Como a China controla a pandemia com quase 1,5 bilhão de pessoas? – Alessandro Golombiewski

Na coluna Desvendando a China: Desde o início da pandemia o país continuou ajustando as políticas sanitárias e socioeconômicas para auxiliar a sociedade na prevenção e estabelecer planos de tratamento de acordo com a situação real

Foto: Teach English in China (Reprodução)
Escrito en OPINIÃO el

As pessoas, no Brasil, devem estar muito curiosas para saber como está a vida na China, e quais foram as medidas adotadas pelo governo chinês para controlar a pandemia. É fato que alguns países ocidentais — principalmente os Estados Unidos, desde a época de Donald Trump, e seus governos coligados (Inglaterra e Brasil, por exemplo) — adotaram uma campanha internacional para responsabilizar a China pela pandemia. Em verdade, essa campanha tem sido articulada para esconder a irresponsabilidade e a incapacidade de tais governos em conter a pandemia. A questão central é que, nesses países, as políticas adotadas para o enfrentamento da pandemia (tanto as políticas sanitárias quanto as políticas socioeconômicas) falharam grandemente, e um dos argumentos mais evocados tanto pelos negacionistas quanto pelos supostos libertários diz respeito à discussão sobre os direitos e as liberdades individuais.

Dessa forma, início este artigo levantando uma questão ética sobre qual sociedade queremos viver. Aqui está uma diferença importante entre a sociedade chinesa e as sociedades ocidentais, em sua maioria. Na China, a liberdade individual existe até o ponto em que ela não interfira na liberdade coletiva, ou seja, temos aqui o debate do coletivismo versus o individualismo. O individualismo é a ideologia que concebe o indivíduo como mais importante do que o grupo. Ao passo que o coletivismo é a ideologia que concebe o grupo como mais importante do que os indivíduos que o constitui.

Não quero aqui, caro leitor, aprofundar a discussão entre as características do modelo socialista versus o modelo capitalista, mas é claro que o modelo capitalista privilegia o individualismo. Portanto, a China, desde o início da pandemia, tomou duras e abrangentes medidas para conter a evolução da epidemia do ponto de vista coletivista. Sob esse aspecto, os cidadãos chineses que sabem ou sabiam ser portadores do vírus, e, ainda assim, mantêm ou mantinham convívio social, são responsabilizados criminalmente, de tal modo que essa pessoa é isolada e submetida a tratamento compulsório.

Assim, partindo do pressuposto de resguardar a sociedade, a China, que hoje possui uma população de aproximadamente 1,5 bilhão de pessoas, conseguiu ter um total acumulado de 122.168 casos confirmados, dos quais o total acumulado de casos curados foi de 112.651, e com um total acumulado de 5.665 mortes. Atualmente, ainda há quase 3.852 pessoas sob tratamento para a covid-19.

Em comparação com muitos países, a vida na China já voltou ao normal e, no primeiro quadrimestre deste ano, a economia cresceu 18,3%. As pessoas levam a vida normalmente, mas com monitoramento diário de todas as atividades. É importante salientar que, em primeiro lugar, e acima de tudo, a China isolou rapidamente a fonte da infecção. Durante os primeiros cinquenta dias do surto, as rigorosas medidas chinesas para a prevenção de epidemias cortaram, com sucesso, a cadeia de transmissão, impedindo a propagação do vírus e evitando centenas de milhares de casos em potencial. Wuhan, o epicentro da pandemia, foi colocado sob quarentena pouco tempo após o surto. Pela primeira vez na história da humanidade, uma cidade de dez milhões de pessoas foi completamente fechada, bem como o governo colocou toda a província de Hubei (onde Wuhan é a capital) em quarentena.

A resposta rápida do governo chinês e a crença das pessoas na sociedade coletiva desempenharam um papel importante no controle do surto do coronavírus. Nesse aspecto, a China construiu uma infraestrutura de saúde pública abrangente que compreendia hospitais móveis (somente na cidade de Wuhan foram construídos 16 hospitais), além da mobilização de múltiplos recursos para formar o sistema de prevenção por todo o país, bem como para o tratamento dos infectados.

