O mundo inteiro tem tido muita curiosidade em entender como são as políticas de desenvolvimento econômico na China. É comum escutarmos, no Brasil, principalmente de economistas do mercado financeiro, atrocidades sobre o funcionamento da economia chinesa. Além de desinformação, há também um viés refratário a entender o seu funcionamento de fato. O caminho do desenvolvimento adotado pela China tem sido visto como uma alternativa à abordagem baseada no livre mercado praticado em vários países do mundo Ocidental. O rápido crescimento da China, nas últimas três décadas, fez com que a ideia de um capitalismo de mercado, na visão Neoliberal, como única opção começasse a ser questionado. Além disso, muitas pessoas têm dificuldade de compreender o ritmo da mudança econômica que a China vem passando nesse período. A economia chinesa saiu de uma estrutura predominantemente agrícola na década de 1960 para uma potência industrial na década de 1990. Em termos comparativos, o processo de industrialização brasileiro ocorreu, pelo menos, uma década antes da industrialização chinesa, mas não conseguiu atingir os níveis chineses. Então, pergunto: o que é que aconteceu na economia chinesa de lá para cá?
As primeiras duas décadas, após a fundação da República Popular da China em 1949, foram marcadas por períodos de crescimento substancial do PIB per capita, com o crescimento da produtividade do trabalho, alguns investimentos importantes em indústrias de base (química, siderúrgica, entre outras) e alguns projetos de infraestrutura. Esses indicadores representaram o sucesso do “Primeiro Plano Quinquenal” durante o qual 6000 conselheiros soviéticos ajudaram a estabelecer e operar 156 projetos de grande escala no território chinês. Portanto, o início do processo de desenvolvimento econômico chinês baseava-se literalmente no modelo soviético. Contudo, o período subsequente, chamado de o “Grande Salto para Frente” (1958-1962), objetivava – tal como no plano de metas brasileiro – fazer com que a China crescesse e se desenvolvesse em um período de curto prazo. Infelizmente, esse plano não foi bem-sucedido e anulou vários dos ganhos obtidos no período anterior, através da restrição dos incentivos produtivos e da estruturação industrial. Após o insucesso do plano “Grande Salto para Frente”, o governo chinês iniciou algumas reformas econômicas que culminaram com um período de aumento de produtividade e crescimento do PIB per capita. Logo após (1966-1976), houve a “Revolução Cultural” que significou um enorme retrocesso não só na economia, mas na sociedade chinesa como um todo.
É bom ressaltar, caro leitor, que a China, assim como o Brasil, teve momentos de grande crescimento econômico e momentos de retração econômica. A diferença que podemos apontar é que a China conseguiu modernizar sua economia não ficando refém nem dependendo de um pequeno núcleo de setores (no caso do modelo soviético) e como é o caso do Brasil com o setor agrícola e alguns setores industriais. Além disso, o conceito de desenvolvimento utilizado pela China extrapola a esfera econômica. Na visão chinesa, desenvolvimento é um conceito multifacetado que envolve a melhoria de vida da população, seja no âmbito social, educacional, saúde, alimentar e cultural.
Nesse sentido, o final da década de 1970 foi determinante para mudança da trajetória de desenvolvimento econômico do país. O novo “modelo de desenvolvimento econômico chinês” foi introduzido por Deng Xiaoping após a morte de Mao Tsé-Tung em 1976. Esse modelo baseava-se no processo de modernização estrutural da China e tinha a abertura econômica como base da formação de um socialismo com características chinesas.
A ação de Deng Xiaoping foi amplamente aceita e apoiada pela sua ênfase no pragmatismo, gradualismo, racionalismo, minimização da ideologia revolucionária e o papel central do Estado na regulação econômica da China. Xiaoping implementou reformas que duram até hoje em áreas estratégicas como a indústria, a agricultura, a ciência, a tecnologia e a defesa nacional.
Essas reformas iniciaram-se por meio da criação de uma política industrial-tecnológica e de comércio exterior baseada na abertura gradual da economia. O turismo foi permitido, estudantes tiveram a oportunidade de ir para o exterior em busca de melhor qualificação, foram estabelecidas zonas econômicas especiais, como a do sul na região de Cantão — hoje chamada de “fábrica do mundo”. Também, foram criadas políticas de atração de investimentos para que empresas estrangeiras trouxessem tecnologia, investimento, know-how de gestão e acesso ao mercado. Para isso, foi feita uma reforma financeira com a criação de três novos bancos públicos: o Banco de Desenvolvimento da China, o Banco de Importação-Exportação da China e o Banco de Desenvolvimento Agrícola da China.
