Em entrevista à Rede Brasil Atual o professor da Escola de Sociologia e Política e ex-coordenador do programa de governo na campanha do atual prefeito atribui boa parte dos índices negativos deste primeiro ano à comunicação do governo
Leia abaixo a íntegra, originalmente publicada aqui.
Comunicação 'desastrosa' faz medidas positivas se voltarem contra Haddad, avalia professor
Para Aldo Fornazieri, coordenador do programa de governo do petista em 2012, avaliação ruim da gestão está diretamente ligada às falhas no diálogo com a sociedade
Por Rodrigo Gomes, da RBA
[caption id="attachment_37402" align="alignleft" width="300"] Para o professor Aldo Fornazieri, o governo erra em buscar uma relação de boa vizinhança com a chamada grande mídia (Foto: FESPSP)[/caption]São Paulo – Os baixos índices de aprovação do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), estão diretamente ligados ao "desastre" de sua política de comunicação neste primeiro ano de governo, na avaliação do cientista político Aldo Fornazieri, um dos responsáveis pela elaboração do programa de governo do petista em 2012.
Segundo levantamento do instituto Datafolha divulgado ontem (2), 39% dos paulistanos consideram a gestão Haddad ruim ou péssima, 40% regular e somente 18% a avaliam como ótima ou boa. Os índices são parecidos aos obtidos pelos ex-prefeitos Celso Pitta (1997-2000) e Gilberto Kassab (2006-2012) em seus primeiros anos de gestão.
Para Fornazieri, as falhas na comunicação têm feito com que medidas consideradas positivas – como o IPTU progressivo e o combate à corrupção – se voltem contra o prefeito e reduzam sua popularidade.
"O que eu recomendaria ao Haddad, e tenho o poder de recomendar, é que ele troque essa equipe de comunicação. Porque essa equipe de comunicação foi desastrosa. Se eu tiver que dar uma nota ruim para a gestão Haddad eu daria justamente na comunicação. Sem comunicação você não vence a batalha política, sem comunicação você não vence inclusive a batalha administrativa. Hoje, se comunicar bem e interagir bem com a sociedade é um elemento de uma boa administração", afirma Fornazieri, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em entrevista à RBA.
"Falta à prefeitura uma política própria de comunicação, uma política aguerrida, arrojada, moderna, que leve em conta principalmente as redes sociais", conclui.
O professor avalia que o governo erra em buscar uma relação de boa vizinhança com a chamada grande mídia. “A gestão Haddad não pode se fiar apenas nos meios tradicionais de comunicação, achando que eles vão divulgar as políticas corretas da prefeitura. Muito pelo contrário.”
Confira a íntegra da entrevista. A que o senhor atribuiria esta má avaliação da gestão Haddad, divulgada pelo Datafolha? O primeiro ano de governo, de qualquer gestão, e principalmente uma que se propõe a mudanças, ele é sempre muito ruim. E nesse caso, a gestão Haddad é um governo de mudanças, porque ele veio para mudar o status do anterior, que vinha de uma continuidade entre José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (PSD). A maior dificuldade que se observa na política é implementar mudanças. De certa forma, era previsível que no primeiro ano o governo Haddad teria muita dificuldade para engatar sua gestão.
Por quê? Em primeiro lugar, porque as mudanças demoram para produzir frutos positivos para a população, então aqueles que as percebem, olham de certa forma desconfiados. E aqueles que são atingidos no primeiro momento pela mudança serão críticos ferozes dela, como ocorreu com a implementação das faixas de ônibus.
Em segundo lugar, Haddad foi pego de surpresa numa conjuntura adversa, a das manifestações. Alguns meses depois que ele assumiu veio este vendaval que varreu todo o país, que derrubou a popularidade desde a presidente da república, governadores, prefeitos. E principalmente numa cidade grande como São Paulo, o impacto das manifestações produziu um resultado bastante forte e negativo sobre a administração. Assim como o prefeito Eduardo Paes (PMDB), no Rio de Janeiro, aparentemente não se recuperou dos protestos de junho.
Inclusive, as manifestações de junho, a rigor, tiveram como foco os problemas municipais, particularmente o transporte, embora tenham se colocado várias bandeiras, como educação e saúde. O fato é que a mobilidade urbana ficou no centro do furacão. Então, o desgaste dos prefeitos das grandes capitais foi muito maior. Tem de se levar em conta isso também. E não vai ser fácil mudar isso.