As principais empresas chinesas alteraram suas linhas de produção para suprir os produtos sanitários (máscaras, ventiladores e luvas, por exemplo). Essa mudança foi fruto de uma política industrial ativa, entendendo que era uma situação emergencial como, por exemplo, a capacidade de produção de máscaras foi elevada para 270 milhões de unidades diárias, tendo um aumento de 105% da capacidade inicial. Cito também, como outro exemplo, as empresas farmacêuticas, as quais intensificaram a produção de kits de teste de ácido nucleico e aceleraram a pesquisa cooperada de vacinas. O governo tem subsidiado os testes que, em sua maioria, são gratuitos, mas em algumas cidades podem chegar ao preço máximo de R$ 40, e, no final de julho de 2021, um total de mais de 170 milhões de chineses tinham sido testados para ácido nucleico, além de milhares de testes rápidos – a capacidade diária de testes de ácido nucleico atingiu a marca de 4,84 milhões.

A China também concentrou todo os seus recursos humanos na área da saúde para combater a pandemia. Os recursos médicos de todo o país apressaram-se a apoiar a Wuhan para proteger a vida dos cidadãos. Além disso, o governo chinês colocou grande ênfase na transparência de informação. Estatísticas diárias e informação pública sobre a pandemia são publicadas pelos comitês nacionais de saúde em todos os níveis, permitindo que a população mantenha-se alerta, e também são eficazes para dissipar os rumores sobre a expansão da doença. A população confia no governo e coopera ativamente, isso porque o governo chinês respeitou a ciência no processo de luta contra a covid-19.

Desde o início da pandemia, a China continuou ajustando as políticas sanitárias e socioeconômicas para auxiliar a sociedade na prevenção e estabelecer planos de tratamento de acordo com a situação real. O governo trata os problemas de uma forma científica e realista. Por exemplo, todo cidadão chinês ou estrangeiro que reside na China e entra no país precisa fazer uma quarentena de, no mínimo, 15 dias em hotéis-hospitais sem sair do quarto e com pelo menos dois exames durante esse período. No final dessa quarentena devemos fazer teste rápido (PCR) que usa material biológico das secreções nasais da orofaringe e o teste serológico de anticorpos.

Uma vez que ambos os testes sejam realizados e com o resultado negativo, essa pessoa receberá um QR code no aplicativo, no qual aparecerá uma tela com as informações de que ela não está contaminada.

Figura 1

Esse aplicativo é necessário para a entrada em qualquer local público. Além de mostrar o código verde (Figura 1: QR code), ela deve escanear o código de entrada no local, o qual mostrará outro código verde e registrará que essa pessoa esteve nesse local. Quando casos assintomáticos são descobertos nesses locais, as pessoas que ali estiveram são convocadas para a realização de exames.

Figura 2

Se algum caso de coronavírus for identificado em um bairro ou comunidade, todos os habitantes daquela localidade são monitorados e obrigados a fazer o teste em 48 horas. Além disso, o uso de máscara é obrigatório em lugares públicos.

Isso só pode ser feito e funcionou, pois o governo chinês fomentou um sentido de responsabilidade pessoal entre o povo. Assim, a China obteve o apoio total de sua população, ultrapassando dificuldades e cooperando ativamente face às regras rigorosas de prevenção de epidemias.

Por último, mas não menos importante, a China tem melhorado continuamente a capacidade de tratamento e se preparado para lidar com a ameaça contínua da pandemia, ao desenvolver e produzir vacinas, além de promover a vacinação. Até o momento, o governo chinês já aplicou 1,8 bilhão de doses em sua população e espera, até setembro, ter vacinado todas as idades (neste momento, é a vez da população com faixa etária entre 12 e 14 anos ser vacinada).

Ao mesmo tempo, a China se esforça em promover a cooperação internacional na prevenção e controle de epidemias. Por fim, cabe ressaltar, nas palavras do presidente Xi Jimping, que não existe direito maior ao cidadão do que a vida.

Essa pandemia tem tirado a vida de milhões de pessoas e me parece que uma parte da sociedade ocidental perdeu a sensibilidade, a empatia, a compaixão e tornou-se aquilo que de pior podemos produzir que é o desprezo à vida. Que essa terrível situação sirva de exemplo para refletirmos que tipo de sociedade queremos ter no futuro.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.