interferência do Executivo ou que tira as prerrogativas do Legislativo. A prerrogativa nossa (deputados) é apresentar um projeto de lei e estimular a participação popular.
Fórum – Qual é a expectativa de trâmite do Projeto de Lei?
Valente – O trâmite seria o normal, pois ele está na forma de um projeto de lei, já é uma coisa que também desarma. Nós estamos querendo dar uma urgência nisso, então nós vamos tentar pegar a assinatura de vários líderes, que tem mais de 161 assinaturas e isso não vai ser fácil. Isso vai ser porrada, mas pode ser que a gente consiga furar o bloqueio. Isso vai depender da resistência que está estabelecida lá na Casa (Câmara dos Deputados) e que não é pouca.
Fórum – O governo tem dito que vai bancar a regulação econômica da mídia e a reforma política. O Congresso eleito à próxima legislatura é mais conservador que o atual. Como você acha que vai ser o trâmite dessas pautas?
Valente – Na questão da reforma política e dessa ideia do plebiscito que a Dilma lançou, já está com uma enorme resistência na Câmara. Eles (partidos políticos) não querem uma reforma política de verdade e também não querem a participação popular. Eles querem fazer uma reforma política que, na prática, tenha três ou quatro dispositivos que não acabam com o financiamento empresarial de campanha, que, aliás, está no Supremo Tribunal Federal (STF). Eles querem se antecipar, eles propuseram que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) votasse imediatamente a admissibilidade da proposta que está em tramitação que, diga-se de passagem, era uma iniciativa do Vacarezza (Cândido Vacarezza-PT) com a direita da Casa. Principalmente para criar as cláusulas de barreira, que é aquela lógica de funcionar com 30 partidos, a pulverização dos partidos de aluguel, quando na verdade você sabe que o principal partido de aluguel é o principal inimigo do PT na Casa: o PMDB. Ou vem uma pressão popular de baixo para cima, com movimentação de rua, abaixo-assinado... Ou os movimentos sociais se articulam ou não sai reforma política, ou sai uma reforma política pior e eles têm maioria na Casa para aprovar qualquer coisa ruim.
Sobre os meios de comunicação de massa: eu acho que o governo ou aprendeu alguma coisa definitivamente com essa eleição ou então ele vai continuar sendo vítima da sua própria armadilha. O ministro das comunicações, Paulo Bernardo, é o primeiro que deveria cair fora, porque ele viveu o tempo todo mancomunado com as teles e com as famílias dos meios de comunicação. A primeira medida que o governo deveria tomar era apoiar iniciativas legislativas. Por exemplo, eu tenho um Projeto de Lei tramitando que acaba com a propriedade cruzada de comunicação, que é o que já existe nos Estados Unidos e também na Argentina. E é lógico que vai ter uma puta resistência na mídia. A democratização da mídia é uma palavra de ordem chave. Agora, o governo financia a mídia de várias maneiras: ou com propaganda governamental, ou com empréstimo etc. A potência que o governo tem para democratizar os meios de comunicação e impedir um monopólio e tomar iniciativa democratizante ela é grande. Agora, sabendo que vai enfrentar dificuldade, que vai levar porrada. Agora, se não fizer, vai levar porrada do mesmo jeito.
Não tem saída, é o que aconteceu na Venezuela, no Equador e na Bolívia. Eles tiveram que enfrentar os meios de comunicação.
Fórum – Acredita que a resposta que a Dilma Rousseff deu na televisão à revista Veja, de que vai processá-la, sinaliza esse caminho?
Valente – Se ela acha que foi caluniada, ela tem que ir para a Justiça mesmo, mas isso é insuficiente. O problema é mais complexo. O poder midiático, hoje, tem essa lógica de que qualquer regulação, controle social é censura, precisa ser enfrentado. O que existe é um monopólio, o que existe é uma submissão ao poder econômico. Eles (meios de comunicação) e o poder econômico andam em paralelo: o poder econômico financia, eles promovem o poder econômico.
Talvez o PT tenha tudo à ilusão de que eles pudessem ser os queridinhos da mídia e não foram. Porque a mídia é a Globo, a Veja, a Folha de São Paulo, o Estadão, essas famílias que dominam os rádios, então é preciso realmente avançar. É por isso que a Argentina está apanhando tanto e não tem nenhum governo revolucionário na Argentina. E, no entanto, eles fizeram o enfrentamento e impediram o monopólio. Agora, eu não sei se o governo (Dilma) está disposto ou se tem força e, para isso, ele tem que estimular a participação social. Sem conflito não há mudança.
Foto: PSOL