O ano era 2022 e o Brasil vivia seu momento mais dramática numa eleição que colocava face a face duas visões de mundo, de país e de sociedade. Lula (PT) sairia vencedor por uma pequena diferença de votos sobre Jair Bolsonaro (PL), mas o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), no auge de seu antipetismo patológico, daria apoio explícito ao desajustado líder da extrema direita, sob a justificativa de que “não estaria ao lado do PT”. Nenhuma novidade àquela altura, depois da campanha sórdida de Melo, dois anos antes, para vencer a concorrente ao posto de governante da capital gaúcha, Manuela D’Ávila (PCdoB), alvo de uma enxurrada de insultos moralistas, fake news, discursos de ódio e misoginia perpetrada pelo grupo político de seu adversário de direita.
Agora, em maio de 2024, com Porto Alegre submersa e vítima da fúria das águas do Lago Guaíba, o prefeito que tanto odeia Lula, e que já saiu em fotos todo faceiro gargalhando ao lado de Bolsonaro, assiste ao governo federal liderado pelo estadista de esquerda socorrer a cidade que deveria ter sido protegida por ele. Com um sistema de comportas obsoleto, inaugurado em 1974, a administração municipal da capital gaúcha parecia apenas esperar o momento em que a tragédia ocorreria. E ela ocorreu.
Coordenando aquela que já é a maior operação de socorro e reconstrução de uma área de catástrofe da História do Brasil, provocada pelas devastadoras chuvas e enchentes que varreram o Rio Grande do Sul nas duas últimas semanas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) resolveu mudar o tom do discurso e apontar que o momento trágico vivido pelo povo gaúcho não é só obra da natureza, mas sim o resultado da incompetência e da ineficiência do poder público, sobretudo no que diz respeito à capital Porto Alegre. Lula foi claro ao dizer na tarde de segunda-feira (13), durante uma reunião ministerial, em Brasília, que o caos no estado “não foi só fenômeno da chuva”.
Melo pula de galho em galho nas entrevistas concedidas às emissoras de TV, portais e outros veículos de comunicação nesses dias conturbados. Desvia e dribla as perguntas incômodas sobre a incompetência de sua gestão, assim como de anteriores, no que diz respeito a uma modernização nunca feita no sistema de contenção das águas do Guaíba. Ele prefere aparecer falando que seus subordinados estão colocando sacos de areia para conter as cheias.
Na outra ponta, Lula, aquele com quem Melo jamais estaria ao lado, realiza em todo o território gaúcho uma das maiores, mais complexas e mais caras operações de resgate e socorro da História do Brasil. Para se ter uma ideia, falando apenas de servidores das Forças Armadas, mais de 15 mil militares estão em campo neste momento no estado. Essas organizações utilizam desde a primeira hora da tragédia 16 helicópteros de média e grande capacidade de carga, 2 aviões cargueiros modernos, 243 embarcações das mais variadas dimensões e utilidades, além de, entre equipamentos de socorro, engenharia, resgate e viaturas, mais de 2.500 itens enviados pelo governo federal.
Fora dos quadros militares, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviou para o teatro de operações 325 agentes da Polícia Rodoviária Federal, 319 da Polícia Federal e uma centena da Força Nacional de Segurança Pública. Essas corporações levaram ao Rio Grande do Sul quatro helicópteros, 48 picapes especiais para terrenos de difícil acesso, 18 barcos de resgate, seis reboques, dois caminhões com grande capacidade de carga, um caminhão-tanque com combustível para abastecimento de veículos em áreas remotas e intransitáveis, além de um jet-ski.
A Marinha do Brasil deslocou dezenas de barcos pequenos e médios e também o Navio-Aeródromo Multipropósito (NAM) “Atlântico”, o maior e mais moderno navio de guerra de toda a América Latina, que pode operar como base de comando, hospital e ponto de pouso e reabastecimento para dezenas de helicópteros.
No âmbito administrativo, mais de R$ 1 bilhão foram liberados em emendas para o estado, em caráter de urgência, visando as primeiras e mais prementes ações de reconstrução. Outro repasse, este no valor de R$ 930 milhões, foi autorizado pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social para ser injetado em pagamentos antecipados do Bolsa Família, do Benefício de Prestação Continuada e no Programa de Aquisição de Alimentos. Somente em medidas econômicas, como os programas mencionados e outros, como o auxílio gás, além da restituição antecipada do Imposto de Renda, crédito para micro, pequenas e médias empresas, adiantamento para fundos municipais e vigência de parcelas extras do auxílio desemprego, o governo federal liberou R$ 51 bilhões.
Se Melo fosse depender de Jair Bolsonaro, que tanto bajula, sendo ele ainda presidente ou não, estaria frito. O extremista desocupado desapareceu assim que as chuvas engoliram o Rio Grande do Sul e em especial Porto Alegre. Quando ainda estava no cargo, em dezembro de 2021, o líder arruaceiro preferiu passear sorridente de jet-ski do que socorreu a população baiana que enfrentava uma devastação semelhante.
Com o pires na mão e vendo Lula tomar um protagonismo que ele jamais teria condições de chamar para si, o prefeito de Porto Alegre terá a partir de agora bastante tempo para repensar sua posição antidemocrática, reacionária e sectária de “não estar ao lado do PT” em hipótese alguma, mesmo sendo socorrido pelos políticos do partido.