Também foram feitas reformas estruturais na agricultura, eliminando as comunas rurais, e a terra foi entregue às famílias da zona rural (para produção e rendimento, mas não para a verdadeira propriedade). A produtividade agrícola saltou dramaticamente, e foram criados mercados livres para a venda de alimentos. Um grande excedente de trabalhadores rurais começou a migrar para as zonas industriais reforçando a mão de obra desse setor.
Simultaneamente, a China iniciou o fortalecimento das empresas estatais, e as agências governamentais passaram a ser lideradas por pessoas experientes em governança, e não apenas por aquelas que demonstravam fervor revolucionário. A modernização das empresas públicas foi fundamental para mostrar que o socialismo e a economia de mercado não são incompatíveis.
Os resultados desse processo culminaram não só com a modernização da indústria e da agricultura, mas também com a melhoria do desenvolvimento socioeconômico chinês. As reformas da China resultaram, sem dúvida, num crescimento rápido e contínuo nas últimas três décadas e também tiraram centenas de milhões de pessoas da pobreza. A China reduziu o número de pobres rurais de 770 milhões para 30,46 milhões ao longo dos últimos 40 anos.
O caminho de desenvolvimento econômico, como os chineses gostam de chamar, tem sido liderado pelo governo, no qual a política industrial (que apresentarei em um próximo artigo) desempenha um papel central na orientação do caminho seguido pela China. O Estado chinês trabalha ativamente para estabelecer a estrutura necessária ao desenvolvimento econômico do país, estimulando, orientando, disciplinando e coordenando o mercado, a fim de alcançar os seus objetivos e não sendo refém do mercado como podemos observar em vários países ocidentais. Essa estratégia tornou claro que a capacidade do Estado em planejar e implementar políticas públicas é necessária para assegurar um ambiente institucional que seja propício aos investimentos do setor privado e ao crescimento econômico.
A mola propulsora inicial do crescimento chinês se deu através do comércio internacional enquanto o governo preparava as bases para o crescimento do mercado interno através do aumento da renda nacional. Durante as décadas de 1970, 1980 e 1990, a mola propulsora do crescimento chinês foi o mercado externo. A China, nesse período, tornou-se o maior país em comércio internacional em termos de produtos e o segundo se considerarmos produtos e serviços. Como exemplo, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1978, o valor total de importação e exportação da China foi de apenas US$20,6 bilhões, ocupando a 32ª posição no comércio mundial e representando menos de 1% do total mundial. Em 2010, o valor total da importação e exportação da China atingiu US$2,974 trilhões, 144 vezes mais do que em 1978, com um crescimento médio anual de 16,8%. Em 2010, os volumes totais das exportações e importações chinesas representaram 10,4% e 9,1% do total mundial, respectivamente. Em 2019, a China atingiu uma participação no comércio internacional de 14,7% do total.
Essa propulsão auxiliou a China a aumentar as receitas, aumentar a renda per capita e investir pesadamente em infraestrutura. De 1978 a 2017, as receitas estatais da China aumentaram de ¥113,2 bilhões para ¥17 trilhões, enquanto o PIB per capita do país aumentou de US$156, em 1978, para US$10.500 em 2020. Já o investimento na China deu um salto fundamental nas décadas de 1960 e 1970, o que representava em torno de 15,5%, e, em 2020, representou 43,1% do seu PIB nominal. Isso não só possibilitou investimentos em modernização industrial e infraestrutura logística, bem como permitiu fortalecer a estrutura econômica, tornando-se a base de mudança estratégica de Pequim. Essa estratégia também permitiu que o país passasse pelas crises do capitalismo liberal (crise financeira asiática, no final dos anos 90, e a crise financeira americana/global, no final da primeira de década de 2000) de forma suave. Nesse sentindo, antevendo a crise americana/global de 2008, a China alterou seu paradigma de desenvolvimento econômico, afirmando que a prioridade seria uma "abordagem centrada nas pessoas" e na harmonia social, em contraste com a ênfase no crescimento econômico. A mudança do modelo de desenvolvimento econômico chinês se daria através do prisma do "desenvolvimento científico". Para isso, a China precisou otimizar sua estrutura industrial, aumentar os investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação para que esta última se tornasse a nova mola propulsora chinesa.
Nesse sentido, a China adotou uma nova estratégia chamada de "dupla circulação", que significava um padrão de desenvolvimento econômico que estabelecia o desenvolvimento doméstico como a base (ou seja, o foco estava no aumento de renda e de inclusão social), resultando em um reforço mútuo com o mercado internacional.
