Por esses dias, recebi um meme por WhatsApp. Coisa corriqueira, todos nós recebemos dezenas todos os dias. O meme em questão trazia em letras garrafais, como é típico das notícias falsas, uma “denúncia” de que Dilma Rousseff era uma assassina, por ter matado um soldado do exército com uma granada no período do Regime Militar. Com uma simples busca na Internet, encontrei um texto produzido pelo blog “Estadão Verifica”, que publica checagens de fatos e desmonte de boatos, refutando a informação sobre a ex-presidenta. Para mim já é rotina buscar em serviços do tipo a confirmação ou não de fatos estapafúrdios que chegam pela internet. A Folha de S. Paulo mantém a “Agência Lupa”. A Globo tem o “Fato ou Fake”. Consulto-os sempre que necessário.
Copiei o link desmentindo o meme contra Dilma e o enviei para o panaca que espalhava a lorota. Confrontado, ele respondeu, depois de algum tempo, que deveria ser notícia falsa mesmo, pois Dilma seria incapaz de manusear uma granada, que o artefato explodiria na cara dela antes do arremesso. Ou seja, o objetivo não é revelar um suposto crime. O que se quer é a desqualificação da ex-mandatária, a qualquer custo. Se é verdade ou não, pouco importa. Curioso que o meme volta a circular em um momento em que o Brasil soma 450 mil mortes por Covid-19 e parte da sociedade começa a querer responsabilizar as autoridades de plantão por tal morticínio, tanto que há uma CPI em andamento sobre o tema.
Minha ação de destruir a mentira mudou a opinião de quem a repassava? Não, nem um milímetro. Porém, por um breve instante, ele foi obrigado a pensar. Como explicou Márcia Tiburi no livro “Como conversar com um fascista”, essas pessoas comungam de um discurso vazio de reflexão, cheio de preconceito e ódio, ancorado em estereótipos. Comemoram a morte de bandidos em chacinas, celebram execuções por prazer, regozijam-se com violência policial, pedem o extermínio de adversários políticos, riem de incidentes vivenciados por pobres e miseráveis em situação de rua, dependência química ou alcoolismo. Vibram até mesmo com mísseis disparados sobre a Palestina. Consideram-se cristãos e cidadãos de bem.
A pergunta é: vale a pena perder tempo combatendo-os nas redes sociais? Creio que há duas dimensões que precisam ser observadas. As ações dentro das redes e fora delas. Consideremos que a opinião pública se faz de maneira difusa. Toda e qualquer opinião ajuda a conquistar mentes. Às vezes, uma simples palavra colocada na hora certa muda um pensamento.
Dentro das redes sociais, a batalha é mais dura. Se não participarmos, os arautos do ódio produzirão e espalharão conteúdos livremente e terão hegemonia do meio digital. Logo, precisamos criar e divulgar informações de forma que anulem, ao menos em volume, a corrente contrária. Não devemos perder a perspectiva de que os algoritmos das principais redes sociais nos isolam em bolhas, em nichos, e tentam entregar aquilo que acham que gostaríamos de ler e de ouvir. Assim, progressistas falam com progressistas, terraplanistas falam com terraplanistas, palmeirenses com palmeirenses, corintianos com corintianos. Os sistemas de Inteligência Artificial das redes traçam e guardam perfis de cada um de nós e distribuem os conteúdos de maneira microssegmentada.
Quando publicamos algo nas redes sociais, achamos que falamos com o mundo, mas, na quase totalidade dos casos, atingimos apenas quem já pensa como nós. E quando tentamos travar debate digital direto com opositores, o que colhemos são guerras de monólogos onde cada um tenta proteger seu ponto de vista, onde concordar é capitular ao outro.
Como então furar as bolhas das redes sociais? Como disse Márcia Tiburi, com o diálogo. Com diálogos que façam o outro voltar a raciocinar. Com o diálogo como prática política. Para isso, melhor é o olho no olho, o encontro presencial, a fala com empatia. Frente a frente as pessoas ficam mais abertas, reduzem suas defesas de posições e surgem mais chances reais de debate e de convencimento. Nestes tempos em que o isolamento social segue necessário, a afeição é mais uma vítima.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.