“Os fariseus fazem uma armadilha para apanhar Jesus em alguma palavra. Primeiramente, eles começam elogiando Jesus, dizendo que Ele é verdadeiro e não se deixa influenciar pela opinião dos outros. Depois, eles perguntam a Jesus se é lícito ou não pagar o imposto a César. César era governador e pertencia ao império Romano na época e, como sabemos, o Império Romano governava Israel. Jesus usou como sempre de uma grande sabedoria para dar a resposta e não disse nada que lhe comprometesse ou comprometesse seus discípulos. Se Jesus respondesse que não deveria pagar o imposto a César, iriam dizer que Ele era contra o Império Romano. E se Ele dissesse que tinha que pagar, iriam dizer que Ele estava ao lado do governo e não ao lado do povo. De todas as formas, queriam apanhar Jesus na resposta que Ele disse. Assim, Jesus pede que lhe apresentem a moeda e pergunta qual a figura que está na moeda, e eles responderam: de César. Diante disso, sabiamente Jesus responde ‘Dai, pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus’ (Mt 22,21). Nessa resposta, sutilmente Jesus quer dizer que todos devem cumprir com as suas obrigações, seja com o governo ou seja com Deus”.
Sinal dos tempos. A tarefa de defender e preservar o núcleo progressivo dos supostos ensinamentos de um camponês judeu (I.N.R.I), analfabeto de origem aramaica, que viveu no século I D.C. Sim, no ano 1 depois de Cristo. Ou em linguagem laica, no primeiro ano da Era Comum.
Há muito está estabelecida a existência de um certo judeu da galileia, pregador messiânico, executado pelas autoridades coloniais do império Romano. A influência da religião cristã oficial na Europa e nas América teria se iniciado por volta do século 4 da Era comum - e segue firme e forte até os dias de hoje, para o bem e para o mal.
(Viva Renato Russo).
O fato é que nesses dias tão estranhos, quando a poeira nem se dá mais ao trabalho de se esconder pelos cantos, acabou sobrando para nosotras: ateus, cartesianos, racionalistas, iluministas, newtonianos, darwinistas, feministas, existencialistas, marxistas, nietzschianos, leninistas, punks, céticos, agnósticos e admiradores de Bergoglio (o papa peronista) uma trivial tarefa: resgatar, defender e divulgar o legado progressista do novo testamento. É preciso disputar Jesus com os fascistas e com os fariseus modernos, mercadores da fé. Um bando de homens feios, brochas, machistas, racistas, homofóbicos, autoritários - e sobretudo cínicos.
A César o que é de César, a Deus o que é de Deus. Nada mais atual. A liberdade religiosa, pilar de qualquer regime democrático, é indissociável dos princípios da laicidade, do pluralismo, da liberdade individual, da igualdade, da defesa e promoção dos direitos humanos.
A história registra: o Estado laico é uma conquista da luta das minorias. Dos cristãos perseguidos pelos romanos, dos mulçumanos esmagados por cristãos em suas “cruzadas”, das mulheres carbonizadas nas fogueiras, dos judeus cassados por centenas de anos, obrigados a se esconder, mudar de nome, negar sua fé, estigmatizados desde a Inquisição até os campos nazistas - hoje, triste e ironicamente, o Estado de Israel faz com os palestinos o mesmo que os nazi fizeram com os judeus há quase 80 anos.
Antes mesmo de me identificar com o marxismo, tornei-me fã de Feuerbach: “Não foi deus quem criou o homem, mas sim foi o homem quem criou deus à sua imagem e semelhança”.
(A propósito, Caetano sempre teve razão, e quem há de negar que “só é possível filosofar em alemão”).
Voltando ao tema do artigo: é hora de ensinar cristianismo aos cristãos. Em defesa da pluralidade religiosa e do Estado laico. Sim, life is hard, mas, cá entre nós, também é muito divertida. De real e de viés.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.