Rebeca Andrade é baile de favela. É ouro. É mina! É mina de ouro (em todos os sentidos). A ginasta que encantou o Brasil e o mundo com suas medalhas na Ginástica Artística nas Olimpíadas, ao pedir a música no fantástico, pediu uma música gospel: “Conquistando o impossível”. Incoerência para quem fez sua apresentação ao som de uma música que diz que “os menor tão preparado pra f* com a x* dela”? Não! O baile de favela é um baile gospel.
A realidade nas favelas transita, sim, entre o funk e o gospel, entre o sagrado e o profano, entre o traficante e o pastor (que em alguns casos pode ser a mesma pessoa). Mas não há como demonizar nada e nem tachar de “alienação” esse processo. Essa é a cultura da periferia, não tão “pura” (com todas as aspas possíveis) como a do asfalto, mas realista. A mulher empoderada da favela é preta, evangélica e curte funk. Queiramos ou não.
Os fundamentalistas da religião podem olhar esse quadro e logo soltarem a sua máxima: “o mundo invadiu a igreja e ela se perdeu!”. Eu diria que é exatamente o contrário: o “mundo” está “salvando” a igreja nesses lugares. E é de lá que pode vir a salvação para a igreja no Brasil. O fundamentalismo só gera infernos, literais ou metafóricos. É exatamente a pluralidade de universos que pode trazer um sopro de luz para uma igreja morta em suas leis e regras e que quer impor a um país o seu modus operandi.
Quando a esquerda coloca no mesmo pacote todos os evangélicos, faz exatamente o jogo que a direita quer: que os “crentes” sejam vistos como uma única massa, uniforme e liderados por canalhas como Malafaia, Macedo, Valandro e outros. Detalhe: que nunca pisaram numa favela e nem gostam de lá! Mas é de lá, acredite, desse evangelicalismo periférico, pentecostal, feminino e negro, que roda num culto e “balança a raba” num baile funk que virá a salvação. Para desespero de brancos como eu que não entendem como uma mulher se diverte com uma música que a objetifica.
Porque não é de objetificação que o funk fala. É de uma outra coisa que eu, de fora da favela, nunca entenderei. E acho que nunca vou entender. E por mais que não goste (e eles estão pouco se lixando se eu gosto ou não) é a realidade, é o que relata o dia-a-dia de um povo que é alvo exatamente por não ter a pela alva. É sobre o genocídio da juventude negra, é sobre ter que andar com a nota fiscal de uma bicicleta. É sobre realidades que nunca enfrentarei. E é também sobre sexo, sobre a liberdade dos corpos, sobre prazeres que lhes são negados sempre.
Mas é de lá, do baile de favela, que é promíscuo na letra, mas é gospel no coração, que a revolução virá. Disso eu não tenho dúvidas.
Quem viver, verá!