FAKE NEWS

Não sou solidário ao PCO. Explico a razão - Por Mauro Lopes

O PCO deixou de ser um partido de esquerda há tempos. É uma expressão do bolsonarismo com roupagem vermelha. Não sou solidário a eles

Bolsonaro e Pimenta, investigados no inquérito das fake news.Bolsonaro e Pimenta, investigados no inquérito das fake newsCréditos: Valter Campanato/EBC - Felipe Gonçalves/Brasil 247
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Uma pessoa conhecida procurou-me pelo Whatsapp perguntando se eu estou solidário ao PCO por causa da inclusão do partido no inquérito das fake news no STF e do bloqueio dos perfis nas redes (que até esta sexta-feira, 3, não havia acontecido).

Não, não sou solidário a eles. O motivo da abertura do inquérito foi um tuíte do PCO no qual o partido afirma que a Corte tem “sanha por ditadura”. O PCO exigiu a  “dissolução do STF” e disse que os ministros estariam preparando um “golpe nas eleições”.

Os ataques do partido da família Pimenta são exatamente os mesmos realizados pelo clã Bolsonaro mais de uma vez e pelo bolsonarismo em geral. Sem tirar nem pôr. 

Não sou solidário com os demais incluídos no inquérito das fake news. Não me solidarizo com Jair Bolsonaro, Allan dos Santos, Bernardo Pires Kuster, Sara Winter, Luciano Hang, Otávio Oscar Fakhoury e outros companheiros de Rui Pimenta e do PCO no inquérito. 

O fato de o PCO estar arrolado no inquérito não é fortuito. O partido alinha-se às principais teses do bolsonarismo há tempos.

Além de defender o fechamento do STF, o PCO alinha-se a Bolsonaro nas seguintes teses: ataque às urnas eletrônicas, defesa do voto impresso, defesa da liberação do uso de armas, negacionismo na pandemia, o que incluiu ataques às vacinas, ataque ao STF pela condenação de Daniel Silveira, crítica contundente à condenação de Robinho por estupro, entre outros temas. 

Para o PCO, Olavo de Carvalho seria melhor que a Globo e Bolsonaro, melhor que Alckmin.

O PCO, como a extrema direita, defende a liberdade de expressão dos racistas (vetada pela Constituição) e defende a organização de um partido neonazista no país. Quando o apresentador do Flow defendeu a tese e foi repudiado por todos os segmentos democráticos da sociedade, Rui Pimenta e seu partido saíram em defesa dele. Há trechos de programas de Monark no canal do PCO no Youtube, com elogios ao partido -sim, eles se orgulham disso. 

O PCO ataca diuturnamente o movimento indígena, o movimento feminista, o movimento antirracista. 

Rui Pimenta não apenas atacou Galo e a ação de incêndio da estátua de Borba Gato em São Paulo; assumiu a linha de frente do revisionismo histórico de extrema direita, saudou mais de uma vez o papel dos bandeirantes para “a construção do país que nós vivemos” e ironizou: “Mataram gente? Mataram, mas isso faz parte da história” -uma versão do “e daí?” de Bolsonaro sobre as mortes por Covid. 

O PCO ataca sem tréguas outros partidos. Seus alvos são o PSOL, PC do B, UP, PCB -os ataques ao PT, por enquanto, ficaram no passado.

O PCO calunia e ataca sem cessar jornalistas de esquerda. Eu fui um dos alvos deles, mas nem de longe o mais atacado. Renato Rovai, Cynara Menezes, Miguel do Rosário, Luis Costa Pinto, Kiko Nogueira, Pedro Zambarda, Milton Blay e outros jornalistas de esquerda são alvos. Não se registram ataques do grupo a jornalistas de direita. 

O caráter dos ataques a Renato Rovai é algo que cobre de indignação todas e todos os jornalistas de esquerda, exceto uns poucos aliados de Pimenta. O PCO iniciou uma onda de ataques brutal a Rovai no dia seguinte a um tuíte dele solicitando doação de sangue para seu filho, que vive uma recidiva de leucemia. São mais de 100 páginas de ataques a Rovai pelos militantes nas redes sociais neste período. 

