O primeiro-ministro da Espanha e líder socialista, Pedro Sánchez, decidiu, nesta segunda-feira, 29, permanecer à frente do executivo espanhol. Na última quarta-feira, Sánchez, secretário-geral do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), sacudiu o noticiário político do país ibérico ao ameaçar renunciar ao cargo. Pediu cinco dias para refletir. E assim o fez.
A possível renúncia pegou todos de surpresa, afinal tinha acabado de comemorar a vitória de sua coalizão política nas eleições regionais do País Basco e se preparava para iniciar a campanha na Catalunha, com boas perspectivas de vitória para a esquerda.
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Sanchez está à frente do executivo espanhol desde 2018. Mesmo se equilibrando numa frágil maioria parlamentar, tem colocado em marcha um plano progressista de governo num país que assiste, ao mesmo tempo, ao avanço da extrema-direita (VOX) e à radicalização da direita conservadora (Partido Popular).
Mas o que levou Sánchez a ameaçar deixar o Palácio Moncloa, sede do governo espanhol, de forma tão drástica e repentina? E o que o fez permanecer no cargo?
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Sánchez é alvo daquilo que conhecemos bem no Brasil: o lawfare. Sim, o mesmo método, utilizado em larga escala pela Lava Jato no Brasil, asfixia a instável democracia espanhola.
A gota d’água foi uma ação aberta por um juiz de Madri contra a esposa de Sánchez, Begoña Gomez, baseada numa acusação feita por um “sindicato” de sugestivo nome “Manos Limpias”, ou seja, Mãos Limpas, a operação italiana que inspirou Moro, Dallagnol e a turma da República de Curitiba. Tal “sindicato” é famoso por abrigar em suas filas membros da direita e da extrema-direita espanhola e coleciona denúncias polêmicas.
Um dia após Sánchez ameaçar sair de campo, o “Manos Limpias” reconheceu que sua denúncia contra Gomez poderia se basear em informações falsas. É o método lavatista: a denúncia vazia, a repercussão na mídia e nas redes e, por fim, a destruição da reputação. Lembremos que foram justamente nos recortes de jornais que nascia a pseudo denúncia que desembocou no furado caso triplex do Guarujá, forjado para tirar Lula das eleições.
Ao ameaçar deixar o governo, Sánchez publicou uma carta, onde denunciou a campanha de deslegitimação e desumanização feita por adversários políticos por meio de denúncias falsas, seguida pela propagação de fake news nas redes sociais e meios de comunicação. O primeiro-ministro espanhol ainda citou Umberto Eco, ao lembrar da “máquina de lama” de notícias.
Tal moedor de reputações, manipulado com habilidade pela extrema-direita, já causou estragos à democracia mundo afora, mas principalmente a líderes de esquerda. No Brasil, vimos o golpe de 2016 e a ascensão do neofascismo bolsonarista.
Pedro Sánchez percebeu que estava indo para o mesmo caminho, por isso agiu de forma drástica. E o movimento deu resultado. A esquerda espanhola se mobilizou nos últimos cinco dias. Manifestações de rua e debates foram organizados. Não se falou de outra coisa senão o destino do líder espanhol.
A mensagem de solidariedade do presidente Lula repercutiu nas TVs e jornais da Espanha. A Lula se juntaram outros líderes de esquerda, como o presidente colombiano Gustavo Petro. Em Madri, personalidades da cultura fizeram um grande ato de apoio, onde foi lida uma carta do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, expressando solidariedade ao líder socialista, denunciando a existência de uma “técnica” baseada na “crueldade e tortura psicológica” para eliminar o adversário político com a “conivência” do Poder Judiciário, o que põe em risco a “frágil” democracia espanhola.
Nesta segunda-feira, Sanchez optou pelo fico. Prometeu lutar contra o movimento reacionário global que tenta impor sua agenda através da difamação e da falsidade. “Vamos mostrar ao mundo como se defende a democracia", disse num pronunciamento à nação, após enorme expectativa. Em cinco dias, Sánchez colocou a questão do lawfare e da desinformação no centro do debate e parece ter saído mais forte da disputa. Sua permanência à frente do governo espanhol é uma boa notícia para a democracia, para a luta contra o lawfare, a desinformação e o avanço da extrema-direita.
Wellington Mesquita é jornalista