É preciso transformar as instituições brasileiras com medidas que democratizem nosso sistema político. Uma das modificações necessárias é a diminuição dos poderes dos presidentes das câmaras de vereadores, das assembleias legislativas, da Câmara dos Deputados e do Senado, que hoje são exagerados.
Vinculado a isso, seria conveniente substituir o atual mecanismo de impeachment pelo chamado referendo revogatório, quando for o caso de se afastar prefeitos, governadores e presidentes as República.
O referendo revogatório existe em alguns países e chegou a ser proposto para o Brasil quando da elaboração da Constituição de 1988. Com ele, em vez de os detentores de cargos executivos serem retirados pelo impeachment, como hoje, seria convocado um referendo pelo qual os próprios eleitores decidiriam se eles continuam ou não no cargo. Em outras palavras: eles seriam afastados por quem os elegeu.
A mudança reduziria o poder dos presidentes das casas legislativas. Hoje, quem ocupa esses cargos concentra um poder descomunal. Basta ver que o presidente da Câmara, Arthur Lira, tem a prerrogativa de decidir, sozinho, se vai tramitar ou não algum dos mais de 120 pedidos de impeachment de Bolsonaro. Lira está sentado em cima deles.
Mas hoje os atuais poderes do presidente da Câmara vão muito além. Ele controla a distribuição de R$ 11 bilhões em emendas parlamentares. Isso mesmo. R$ 11 bilhões em emendas parlamentares.
Isso é um valor superior ao orçamento de sete ministérios! É o que tem sido chamado de “orçamento secreto”. E por que “secreto”? Porque, além de concentrar essa soma gigantesca de recursos, mantém em sigilo informações sobre que parlamentares recebem o dinheiro, como os valores são determinados e onde serão gastos.
Menos republicano, impossível.
A única coisa que se sabe é que, para conseguir acesso a esses recursos, é preciso ter o beneplácito de Lira. Com que critérios? A fidelidade às propostas do governo (e do presidente da Câmara).
Com isso, os deputados escolhidos por Lira compõem uma elite na Câmara dos Deputados, com direito a carimbar mais de R$ 100 milhões em emendas só para si.
Com razão, o esquema já foi classificado pela imprensa como “sistema de castas”.
Esse orçamento secreto tornou tanto a Câmara como o governo federal ainda mais dependentes de Lira. Segundo líderes partidários, o presidente da Câmara construiu uma rede de influência de cerca de 300 deputados (de um total de 513).
Um antecessor de Lira, Eduardo Cunha, hoje condenado por corrupção, não chegou a ter tantos poderes, mas construiu também uma poderosa bancada, baseada na compra de deputados. Ela inclusive foi fundamental para a aprovação do impeachment da presidente Dilma. É o uso aberto de dinheiro público para favorecer interesses de uma curriola de deputados escolhidos a dedo pelo presidente da Casa.
Mas os escândalos relacionados com o poder de Lira não param por aí.
Na semana passada, num esquema sempre manobrado por Lira, o Fundo Eleitoral foi triplicado, passando para R$ 5,7 bilhões. É um verdadeiro escárnio o Congresso aprovar esse valor num momento de pandemia, aumento da pobreza, carestia, desemprego crescente e inflação de volta.
Bolsonaro faz demagogia e diz que vai vetar esse absurdo. Será? Mas tanto a sua base, como seus filhos 01 e 03 - Flávio e Eduardo - votaram a favor da indecência. O que ele diz disso?
Chega a ser revoltante alguns bolsonaristas afirmarem ter votado por engano, não sabendo que o aumento do Fundo Eleitoral estava “escondido” dentro da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Alegar esse desconhecimento para fugir das responsabilidades é hipocrisia. Até porque, antes da votação, alguns partidos de oposição que votaram contra a proposta alertaram para o que estava ocorrendo.
Fica, agora, a pergunta: Bolsonaro vetará o Fundo Eleitoral nesse valor absurdo ou vai ceder à pressão do Centrão, do seu novo chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e recuar?
Outra pergunta: caso resolva vetar, mobilizará a sua base para manter o veto? Sua Excrescência já lembrou, dando a senha, que “a última palavra” cabe ao Congresso...
Com essa aliança plena e filial ao Centrão, que já qualificou outrora como “ladrão”, Bolsonaro consolida o estelionato eleitoral. E manda às favas, de vez, a promessa de acabar com a mamata.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.