CHORÃO

Dez anos sem Chorão – conversas e confissões de um quase amigo

Fomos próximos durante algum tempo, o suficiente para boas conversas e risadas, alheios à fama e tudo o mais que o envolvia

O cantor Chorão.Créditos: Divulgação
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Chorão não era exatamente um amigo, mas era bem próximo. A gente se encontrava de vez em quando pela manhã, eu indo pro trabalho e ele voltando de shows. Ensaiamos fazer algumas canções que nunca fizemos e marcamos alguns encontros que nenhum dos dois jamais foi.

Mas dávamos boas risadas, daquele jeito bem santista, debochado. Naquelas manhãs, ele voltava a ser o garoto de antes, que andava pra lá e pra cá de skate e ria da vida. Certa vez, pouco tempo antes de partir, me contou – e isso nunca disse a ninguém – que adoraria remontar o Charlie Brown Jr. original.

Não que fosse algum segredo, apenas nunca comentei. O único dos antigos companheiros da banda que não retornou foi justamente o Renato “Pelado” que, por coincidência, havia tocado comigo durante vários anos, até seguir seu voo para o Charlie Brown Jr., para orgulho de todos nós.

Pelado passou, desde então, a ter uma vida bem atuante na igreja evangélica Bola de Neve e se afastou completamente da banda. Os dois, para infelicidade de inúmeros fãs, nunca mais tocaram juntos.

Pelado é um grande baterista, pesado, bem ao gosto do som tão marcante do Charlie Brown Jr. Foi substituído pelo André Ruas, conhecido como Pinguim, e depois pelo Bruno Graveto. Os dois sempre deram conta do recado, o que tornou mais fácil para que todos seguissem suas vidas.

A do Alexandre, nosso querido Chorão, infelizmente terminou de maneira trágica no dia 6 de março de 2013. Na próxima segunda-feira (6), completam dez anos de sua partida. Soube de maneira trágica através de um dos monitores dos trens do Metrô de São Paulo. Voltei a Santos de noite e fui direto para o ginásio de esportes da prefeitura, onde havia uma multidão em torno do seu velório.

Daquele dia em diante, ao contrário de todos os anos anteriores de sucesso, passei a conviver muito mais com o mito que se criou em torno dele do que com o quase amigo. Chorão sempre foi comigo uma pessoa acessível e afável. O personagem, que só fez crescer diante de todos a partir de então, passou a ser de todos e não apenas de alguns conterrâneos que o conheceram.

Ouço suas canções até hoje. O Charlie Brown Jr. ainda tem, dez anos após sua partida, quase cinco milhões de ouvintes mensais no Spotify. Vira e mexe elas voltam a tocar em alguma novela ou programa de televisão. Trazem, até hoje, aquele jeitão santista, relaxado e, ao mesmo templo, repleto de ansiedades, coisa que era bem do seu jeito.

Ouço seus discos, vejo vídeos, folheio o lindo livro “Eu Estava Lá Também”, um belo trabalho idealizado por ele, conduzido pelo seu filho, Alexandre Ferreira Lima Abrão, e editado pelo amigo José Tahan, e me pego sorrindo com o título. De alguma forma, eu também estava.

No mais é assim. Há dez anos, o Brasil perdia um de seus grandes artistas. E nós, aqui dessa ilha do Atlântico, um dos nossos melhores filhos.