De 2008 até 2015, a China passou a investir pesadamente em educação (como mostrei em matéria anterior), ciência, tecnologia e inovação. Hoje, a China é o segundo país em investimentos em pesquisa e desenvolvimento com 23,5% do total investido apenas atrás dos Estados Unidos, que possui 25% do total. A China, em 2019, investiu US$ 533 bilhões enquanto os EUA investiram US$596 bilhões. Se analisarmos em termos percentuais do PIB, a China saiu de uma participação inferior a 1,5% em três décadas para 2,4%, em 2020. Um salto impressionante.
A partir de 2012, com a ascensão ao poder do líder chinês Xi Jinping, a China aprofundou essa estratégia, mais uma vez, lançando uma nova visão para o seu desenvolvimento chamada de “o sonho chinês” (que abordarei futuramente), e a nova política industrial chamada de “made in China 2015”. Ambas são políticas ambiciosas entre as várias outras micropolíticas lançadas na última década as quais mudaram não só o patamar de desenvolvimento econômico, mas deram uma visão do que a China está buscando para o seu futuro.
Embora seja fato que a taxa média de crescimento do PIB real poderá diminuir para entre 5-8%, no período de 2012-2024, este valor é significativamente mais elevado do que a maioria dos países do mundo.
É claro que tais projeções de longo prazo devem ser tratadas com muita cautela, mas a trajetória de um crescimento mais qualificado já é adotada nos discursos em Pequim. A China sabe que seu desafio está em continuar o processo de inclusão social, o aumento da renda e a construção de uma sociedade mais equânime. Em vez de permitir que as exportações de baixo custo impulsionem o crescimento, a China terá de depender cada vez mais da expansão da sua própria procura interna para cumprir esses ambiciosos objetivos. Para isso, o PCCh e o governo sabem que devem ampliar a abertura e aprofundar as reformas sob os alicerces de uma economia mais equilibrada.
Para nós, no Brasil, fica o exemplo que o caminho de desenvolvimento chinês não pode ser copiado, mas podemos segui-lo. Já que temos uma forte capacidade de exportação industrial e agrícola aliada a um grande mercado interno. O que a China nos mostra e que não conseguiremos crescimento econômico nem tampouco desenvolvimento sem inclusão social, sem aumento da renda dos brasileiros e sem investimentos em infraestrutura. O caminho foi aberto e precisamos segui-lo.
O mundo inteiro tem tido muita curiosidade em entender como são as políticas de desenvolvimento econômico na China. É comum escutarmos, no Brasil, principalmente de economistas do mercado financeiro, atrocidades sobre o funcionamento da economia chinesa. Além de desinformação, há também um viés refratário a entender o seu funcionamento de fato. O caminho do desenvolvimento adotado pela China tem sido visto como uma alternativa à abordagem baseada no livre mercado praticado em vários países do mundo Ocidental. O rápido crescimento da China, nas últimas três décadas, fez com que a ideia de um capitalismo de mercado, na visão Neoliberal, como única opção começasse a ser questionado. Além disso, muitas pessoas têm dificuldade de compreender o ritmo da mudança econômica que a China vem passando nesse período. A economia chinesa saiu de uma estrutura predominantemente agrícola na década de 1960 para uma potência industrial na década de 1990. Em termos comparativos, o processo de industrialização brasileiro ocorreu, pelo menos, uma década antes da industrialização chinesa, mas não conseguiu atingir os níveis chineses. Então, pergunto: o que é que aconteceu na economia chinesa de lá para cá?
As primeiras duas décadas, após a fundação da República Popular da China em 1949, foram marcadas por períodos de crescimento substancial do PIB per capita, com o crescimento da produtividade do trabalho, alguns investimentos importantes em indústrias de base (química, siderúrgica, entre outras) e alguns projetos de infraestrutura. Esses indicadores representaram o sucesso do “Primeiro Plano Quinquenal” durante o qual 6000 conselheiros soviéticos ajudaram a estabelecer e operar 156 projetos de grande escala no território chinês. Portanto, o início do processo de desenvolvimento econômico chinês baseava-se literalmente no modelo soviético. Contudo, o período subsequente, chamado de o “Grande Salto para Frente” (1958-1962), objetivava – tal como no plano de metas brasileiro – fazer com que a China crescesse e se desenvolvesse em um período de curto prazo. Infelizmente, esse plano não foi bem-sucedido e anulou vários dos ganhos obtidos no período anterior, através da restrição dos incentivos produtivos e da estruturação industrial. Após o insucesso do plano “Grande Salto para Frente”, o governo chinês iniciou algumas reformas econômicas que culminaram com um período de aumento de produtividade e crescimento do PIB per capita. Logo após (1966-1976), houve a “Revolução Cultural” que significou um enorme retrocesso não só na economia, mas na sociedade chinesa como um todo.
