O rombo de R$ 20 bilhões no balanço das Lojas Americanas que provocou a renúncia do presidente, Sergio Rial, e do diretor de relações com investidores da empresa, André Covre, expõe a falácia neoliberal sobre a "excelência em gestão" e a sanha do mercado financeiro que conspira para implantar o propalado "Estado Mínimo", com foco na privatização de grandes empresas estatais, que são responsáveis em grande parte pelo equilíbrio econômico-financeiro e, principalmente, pela justiça social no país.
É bom lembrar que a ascensão do governo fascista de Jair Bolsonaro (PL) ao poder só foi permitida pelo mercado e por setores da mídia neoliberal - entenda-se Globo - após o deputado medíocre e ignorante confesso em economia apontar como seu "posto Ipiranga" o "Chicago boy" Paulo Guedes, que aprendeu in loco e operou na sua passagem pela ditadura chilena do general Augusto Pinochet as medidas do mercado que seriam conhecidas em 1989 como Consenso de Washington.
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O rombo nas Americanas ainda expõe a atuação parcial de grandes empresas transnacionais de consultoria como a PwC (Price Waterhouse Coopers), que aos moldes "meritocráticos" do "papai pagou, passou", colaboram diretamente com o roubo praticado pelos bilionários do setor financeiro.
Uma das quatro maiores empresas de consultoria e auditoria do mundo, a PWC, que que aprovou balanços fraudulentos das lojas Americanas, também foi a responsável por avalizar, novamente via balanços fraudulentos, a privatização da Eletrobras, imposta a toque de caixa por Guedes e o governo Bolsonaro.
Briga de cachorro grande
A turbulência no mercado financeiro causado pelas mentiras no balanço das Americanas coloca em pé de guerra os principais ricaços do país, que fazem parte do 1% da burguesia brasileira que controla mais de 50% da riqueza nacional - enquanto os 50% mais pobres detêm apenas 1% dos bens do país -, segundo dados divulgado no the World Inequality Report 2022, produzido pelo World Inequality Lab, que é co-dirigido pelo economista Thomas Piketty.
De um lado está o BTG Pactual, banco fundado por Paulo Guedes e comandado atualmente por outro fundador André Esteves, que acusa os acionistas da 3G Capital, que têm 40% das ações das Americanas, de construírem “seus impérios em bases que não são tão sólidas quanto parecem”.
“Tudo indica que todo esse ardil já está sendo planejado e operado há muito tempo. Ao apagar das luzes de 2021, a 3G Capital simplesmente abre mão do controle da companhia, curiosamente sem qualquer prêmio, criando a figura de ‘acionistas de referência’ para seguir controlando suas decisões por trás dos panos, sem a exposição ordinária de um controlador comum", diz a ação movida pelo escritório Galdino & Coelho em nome do banco que tentou impedir o bloqueio, sequestro ou penhora de bens da empresa, depois da divulgação do rombo financeiro de R$ 20 bilhões.
Do outro lado estão os "ardilosos", segundo a ação do BTG, bilionários do 3G Capital, fundo de investimento privado com patrimônio avaliado em R$ 180 bilhões que é comandado por Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira - que estão no topo da "lista da Forbes" no Brasil e no mundo.
Além de deter 40% das ações das Americanas, o 3G Capital controla diversas transnacionais que operam no Brasil, como AB InBev, Kraft-Heinz e Burger King.
Sergio Rial (ex-Santander) e André Covre, que renunciaram após a descoberta do rombo, haviam tomado posse no dia 2 de janeiro, após a 3G Capital abrir mão do controle da empresa - como indica a ação do BTG.
A briga entre os bilionários provocou uma queda de quase 80% das ações da rede varejista, que chegou a R$ 1,94, patamar bem abaixo dos R$ 12 de antes dos escândalos contábeis das Americanas, puxando a queda de 1,54% do índice Bovespa nesta segunda-feira (16).
Nos próximos dias, a Americanas deve declarar insolvência para passar por um processo de recuperação judicial para negociação das dívidas impostas pela "meritocria" e "excelência de gestão" dos financistas da 3G Capital.
E os 44 mil trabalhadores da rede?
A disputa dos cabeças do PIB brasileiro, retratada nas páginas de sites, TVs e jornais controlados pelo sistema financeiro, oculta o drama de 44 mil trabalhadores que atuam como "associados" - são chamados assim pela empresa - na rede.
No total, 85% deles atuam de forma permanente nas lojas e centros de distribuição de todo o país e os outros 15% são mão-de-obra temporária.
Segundo o presidente do Sindicato dos Comerciários na cidade de São Paulo, Ricardo Patah, até o momento não há informação de que haverá demissões e não há queixas de falta de pagamento.
Em caso de falência, a lei determina que os funcionários têm prioridade para receber os créditos até o limite de 150 salários mínimos.
No entanto, uma brecha aberta no golpe contra Dilma Rousseff, que levou Michel Temer (MDB) ao poder, pode causar uma demissão em massa dos trabalhadores.
A Reforma Trabalhista de 2017 liberou a demissão em massa de trabalhadores sem a necessidade de mediação dos sindicatos - uma das dezenas de medidas que retiraram direitos da classe trabalhadora.
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em junho de 2022, entretanto, reverteu a questão e determinou que as entidades representativas dos trabalhadores participem das negociações sobre os desligamentos.
Porém, elas não têm o poder de impedir as dispensas, caso o acordo não seja considerado satisfatório para as partes.
Em meio à briga dos bilionários neoliberais, o ônus deve sobrar para o governo, que atua na economia real, para evitar que mais uma parcela da população brasileira seja jogada nas mazelas do desemprego e da desesperança.