O impacto da geopolítica do petróleo no Brasil é nítido e tem pegadas óbvias dos Estados Unidos
Não dá para tratar a geopolítica do petróleo somente com as ideias de republicanismo, democracia e diplomacia. É fato que o ouro negro desperta tanto interesse que sociedades inteiras chegam à violência extrema, como a guerra, por ele.
Aqui no Brasil as pegadas da luta suja pelo petróleo também podem ser tratadas como fato. Seja pelo trabalho de Julian Assange no Wikileaks e de Eduardo Snowden nos vazamentos da NSA, dá para notar claramente o interesse norte-americano no petróleo brasileiro.
Snowden provou que a Petrobrás foi espionada ilegalmente pela NSA. O fato se explica por si só.
Já o Wikileaks revelou um grande esquema de lobby sobre o Pré-Sal brasileiro. Para ilustrar, uma então diretora da Exxon chegou a comentar:
“A Petrobrás terá todo controle sobre a compra de equipamentos, tecnologia e a contratação de pessoal, o que poderia prejudicar os fornecedores americanos.”
Por fim, deixo aqui um texto de opinião do jornalista Kennedy Alencar, que considera a Lava Jato como um instrumento do “soft power” diplomático dos EUA.
Os EUA utilizam um procedimento (conhecido como FCPA - Foreign Corrupt Practices Act) como ferramenta geopolítica de poder
Os EUA usam uma lei local para legitimar pressões do próprio país em empresas que tenham alguma ligação com seu território.
Quem diz isso é William Burck, um ex-procurador sênior de combate à corrupção no Departamento de Justiça americano, em entrevista ao site Conjur. Confira:
“E fala com propriedade: “Não há a menor dúvida de que a FCPA seja um instrumento de política externa do governo dos EUA”. A sigla é para a lei de corrupção internacional dos EUA. Por meio dela, os procuradores do DoJ podem acusar qualquer pessoa ou empresa do mundo que tenham passado pelos EUA — e num tribunal norte-americano.”
Aqui no Brasil é fato que a Lava Jato utilizou a FCPA para punir empresas brasileiras, como argumenta o atual ministro do STF Cristiano Zanin em entrevista ao Conjur.
A parceria entre Lava Jato, FBI e Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) foi feita às escondidas e de maneira ilegal
Estamos falando da maior empresa do país, uma estatal, inserida no mercado mais importante deste século. É inadmissível que meia dúzia de funcionários públicos do Paraná escondam conversas desse nível.
A Lava Jato escondeu dos poderes públicos uma parceria profunda com o FBI e com o próprio Departamento de Justiça dos EUA (DoJ - Department of Justice). Os procuradores brasileiros, de maneira ilegal, forneceram material e tiveram reuniões escondidas com os procuradores e políticos estadunidenses.
Há inúmeras evidências sobre esse conluio e um dos trabalhos mais completos que temos sobre foi feito pela Agência Pública e pode ser conferido aqui. Em um dos trechos, o ex-procurador e ex-deputado cassado Deltan Dallagnol explicita que não irá se reportar ao governo brasileiro (como mandava a lei) por exigência do DoJ.
“Só depois da meia-noite, já no dia 7 de outubro de 2015, Aras recebeu uma resposta de Deltan Dallagnol. Ele não quis dar detalhes ao MJ, sugerindo a Aras que, em vez disso, “eles consultem o DOJ, porque eles pediram que mantenhamos confidencial”. Ou seja: preferiu proteger o relacionamento com os americanos a dar explicações ao governo brasileiro.”
Agentes do DoJ e FBI treinaram policiais e procuradores brasileiros para proteger os interesses americanos
Uma matéria completa do Le Monde, um jornal francês (país que também foi impactado pela FCPA no caso da Alstom), mostra como os EUA se planejaram para aumentar sua influência sobre o Brasil de maneira estratégica.
O Conjur apresentou uma tradução da matéria do Le Monde onde demonstra, claramente, que prepostos do DoJ vieram para o Brasil para articular uma política de atuação da FCPA. Isso aconteceu em 2013, como podemos ver no trecho da reportagem a seguir:
“Em novembro daquele mesmo ano, o procurador geral adjunto do DOJ norte-americano, James Cole, anunciou que o chefe da unidade do FCPA viria imediatamente para o Brasil, com o intuito de "instruir procuradores brasileiros" sobre as aplicações do FCPA.”
E também em 2014, ano da Lava Jato, a procuradora-adjunta do DoJ, Leslie Caldwell, repetiu as palavras da então diretora da Exxon, em 2009, revelada pelo Wikileaks, e disse que era necessário proteger os interesses norte-americanos:
Leslie Caldwell, procuradora-adjunta do DOJ, afirmou em uma palestra em novembro de 2014: "A luta contra a corrupção estrangeira não é um serviço que nós prestamos à comunidade internacional, mas sim uma medida de fiscalização necessária para proteger nossos próprios interesses em questões de segurança nacional e o das nossas empresas, para que sejam competitivas globalmente."
Foi o DoJ que tentou abastecer a Lava Jato com um fundo ilegal de R$2,5bi
Na dúvida, sempre siga o dinheiro.
Em um dos acordos mais sem pé nem cabeça que a Petrobrás pós-golpe encampou, o DoJ determinou que a empresa pagasse um montante bilionário para a força-tarefa Lava Jato. Isso mesmo, há uma ligação financeira e bilionária entre a Lava Jato e o Departamento de Justiça dos EUA.
O acordo foi considerado ilegal pelo STF, pelo ministro Alexandre de Moraes, que chegou a argumentar na sua decisão que “parece ter ocorrido ilegal desvirtuamento na execução do acordo realizado entre a Petrobras e o Department of Justice”.
E para finalizar com chave de ouro, a cereja do bolo: o ex-deputado cassado Deltan Dallagnol também escondeu de autoridades brasileiras suas conversas com o DoJ para receber o fundo bilionário, segundo mensagens interceptadas pelo Telegram do ex-procurador. Deltan chegou a dizer a um procurador suíço que poderia o colocar em contato com o pessoal do DoJ:
“Se quiser, posso colocá-lo em contato direto com as autoridades da SEC e do DOJ com quem conversamos. Eles disseram que estão disponíveis".
Bônus: Lava Jato, entre que quatro paredes
E para aqueles que estão com mais tempo e paciência para entender o assunto, recomendo a série feita pelo canal Normose, em parceria com o SindipetroNF, sobre os interesses da Lava Jato ligados à política brasileira e à geopolítica do Petróleo. São quatro capítulos de aproximadamente uma hora que já em 2020 revelava as evidências da pressão norte-americana sobre o petróleo e a indústria de engenharia pesada do Brasil.