O senhor considera que o prefeito errou em alguma das políticas implementadas? Ou o erro foi de posicionamento político, por exemplo, uma excessiva aproximação com o governador Geraldo Alckmin (PSDB)? Acredito que o Haddad tenha errado, no contexto das manifestações, no timing de decidir a redução do aumento das passagens. O momento adequado para ele ter feito isso era aquela segunda-feira, quando ele se reuniu com o conselho municipal. E à noite aconteceu a manifestação mais volumosa. Eu acho que ali ele tinha que ter decretado a redução da passagem. Ele ganharia pontos depois. Mas ele ficou um pouco a reboque das manifestações e isso provocou um certo desgaste político.
Agora, se você olhar o sentido geral das coisas que a gestão Haddad vem fazendo, no fundamental, são corretas. Por exemplo, essas mudanças pela implantação de um número enorme de corredores de ônibus, no geral está correta. Vai produzir, no médio prazo, resultados bastante bons. Embora eu ache que alguns erros tenham sido cometidos, e que irritam a população. Por exemplo, em ruas que só têm duas faixas, em que só podem passar dois carros, não precisava implementar corredor de ônibus. Houve um exagero em alguns casos.
Acho que um outro elemento que teve grande repercussão foi o problema do aumento de IPTU. O sentido do aumento do IPTU está correto porque para a grande parte da população o IPTU vai baixar. E para 15% a 20% da população o IPTU vai vai aumentar até 10%. Então, para 77% da população, ou o IPTU baixa, ou aumenta muito pouco. Só para cerca de 23% da população é que haverá um aumento de entre 10% a 30%.
É uma política progressiva: quem tem menos paga menos, quem tem mais paga mais. Do meu ponto de vista é uma política de justiça tributária correta, principalmente se levarmos em conta que no Brasil os pobres pagam mais impostos e parte do dinheiro é drenado para os ricos. O que é uma política tributária ao contrário. O que faltou aí? Para mim faltou, que é uma das grandes falhas da gestão Haddad, a comunicação.
Quais seriam os problema com a comunicação? Não está sendo feita de forma adequada. A gestão Haddad não pode se fiar apenas nos meios tradicionais de comunicação achando que eles vão divulgar as políticas corretas da prefeitura. Muito pelo contrário. Eu vejo meios de comunicação que têm bastante penetração na sociedade paulistana e que eles sistematicamente criticam a prefeitura, mesmo nas questões em que ela está correta.
O que eu recomendaria ao Haddad, e tenho o poder de recomendar, é que ele troque essa equipe de comunicação. Porque essa equipe de comunicação foi desastrosa. Se eu tiver que dar uma nota ruim para a gestão Haddad eu daria justamente na comunicação. Sem comunicação você não vence a batalha política, sem comunicação você não vence inclusive a batalha administrativa. Hoje, se comunicar bem e interagir bem com a sociedade é um elemento de uma boa administração.
Falta ao governo municipal criar uma política própria de comunicação. E de diálogo com a sociedade. Não adianta você implementar uma política correta se você não dialoga com a sociedade. O governo Haddad está falhando em fazer uma verdadeira revolução no que tange a comunicação da prefeitura. Principalmente em um momento histórico como esse, em que existe uma crise de legitimidade dos políticos de modo geral. Falta à prefeitura uma política própria de comunicação, uma política aguerrida, arrojada, moderna, que leve em conta principalmente as redes sociais.
No caso do IPTU, por exemplo, houve uma grande desinformação... Veja outro exemplo. Eu acho que uma inovação que Haddad implantou foi o combate à corrupção, através da implementação da Controladoria Geral do Município. E foi um trabalho espetacular, tendo em vista que a prefeitura estava sendo violentamente assaltada pelos fiscais e pelas empresas, pelas incorporadoras da construção civil. Era uma perda enorme de recursos para a prefeitura. E, novamente, houve problemas de comunicação. O prefeito poderia ter se capitalizado enormemente em torno deste combate à corrupção, porque a sociedade vê isso com bons olhos. No entanto, mais uma vez ocorreu uma falha tremenda da comunicação.
Esse erro tem a ver com o fato do prefeito ter preferido se cercar de quadros acadêmicos, mais do que de quadros políticos do partido? Olha, acredito que um bom governo é aquele que sabe balancear os quadros técnicos com os quadros políticos. Você não faz uma boa política sem quadros técnicos e também não faz uma boa gestão sem quadros políticos. Então esse balanço entre o técnico e o político deve ser necessário.
Eu penso que o prefeito deve exercer um forte papel político. Eu sempre digo que o prefeito não pode ser um general de gabinete. Tem que ser um general de campo, tem que andar pela cidade, dialogar com a sociedade, porque só assim ele vai ter uma dimensão de quais são os verdadeiros problemas de sociedade. Para mim uma gestão bem feita é aquela que tenha boas propostas, que saiba se comunicar bem e com o prefeito cumprindo um papel eminentemente político, como um líder da cidade.