OPINIÃO

Palestina sob marcação cerrada no Maracanã – Por André Lobão

Bandeira ou símbolos palestinos são proibidos em acesso ao estádio. Além disso, há suspeita de que soldados israelenses à paisana estivessem presentes no Fla x Flu de quarta-feira (11)

Estádio do Maracanã.Créditos: Leonardo Brasil (Fluminense)/Reprodução
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Sou torcedor do Fluminense, e frequento o Maracanã há pelo menos 50 anos, perdendo a conta de quantos jogos já assisti desde 1975. No Maracanã já vi de Papai Noel à Fla-Flus memoráveis, e na última quarta-feira (12/03) fui a mais um, mas o clima estava bem esquisito.

Como era clássico fui com um certo receio por conta de brigas de torcida, preocupado sobretudo, com o retorno para casa. Por isso, levei além da minha surrada camisa grená do Flu, acho que ela me dá sorte nos jogos, levando também uma camisa do sindicato que trabalho como jornalista, o Sindipetro-RJ. Na camisa estava escrito um texto sobre uma campanha pela melhoria do plano de cargos e salários da Petrobrás, até aí nada demais.

Antes de entrar no estádio passei pela revista da segurança privada que libera o acesso dos torcedores. Depois de ter me revistado o trabalhador da segurança privada pediu para ver minha camisa, achei estranho. Ele leu e meu devolveu, mas perguntei logo: o que não poderia estar escrito aí? “Palestina”, ele me respondeu. Já entrei cismado, já que sou militante da causa.

Subi a rampa de acesso às arquibancadas e entro no setor que estou acostumado a assistir os jogos do Flu e me posiciono, como sempre atrás do gol, hábito que herdei da minha mãe, também tricolor.

Atrás do meu lugar vejo dois rapazes conversando em espanhol, imagino que sejam argentinos, pois entoam em sua língua versões de músicas da organizada do Fluminense. Momento antes do início do jogo chega um amigo meu que sempre assiste os jogos comigo, ele se senta a meu lado e começa a enrolar um “cigarrinho”, nada de mais, nada me incomoda, é jogo do Flu, é no Maracanã, um espaço que já foi democrático. Pois se não deixam entrar com uma camisa ou bandeira de um determinado país como Palestina, deixa de ser um espaço democrático.

Abordagem estranha

Mas a bola rola, e meu amigo segue lentamente enrolando seu cigarro, e um dos turistas, que estava com a camisa do Flu pergunta: ‘¿Esto es marihuana?”. Meu amigo responde que não, e retruca se a fumaça incomoda, e eles não entendem. Assisto o jogo, já tomamos um gol aos oito minutos de jogo, e fico chateado. Ouço o meu amigo perguntar: “vocês são de onde?”. E logo vem a resposta: “Israel!”

Escuto e fico grilado, assisto o jogo e preocupado com os caras atrás de mim. No gol do Flamengo um deles gritou, como se estivesse vibrando, penso “que cara estranho...”

Intervalo de jogo meu amigo foi dar um giro na arquibancada, e os dois israelenses permanecem. Há uma movimentação no gramado, atrás do gol, são soldados do BEPE, Batalhão Especializados de Policiamento em Estádios, aqui da PMRJ do Rio de Janeiro. Fazem evoluções com seus porretes e escudos, usam máscaras. Os dois israelenses próximos de mim também olham, e começam a conversar numa língua que acho que é hebraico. Pareciam elogiar os soldados, imagino que também sejam soldados.

Sinto calor, me dá vontade de tirar a camisa, mas fico preocupado pois tenho uma tatuagem em árabe nas costas. Não tiro, fico com medo da reação dos caras israelenses. Fico pensando e lembrando que vários soldados sionistas estão fazendo turismo no Brasil. Em Florianópolis, Salvador e Rio de Janeiro.

Pois é, eles passeiam livremente como se não praticassem crimes contra a humanidade em Gaza, na Palestina, no Líbano e na Síria.  E o Maracanã não é mais o mesmo, muito menos um espaço democrático.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.

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