Uma constante nas injúrias do PCO a partidos, jornalistas e líderes de esquerda é a história de serem todos “agentes da CIA” ou “agentes do imperialismo”.

Têm sido alvos do PCO ao longo dos tempos com ataques de enorme virulência, alguns com frequência semanal: 

  • o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
  • o ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad
  • o presidente do PSOL, Juliano Medeiros
  • o líder do MTST e do PSOL Guilherme Boulos
  • o coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sônia Guajajara, também do PSOL
  • o jurista Silvio Almeida, professor visitante da Universidade de Columbia, em Nova York, e presidente do Instituto Luiz Gama
  • o jurista Pedro Serrano, pós doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
  • o jurista Thiago Amparo, professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP e doutor pela Central European University (Budapeste)
  • o jurista Walfrido Jorge Warde Júnior, presidente do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa - IREE.
  • a filósofa e líder feminista Márcia Tiburi
  • o jornalista e ex-deputado Jean Wyllys
  • o líder da Coalizão Negra por Direitos Douglas Belchior
  • o cientista político Daniel Cara
  • o historiador e líder do PSOL Valério Arcary
  • o historiador e líder do PCB Jones Manoel
  • a historiadora e líder feminista Patrícia Valim 

Trata-se de uma lista incompleta, mas que dá uma ideia de como o PCO age. Alguém pode estranhar a presença de Lula e Haddad na lista, porque o partido dos Pimenta encena adesão praticamente incondicional à candidatura de Lula e mobilizou suas bases quando o ex-presidente esteve preso em Curitiba. Mas é importante ter memória histórica.

Quanto a Haddad, não faz muito tempo, em 2019, o PCO acusava o professor e agora pré-candidato ao governo de São Paulo pelo PT de ser “a voz da ala reacionária do PT”.

Os ataques a Lula são mais antigos. Em 2006, candidato a presidente da República (isso mesmo!), Pimenta afirmou que Lula era “chefe da quadrilha do mensalão” e “presidente dos banqueiros”. Você não achará isso nos arquivos do jornal do PCO, porque todos eles evaporaram, mas há cópias guardadas por ex-militantes do grupo. 

Em 2002, entre Lula e Serra, o partido fez campanha pelo voto nulo; em 2006, entre Lula e Alckmin, voto nulo; em 2010, entre Dilma e Serra, nulo mais uma vez, assim como em 2014, entre Dilma e Aécio. Nem o golpe e a prisão de Lula fizeram a turma da família Pimenta mudar: entre Haddad e Bolsonaro, nulo mais uma vez, à la Ciro Gomes. Nas disputas municipais, em 2020, quando houve segundo turno entre candidaturas de esquerda e direita, voto nulo. 

Não, eu não sou solidário ao PCO. Tenho acompanhado a mobilização nas redes e o movimento de solidariedade ao partido, não por acaso, vem, além dos próprios militantes, de gente como Sérgio Camargo, Bia Kicis, Bernardo Kuster, Allan dos Santos, Oswaldo Eustáquio. Não irei me meter em qualquer movimento com fascistas. 

Há quem diga que seria necessário protestar contra a decisão de Alexandre de Moraes porque “pode se voltar contra a gente”. A gente quem, cara pálida? Não sou da gente de Bolsonaro nem de Kicis nem de Kuster, nem de dos Santos, nem de Eustáquio nem de Pimenta. Não me solidarizo com os primeiros quando o STF age contra os primeiros nem contra o último. 

Se o STF voltar suas baterias contra a democracia, o povo e a esquerda, irei protestar, iremos, as pessoas de esquerda e democratas. Oras, se ninguém na esquerda solidarizou-se com os fascistas-raiz, porque é que devemos solidariedade aos  pimenta-raiz? 

Nem solidariedade a Bolsonaro nem a Pimenta.