BASE DO GOVERNO

Equívocos do governo na relação com o União Brasil estão custando caro. Lula quer consertar

Rui Costa colocou seus interesses paroquiais acima dos do governo na montagem do Ministério e vetou Elmar Nascimento nas Comunicações. O veto revelou-se um equívoco político. Outros dois caciques seguiram o caminho de Rui Costa e o desastre completou-se

Elmar Nascimento e Rui Costa.Créditos: Câmara dos Deputados / Ag. Brasil
Escrito en OPINIÃO el

Antes da posse, em dezembro passado, em meio às articulações para a montagem do governo Lula, vazou, do CCBB, o Centro Cultural do Banco do Brasil, que o deputado Elmar Nascimento, da Bahia, líder do União Brasil na Câmara, seria o ministro das Comunicações.

Era uma escolha natural, se a intenção de Lula era ter o União Brasil em sua base de apoio. Nascimento é o maior líder do partido na Câmara e sua influência ultrapassa os limites do UB, estendendo-se por uma larga porção de deputados de centro-direita. Depois de Arthur Lira, talvez seja o parlamentar mais influente na Casa, ao lado do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), hoje líder da Maioria.

Seu nome, porém, foi fuzilado numa operação comandada pelo então futuro chefe da Casa Civil, Rui Costa. “O PT da Bahia vetou o nome de Elmar Nascimento”, leu-se nas reportagens à época. Mas o veto partiu diretamente de Costa, que comanda o partido na Bahia com mão de ferro; petistas que abrem qualquer divergência com o ex-governador são lançados numa espécie de exílio político em pleno território baiano.

Com o veto, o escolhido para ministro das Comunicações acabou sendo Juscelino Filho (UB-MA), um deputado inexpressivo, sem qualquer relevância em seu partido e cuja indicação abriu um conflito mantido meio às sombras mas que é cada dia mais acirrado entre Rui Costa e Flávio Dino -o agora ministro da Justiça ficou inconformado com a nomeação de um desafeto seu, ainda mais sem qualquer contribuição ao governo, em vez de Elmar Nascimento.

Como futuro chefe da Casa Civil, Rui Costa deveria ter colocado o interesse do país e do governo Lula acima de tudo. Mas em vez disso, colocou sua paróquia.

A partir daí, todo o arranjo com o União Brasil saiu dos eixos. Sem a colaboração de Elmar Nascimento, que ficou furioso, o futuro governo socorreu-se do senador Davi Alcolumbre, do União Brasil do Amapá. Ele, de fato, tem influência no Senado. Mas peso zero na Câmara. Participou da articulação para levar Juscelino Filho e realizou uma segunda operação que desagradou todo o partido e ampliou o desastre. Inventou o nome do então governador do Amapá, Waldez Goés, para ser o segundo representante do UB no governo.

Um desastre, de fato. Goés é filiado ao PDT e não ao UB. Quando seu nome foi anunciado, garantiu-se que ele se transferiria ao União Brasil. Logo após a posse, em 5 de janeiro, Goés declarou, entretanto, que se não filiaria ao partido. Um erro primário do governo nascente. Obviamente que o União Brasil não se sente representado pelo ex-governador que, na verdade, representa unicamente Alcolumbre, pelas relações que ambos mantêm no Amapá. Uma escolha paroquial, portanto. 

Para completar a catástrofe política, o terceiro nome do União Brasil guindado ao Ministério foi o da deputada Daniela Carneiro. Para compor um governo que tem agenda feminista, Daniela mudou seu nome político. Até o ano passado, ela tinha o nome de Daniela do Waguinho -assim mesmo, Daniela pertencente ao Waguinho. Ele, Wagner dos Santos Carneiro, que tem o nome político de Waguinho, é prefeito e cacique político em Belford Roxo, no Rio de Janeiro. Ambos têm uma história de envolvimento com milícias, fartamente documentada.

O casal Waguinho tem  uma sopa de letrinhas partidárias em sua trajetória. Ele passou pelo PSDB (2003-07), PRTB (2007-13), MDB (2013-21) e PSL (2021-22). Ela, pelo PSC (2003-11), PRTB (2011-13), PR (2013-18) e MDB (2018-22). Em 2022, ambos ingressaram no União Brasil, num arranjo paroquial, que acabou servindo a um projeto nacional.

Em uma articulação de um dos maiores caciques do PT fluminense, o ex-presidente da Assembleia Legislativa André Ceciliano, agora braço direito de Alexandre Padilha na SRI, o casal Waguinho apoiou Lula no segundo turno, em 2022. Veja a foto que, em 11 de outubro, simbolizou a aliança.


Lula caiu num conto do vigário. O apoio foi embalado numa promessa de grande votação para o candidato do PT no segundo turno das eleições em Belford Roxo com ampla repercussão na Baixada Fluminense. Pois Lula levou uma sova de Bolsonaro nas urnas no segundo turno. Bolsonaro teve 60% dos votos na cidade, Lula pouco menos de 40%. Chega a ser tragicômico: no primeiro turno, Bolsonaro teve menos votos que no segundo -54%.

Mesmo com o conto do vigário, Daniela, agora Carneiro, acabou sendo conduzida ao Ministério do Turismo. Não como representante do UB, mas apadrinhada por Ceciliano.  

Ou seja, a rigor, apesar de o União Brasil ter propalados três ministros no governo Lula, na verdade não tem nenhum.

Para completar, a dupla Juscelino Filho-Daniela Carneiro tem sido uma usina de crises sucessivas com um desempenho ministerial medíocre. 

Não tenho qualquer simpatia ou afinidade com o União Brasil, mas exigir “fidelidade” do partido ao governo é algo injusto e nada razoável. 

Tanto que nesta quarta-feira (31), no auge da crise da MP da Esplanada, Lula chamou Elmar Nascimento para uma conversa e confessou ter sido um grande equívoco o veto ao nome dele para o Ministério. Há na bancada do PT quem defenda a correção do monumental erro político com um novo convite para o líder do União Brasil. Mas muita água e mágoa já passaram debaixo da ponte, não se sabe se o arranjo seria possível agora.

Os interesses dos caciques Rui Costa, Alcolumbre e Ceciliano conduziram o governo Lula a uma sucessão patética de erros primários no jogo político. O mais grave foi o primeiro, do agora chefe da Casa Civil. Ali começou o desacerto -e foi cometido exatamente por quem deveria cuidar dos do governo Lula acima de tudo, em vez de se dedicar ao jogo paroquial.

O prejuízo para o governo foi brutal. O UB tem a terceira maior bancada na Câmara, com 59 parlamentares, menor apenas que a do PL (99) e a do PT (68) e é uma das colunas do Centrão. Se a relação tivesse percorrido outro caminho, a história do governo Lula na Câmara teria sido bem diferente nesses cinco meses.

De qualquer forma, Lula tem diante de si a possibilidade de arregaçar as mangas e consertar o desastre.

Veremos os próximos lances.