Direitos Humanos Feministas – Por Ana Beatriz Prudente

É importante afirmar que sem olhar para as mulheres não há como garantir e asseverar os direitos de todos os seres humanos, pois não podemos alijar metade da população

Foto: Nações Unidas
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Podemos afirmar que o feminismo é o iluminismo do século XXI, que colocou holofotes sobre questões que num primeiro momento eram voltadas para todas as mulheres e posteriormente, para questões específicas de cada tipo de mulher (abrangeu a diversidade). No Brasil, o movimento demorou a aderir à pauta racial. Foi por meio do advento desta discussão que eclodiu o Feminismo Negro Brasileiro, iluminado por Lélia Gonzalez, Eunice Prudente, Sueli Carneiro, Antonia Quintão e outras grandes mulheres negras. Este movimento fez com que os demais começassem a assimilar a importância dos recortes raciais e de gênero nas mobilizações de direitos humanos no Brasil. 

Alguns avanços são através das contribuições da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A proteção dos direitos humanos é o desígnio da instituição, que promove esses direitos na região composta por 35 países (da América do Norte, América Central, Caribe e América do Sul), países tão contrastantes quanto Haiti e EUA, por exemplo. É papel da Comissão assegurar a dignidade humana, envolvendo também organizações não governamentais. Portanto, a comissão também luta por auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas na defesa das mulheres.

Toda geração do movimento feminista possibilitou avanço nas pautas e não é diferente da minha geração (25 a 35 anos), entretanto, ainda não conseguimos dirimir as disparidades, vieses ou estereótipos e as consequências que eles impõem ao ser feminino. Assim, as discussões sobre gênero devem ser transversalizadas. Vivemos num mundo em que as alteridades e singularidades são ajustadas como expressões de identidade e de cultura e as mulheres não são impactadas pela discriminação da mesma forma, ou seja, brancas, negras, indígenas, LGBTs, meninas, refugiadas negras, refugiadas brancas não são tratadas da mesma maneira. Temos nitidamente padrões de exclusões que potencializam essa diferenciação – baseada em preconceitos. Não há lugar no globo onde uma mulher não esteja sendo escravizada, estuprada e privada de direitos (seja de qualquer nacionalidade, classe social ou raça). Entendo que a missão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos é conceber caminhos para que essa dor humana seja vencida.

Sobre as dissimilitudes e discriminações em relação à gênero, há a pesquisa Global Gender Gap Report, publicação anual do Fórum Econômico Mundial, que mostrou na edição de 2020 como homens e mulheres exercem seus direitos em vários países, levando em consideração os seguintes pontos: acesso à saúde, educação, mercado de trabalho e participação política. Uma das questões levantadas pela pesquisa é a de que em todos os países do mundo existe a discriminação contra as mulheres, no entanto, os países que menos discriminam são os países com menos desigualdades econômicas (como os países nórdicos, por exemplo). No Brasil, estamos atrás de diversas nações latinas, já que temos uma participação muito pequena das mulheres na política. Ainda que tenhamos ascensão no acesso à saúde, essa não é uma condição de empoderamento em questões políticas e de trabalho.

Um marco nos avanços em relação à violência contra a mulher no Brasil é a Lei Maria da Penha. Após sobreviver a duas tentativas de assassinato, a cidadã Maria da Penha batalhou judicialmente durante quase duas décadas para que as agressões que sofreu fossem reconhecidas. Esta lei, que foi criada somente após o Brasil ser condenado por negligenciar este tipo de violência, tem o propósito de coibir abusos e agressividades de aspectos físicos, sexuais, psicológicos, morais e patrimoniais. 

No contexto dos Direitos Humanos, é importante afirmar que sem olhar para as mulheres não há como garantir e asseverar os direitos de todos os seres humanos, pois não podemos alijar metade da população. As mulheres foram e são personagens basilares para criar a sociedade. Veja as diferenças entre mulheres e homens no tocante à autonomia e ao acesso aos bens e recursos fundamentais para seu desenvolvimento como pessoas continuam ainda abissais dependendo do país onde estamos. No mercado de trabalho ainda se reproduzem muitos estereótipos, apesar de existirem muitos esforços positivos das entidades feministas para a inclusão da diversidade, destaco a grande contribuição do Grupo Mulheres do Brasil que através de seus comitês promove a cultura de diversidade em diversos segmentos. É primordial que se trabalhe para mulheres negras serem líderes nas empresas. 


Pilar Rubio, proclama que “o feminismo ainda tem pela frente várias missões importantes e não desapareceu após a conquista do voto, mas começou a se fazer presente em leis, veredictos, escolas e universidades por intermédio de mulheres que legislavam, decidiam e educavam”. Assim, quando olhamos para os Direitos Humanos nos países que contemplam a região Interamericana, é de fundamental importância desenvolver políticas públicas para garantir a igualdade de gênero, pensando na transversalidade e em todas as minorias. É necessário esculpir esse diálogo mais estreito dos direitos humanos com a inclusão da mulher a partir da economia criativa, economia circular, economia solidária e outras categorias humanizadoras de circulação de riquezas.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.