É bom ressaltar, caro leitor, que a China, assim como o Brasil, teve momentos de grande crescimento econômico e momentos de retração econômica. A diferença que podemos apontar é que a China conseguiu modernizar sua economia não ficando refém nem dependendo de um pequeno núcleo de setores (no caso do modelo soviético) e como é o caso do Brasil com o setor agrícola e alguns setores industriais. Além disso, o conceito de desenvolvimento utilizado pela China extrapola a esfera econômica. Na visão chinesa, desenvolvimento é um conceito multifacetado que envolve a melhoria de vida da população, seja no âmbito social, educacional, saúde, alimentar e cultural.
Nesse sentido, o final da década de 1970 foi determinante para mudança da trajetória de desenvolvimento econômico do país. O novo “modelo de desenvolvimento econômico chinês” foi introduzido por Deng Xiaoping após a morte de Mao Tsé-Tung em 1976. Esse modelo baseava-se no processo de modernização estrutural da China e tinha a abertura econômica como base da formação de um socialismo com características chinesas.
A ação de Deng Xiaoping foi amplamente aceita e apoiada pela sua ênfase no pragmatismo, gradualismo, racionalismo, minimização da ideologia revolucionária e o papel central do Estado na regulação econômica da China. Xiaoping implementou reformas que duram até hoje em áreas estratégicas como a indústria, a agricultura, a ciência, a tecnologia e a defesa nacional.
Essas reformas iniciaram-se por meio da criação de uma política industrial-tecnológica e de comércio exterior baseada na abertura gradual da economia. O turismo foi permitido, estudantes tiveram a oportunidade de ir para o exterior em busca de melhor qualificação, foram estabelecidas zonas econômicas especiais, como a do sul na região de Cantão — hoje chamada de “fábrica do mundo”. Também, foram criadas políticas de atração de investimentos para que empresas estrangeiras trouxessem tecnologia, investimento, know-how de gestão e acesso ao mercado. Para isso, foi feita uma reforma financeira com a criação de três novos bancos públicos: o Banco de Desenvolvimento da China, o Banco de Importação-Exportação da China e o Banco de Desenvolvimento Agrícola da China.
Também foram feitas reformas estruturais na agricultura, eliminando as comunas rurais, e a terra foi entregue às famílias da zona rural (para produção e rendimento, mas não para a verdadeira propriedade). A produtividade agrícola saltou dramaticamente, e foram criados mercados livres para a venda de alimentos. Um grande excedente de trabalhadores rurais começou a migrar para as zonas industriais reforçando a mão de obra desse setor.
Simultaneamente, a China iniciou o fortalecimento das empresas estatais, e as agências governamentais passaram a ser lideradas por pessoas experientes em governança, e não apenas por aquelas que demonstravam fervor revolucionário. A modernização das empresas públicas foi fundamental para mostrar que o socialismo e a economia de mercado não são incompatíveis.
Os resultados desse processo culminaram não só com a modernização da indústria e da agricultura, mas também com a melhoria do desenvolvimento socioeconômico chinês. As reformas da China resultaram, sem dúvida, num crescimento rápido e contínuo nas últimas três décadas e também tiraram centenas de milhões de pessoas da pobreza. A China reduziu o número de pobres rurais de 770 milhões para 30,46 milhões ao longo dos últimos 40 anos.
O caminho de desenvolvimento econômico, como os chineses gostam de chamar, tem sido liderado pelo governo, no qual a política industrial (que apresentarei em um próximo artigo) desempenha um papel central na orientação do caminho seguido pela China. O Estado chinês trabalha ativamente para estabelecer a estrutura necessária ao desenvolvimento econômico do país, estimulando, orientando, disciplinando e coordenando o mercado, a fim de alcançar os seus objetivos e não sendo refém do mercado como podemos observar em vários países ocidentais. Essa estratégia tornou claro que a capacidade do Estado em planejar e implementar políticas públicas é necessária para assegurar um ambiente institucional que seja propício aos investimentos do setor privado e ao crescimento econômico.
