O noticiário dá conta de uma preocupação do presidente Jair Bolsonaro com a desistência do ex-juiz Sergio Moro de concorrer à Presidência. Fica a pergunta: ora, mas isso não o favorece, dado que, com a desistência de Moro, a maior parte dos seus eleitores acabaria indo para o presidente?
Desse ponto de vista, sim, mas a preocupação maior de Bolsonaro hoje parece ser outra: que a eleição não seja decidida no primeiro turno. E, assim, quanto mais candidatos houver, maiores serão as chances de termos segundo turno.
Está claro que Bolsonaro não aceitará perder a eleição sem espernear. Ou, em outras palavras, sem tentar virar a mesa, sem tentar criar confusão e dar um golpe. Assim, para ele é muito melhor que a polarização leve a disputa para um segundo turno.
Essa situação deveria alertar os candidatos progressistas que compreendem o risco para o País de uma reeleição do atual presidente – coisa que não está descartada, em hipótese alguma.
Não se trata de questionar o direito de cada corrente política lançar seu candidato. Este seria um comportamento antidemocrático. Mas, numa situação em que a diferença de quatro ou cinco pontos percentuais pode impedir a vitória do candidato progressista já no primeiro turno, dificultando um projeto golpista, é preciso uma reflexão séria.
De qualquer forma, caso os candidatos contrários a Bolsonaro e com pequenas chances de crescimento mantenham seus nomes, o próprio eleitorado tenderá a fazer voto útil. É bom que também os candidatos tenham isso em conta. A manutenção de candidaturas sem chance de ir ao segundo turno pode ser um tiro no pé. Eles podem sair da eleição menores do que entraram.
Mas os ventos golpistas vêm também de outras direções.
Nos discursos relacionados com o dia de 31 de março, dia do suposto aniversário do golpe militar de 1964, as indiretas de Bolsonaro – que tinha acabado de mover peças no comando do Exército – não foram tão indiretas assim. Ele voltou a falar em golpe. E de forma não muito cifrada. Mostrou que continua contando com a ajuda do Exército para virar a mesa.
De uma outra direção, mas com a mesma inspiração golpista, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, o líder máximo do Centrão, apareceu com uma proposta de emenda constitucional – que seria votada ainda este ano – limitando drasticamente os poderes dos presidentes. Seria a implementação do que ele chamou de semipresidencialismo.
Segundo seu autor, inicialmente a proposta passaria a valer em janeiro de 2023, quando da posse do próximo presidente. Diante das resistências, porém, Lira afirmou que ela poderia passar a vigorar apenas em 2030. Mas nada impede que uma nova reformulação antecipe sua vigência.
O parlamentarismo sempre foi um projeto da direita e das classes dominantes no país. Elas já perderam dois plebiscitos em que tentaram legitimar essa mudança. Só isso já deveria impedir que ela pudesse ser implantada por uma emenda constitucional – sem nova manifestação popular direta, como um novo plebiscito, ou mesmo sem uma Constituinte.
Agora, a direita acena com a volta a proposta de Lira, algo próximo ao parlamentarismo.
Ela sabe que é mais fácil fazer a maioria no Congresso do que ganhar uma disputa presidencial, na qual o debate é mais politizado. A eleição de Bolsonaro foi um caso mais raro.
No Brasil, historicamente, o parlamento sempre funcionou com uma câmara de contenção às mudanças.
Daí essa proposta do semipresidencialismo. Seus autores não disfarçam o objetivo: tolher os movimentos dos presidentes eleitos por voto direto.
Tudo funciona como se este fosse um plano C, depois que o plano A (a eleição) não desse resultado e que o plano B (o golpe) fosse inviabilizado.
Como se vê, os ventos golpistas vêm de várias partes.
É preciso estar alerta.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.