Quando falamos de Judaísmo, é sempre bom esclarecer que os judeus estão em todos os continentes, portanto não só estão espalhados geograficamente pelo globo como possuem fenótipos dos mais diversos, judeus negros, judeus brancos, judeus com características fenotípicas asiáticas e outras diversidades. Então, o mundo judaico é extremamente rico em vários aspectos.
Na maioria das vezes, quando nos referimos aos judeus africanos, é sempre colocada a Etiópia ou outras comunidades judaicas do norte da África como, por exemplo, Egito e Marrocos. Porém, se descermos pelo continente africano, encontramos também outras comunidades judaicas, por isso quero falar aqui sobre os judeus nigerianos.
Quem já viajou pela Nigéria ou estuda sobre o país com certeza já se deparou com uma sinagoga, e não precisou viajar pelo interior, já que próximo à capital Abuja há sinagogas.
A comunidade judaica nigeriana já foi muito fechada dentro da própria Nigéria. No entanto, nas últimas décadas ela vem ampliando suas relações internacionais. Atualmente, ela não possui relações fortes com o governo de Israel, porém, tem relação com entidades e grupos políticos israelenses. Quem acompanha percebe que há interesse por parte dessa comunidade judaica nigeriana de se aproximar do governo de Israel. Contudo, a relação entre elas ainda não foi consolidada.
Essa comunidade mantém as festividades de todo o calendário judaico internacional e mantém vivas muitas tradições. Por exemplo, na Sinagoga Hebraica Gihon, eles fazem uma grande celebração do Sukkot (1) com direito a tendas ao ar livre. É uma celebração tão bonita que chama atenção até das pessoas da região que não são judeus, fazendo assim crescer a curiosidade e o interesse das pessoas por conhecerem melhor estas festividades judaicas.
Um fator muito claro quando estudamos a comunidade hebraica nigeriana é que eles são, em sua maioria igbo, um grupo étnico local. Os judeus nigerianos afirmam ter origens judaicas de uma das 10 tribos. O grupo étnico igbo é muito expressivo na Nigéria. Todavia, o número de igbos que fazem parte da comunidade judaica é muito pequeno. Isso faz com que essa comunidade seja muito pequena, mas ao mesmo tempo muito organizada. Mesmo com um número pequeno de participantes é visível o nível de organização alcançado, e isso é algo a ser respeitado. Sendo assim, é raro ver um judeu nigeriano que não seja um igbo.
Durante as perseguições sofridas pelas tribos de Israel, muitos de seus integrantes foram feitos prisioneiros, alguns escravizados, e assim se deslocaram pelo continente africano. Isso tudo aconteceu quando o reino israelita foi conquistado no século VIII a.C. Um exemplo de seus descendentes é a comunidade judaica da Etiópia, que inclusive mantém relações fortes com o governo de Israel.
É importante ressaltar que, ao contrário dos etíopes que já possuem comprovações históricas fortes de que sejam descendentes de uma das tribos, os judeus igbos nigerianos não possuem, o que faz com que sua afirmação seja considerada apenas uma teoria de que eles também seriam descendentes de uma das 10 tribos. Há um elo histórico perdido que faz com que a origem dos judeus nigerianos seja ainda um mistério.
Relação com o governo de Israel
Uma das explicações para que a comunidade igbo judaica não tenha estabelecido esses vínculos fortes com o governo de Israel, seria a falta deste elo histórico que explicaria essa origem. Há rumores que teria ocorrido uma sugestão para que houvesse uma conversão de todos os membros da comunidade judaica nigeriana ao próprio Judaísmo, para que eles fossem então reconhecidos pelo governo de Israel. Essa sugestão teria sido vista como uma grande ofensa pelos rabinos nigerianos, já que eles são judeus. Esta é uma grande polêmica e um dos motivos pelo qual há essa fragilidade nas relações.
De qualquer modo, quando estudamos o Judaísmo pelo mundo, é impossível ignorar a existência dessa comunidade tão bem organizada e que tudo o que mostra é a prática de um Judaísmo ortodoxo.
É importante dizer que apesar do governo de Israel não se relacionar diretamente com a comunidade nigeriana, ela é reconhecida por grupos judaicos do mundo inteiro. Eles mantêm relações com alguns grupos judaicos dos Estados Unidos e até mesmo com grupos judaicos aqui do Brasil. Portanto, eles fazem parte da comunidade judaica internacional.
A comunidade judaica nigeriana leva uma vida simples. No entanto, não vive na miserabilidade, tanto é que 10% de seus ganhos são oferecidos aos mais pobres. As suas autoridades da comunidade judaica da Nigéria já foram convidadas inúmeras vezes para realizarem palestras nos Estados Unidos e em outros lugares do mundo. Como eles possuem institutos de pesquisas judaicas e centros culturais judaicos na Nigéria, acabaram recebendo apoio financeiro de entidades judaicas internacionais.
Apesar de os judeus nigerianos não terem essa relação oficial com o governo de Israel, há diversos grupos e entidades judaicas israelenses que mantêm relação com eles e, inclusive, os apoiam.
Também podemos ressaltar que, antes da pandemia eram encontradas, no mínimo, 26 sinagogas na Nigéria, e isso não é um número pequeno. Todas elas são muito bem cuidadas e bem preservadas pela comunidade local. Além de todos os institutos de pesquisas e centros culturais judaicos, então podemos ver que ali, sem dúvidas, há uma preocupação e uma preservação com a cultura judaica e com todo o legado do Judaísmo.
No meio das sinagogas encontradas na Nigéria, encontramos algumas que foram fundadas por grupos de judeus afro-americanos. O que nos mostra uma relação fortíssima da comunidade judaica da Nigéria com a comunidade judaica dos Estados Unidos.
Entre as importantes entidades internacionais judaicas que têm apoiado os judeus na Nigéria, está a Kulanu que é uma importante entidade judaica.
Notas
(1)Sucot do hebraico, "cabanas" ou "tendas" é um festival judaico que se inicia no dia 15 de Tishrei de acordo com o calendário judaico. Essa data conhecida também como Festa dos Tabernáculos coincide com a estação das colheitas em Israel, no começo do outono. Essa festividade tem o intuito de relembrar os 40 anos que o povo judeu ficou no deserto como nômade, vivendo em tendas e cabanas, após a saída do Egito. Então, era o momento em que o povo judeu vigiava com grandes esperanças e expectativas o futuro, já que conviviam com todas as dificuldades que a vida no deserto poderia oferecer, calor extremo de dia e frio de noite. Para que o povo judaico conseguisse ficar no deserto por tantos anos, Deus criou as nuvens da Glória. Essas nuvens cercavam os judeus nos 4 lados (em cima, embaixo e dos lados) para protegê-los de todas as intempéries que o deserto poderia oferecer, como o clima, os animais e o próprio solo. Então, podemos dizer que o povo de Israel fez essa travessia dentro de uma grande cabana.
Outro símbolo importante do Sucot é o uso dum ramo com quatro espécies, precisamente chamado de “arba'a minim”. São essas espécies: o Etrog (fruta cítrica), Hadas (Murta), Arava (Salgueiro) e o Lulav (Folhagem de tamareira); elas simbolizam os 4 tipos de judeus no mundo, são eles os que têm mérito tanto no comprimento das boas ações quanto no estudo da Torá, os que têm méritos em apenas um quesito e há aqueles que estão em falta com ambas.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.