A mola propulsora inicial do crescimento chinês se deu através do comércio internacional enquanto o governo preparava as bases para o crescimento do mercado interno através do aumento da renda nacional. Durante as décadas de 1970, 1980 e 1990, a mola propulsora do crescimento chinês foi o mercado externo. A China, nesse período, tornou-se o maior país em comércio internacional em termos de produtos e o segundo se considerarmos produtos e serviços. Como exemplo, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1978, o valor total de importação e exportação da China foi de apenas US$20,6 bilhões, ocupando a 32ª posição no comércio mundial e representando menos de 1% do total mundial. Em 2010, o valor total da importação e exportação da China atingiu US$2,974 trilhões, 144 vezes mais do que em 1978, com um crescimento médio anual de 16,8%. Em 2010, os volumes totais das exportações e importações chinesas representaram 10,4% e 9,1% do total mundial, respectivamente. Em 2019, a China atingiu uma participação no comércio internacional de 14,7% do total.
Essa propulsão auxiliou a China a aumentar as receitas, aumentar a renda per capita e investir pesadamente em infraestrutura. De 1978 a 2017, as receitas estatais da China aumentaram de ¥113,2 bilhões para ¥17 trilhões, enquanto o PIB per capita do país aumentou de US$156, em 1978, para US$10.500 em 2020. Já o investimento na China deu um salto fundamental nas décadas de 1960 e 1970, o que representava em torno de 15,5%, e, em 2020, representou 43,1% do seu PIB nominal. Isso não só possibilitou investimentos em modernização industrial e infraestrutura logística, bem como permitiu fortalecer a estrutura econômica, tornando-se a base de mudança estratégica de Pequim. Essa estratégia também permitiu que o país passasse pelas crises do capitalismo liberal (crise financeira asiática, no final dos anos 90, e a crise financeira americana/global, no final da primeira de década de 2000) de forma suave. Nesse sentindo, antevendo a crise americana/global de 2008, a China alterou seu paradigma de desenvolvimento econômico, afirmando que a prioridade seria uma "abordagem centrada nas pessoas" e na harmonia social, em contraste com a ênfase no crescimento econômico. A mudança do modelo de desenvolvimento econômico chinês se daria através do prisma do "desenvolvimento científico". Para isso, a China precisou otimizar sua estrutura industrial, aumentar os investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação para que esta última se tornasse a nova mola propulsora chinesa.
Nesse sentido, a China adotou uma nova estratégia chamada de "dupla circulação", que significava um padrão de desenvolvimento econômico que estabelecia o desenvolvimento doméstico como a base (ou seja, o foco estava no aumento de renda e de inclusão social), resultando em um reforço mútuo com o mercado internacional.
De 2008 até 2015, a China passou a investir pesadamente em educação (como mostrei em matéria anterior), ciência, tecnologia e inovação. Hoje, a China é o segundo país em investimentos em pesquisa e desenvolvimento com 23,5% do total investido apenas atrás dos Estados Unidos, que possui 25% do total. A China, em 2019, investiu US$ 533 bilhões enquanto os EUA investiram US$596 bilhões. Se analisarmos em termos percentuais do PIB, a China saiu de uma participação inferior a 1,5% em três décadas para 2,4%, em 2020. Um salto impressionante.
A partir de 2012, com a ascensão ao poder do líder chinês Xi Jinping, a China aprofundou essa estratégia, mais uma vez, lançando uma nova visão para o seu desenvolvimento chamada de “o sonho chinês” (que abordarei futuramente), e a nova política industrial chamada de “made in China 2015”. Ambas são políticas ambiciosas entre as várias outras micropolíticas lançadas na última década as quais mudaram não só o patamar de desenvolvimento econômico, mas deram uma visão do que a China está buscando para o seu futuro.
Embora seja fato que a taxa média de crescimento do PIB real poderá diminuir para entre 5-8%, no período de 2012-2024, este valor é significativamente mais elevado do que a maioria dos países do mundo.
É claro que tais projeções de longo prazo devem ser tratadas com muita cautela, mas a trajetória de um crescimento mais qualificado já é adotada nos discursos em Pequim. A China sabe que seu desafio está em continuar o processo de inclusão social, o aumento da renda e a construção de uma sociedade mais equânime. Em vez de permitir que as exportações de baixo custo impulsionem o crescimento, a China terá de depender cada vez mais da expansão da sua própria procura interna para cumprir esses ambiciosos objetivos. Para isso, o PCCh e o governo sabem que devem ampliar a abertura e aprofundar as reformas sob os alicerces de uma economia mais equilibrada.
Para nós, no Brasil, fica o exemplo que o caminho de desenvolvimento chinês não pode ser copiado, mas podemos segui-lo. Já que temos uma forte capacidade de exportação industrial e agrícola aliada a um grande mercado interno. O que a China nos mostra e que não conseguiremos crescimento econômico nem tampouco desenvolvimento sem inclusão social, sem aumento da renda dos brasileiros e sem investimentos em infraestrutura. O caminho foi aberto e precisamos segui-lo.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.