Guerra às drogas: quem perde? – Por Chico Alencar

Afinal, o que é a chamada "guerra às drogas"? Há quanto tempo ela existe? Quais seus resultados? Ela conseguiu inibir o tráfico de drogas e o contrabando de armas?

Ação da Polícia Civil deixou 25 mortos na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro (Reprodução/TV Globo)
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Muito já se disse sobre a chamada "guerra às drogas", mostrando de forma clara a ineficácia e os malefícios dessa política para a sociedade - em particular, para as camadas mais pobres.
Agora, porém, uma preciosa pesquisa elaborada pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESec), divulgada esta semana, traz importantes dados.

Com o título "Tiros no futuro: Impactos da guerra às drogas na rede municipal de Educação do Rio de Janeiro", o estudo, coordenado pela socióloga Julita Lemgruber, mostra que as consequências são muito mais graves do que se imaginava.

Foram computados dados de 1.577 escolas do estado do Rio de Janeiro, com um total de 641.534 alunos matriculados.
Constatou-se que, em 2019, 74% delas tiveram tiroteios com a participação da polícia no seu entorno. E no horário da aulas. É isso mesmo: praticamente três em cada quatro escolas conviveram com tiroteios e tiveram sua rotina alterada por eles. São, no total, 1.154 escolas cujos alunos e professores estiveram nessa situação.

"Mesmo dentro da sala de aula os alunos não estão livres dessa violência. Estudam sob esse barulho infernal de tiros, de helicópteros sobrevoando escolas. Em qualquer país do mundo, uma situação como essa derrubaria o governo. Mas neste país a gente naturaliza a morte de pessoas pobres e negras. O mesmo Estado que usa seus recursos para prover colégios com professores e condições mínimas para as crianças estudarem, provoca um quadro dantesco de violência no entorno dessas escolas" — diz Julita Lemgruber numa reportagem na grande imprensa sobre o estudo que coordenou.

Ela, com razão, aponta a política de guerra às drogas como estando na origem desse quadro.

"A gente precisa ter alterações profundas na política de drogas do Brasil, porque isso que se vende para a sociedade como guerra às drogas não é nada mais do que um álibi para usar a violência nesses espaços da pobreza”.

O estudo tenta quantificar, também, as consequências dessa situação no rendimento econômico dos alunos no futuro. Mas, embora grave, este é um problema até menor, comparado às sequelas psicológicas que podem se estender ao longo da vida e ao impacto sobre o aprendizado dos alunos. Isso, claro, sem falar na quantidade de vidas humanas ceifadas ainda na infância e na juventude.

Embora o estudo do CESeC seja muito importante pelas informações que ele traz diretamente, é também valioso por dar elementos para nos levar a outras reflexões.

Afinal, o que é a chamada "guerra às drogas"?

Há quanto tempo ela existe?

Quais seus resultados?

Ela conseguiu inibir o tráfico de drogas e o contrabando de armas?

Se a questão for mesmo combater as drogas, o foco da ação deveria ser em operações policiais armadas em favelas, atacando o varejo e pondo em risco a vida de homens mulheres e crianças pobres, como acontece atualmente?

Por isso tudo, vale a pena voltar ao título deste artigo e pensar na pergunta que ele traz: afinal, quem perde com a guerra às drogas?

A resposta, sem medo do errar, é: os derrotados nessa guerra insana são os pobres que moram nas comunidades mais pobres.

É preciso mudar essa política.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.