As posições tomadas por Kássio Nunes Marques, o mais novo integrante do Supremo Tribunal Federal, indicado por Bolsonaro, acendem todas as luzes de emergência naqueles que prezam pelo mínimo de seriedade e legalidade na República.
Na decisão de caráter liminar concedida ontem a uma tal entidade de “juristas evangélicos” (seja lá que diacho for isso), em que autorizou a abertura de templos religiosos no momento em que a pandemia leva embora quase quatro mil vidas diariamente, o juiz-ministro do STF, o mais alto tribunal de nosso Judiciário, não fundamenta absolutamente nada do que defende, vai contra décadas de jurisprudência da Corte Constitucional e, claramente, como no caso do HC de Lula, vota como um tiozão desagradável do churrasco da família, aquele idiota inconveniente que sempre quer chocar e ter razão com suas posições descabidas.
O fato é que a autorização lança milhares, ou milhões, de brasileiros à morte, com a anuência do tribunal que deveria ser o guardião da Constituição e servir de prumo para o bom senso na nação. A decisão é monocrática, tem validade imediata, mas precisará ser votada pelo plenário do STF. Vários articulistas da imprensa hegemônica já disseram ontem que ouviram outros ministros da corte e que a decisão de Nunes Marques deve ser derrubada, mandando um sonoro “não” à insanidade dos estelionatários da fé e do magistrado.
Não é necessário dizer que este comportamento inconsequente e criminoso, de propor loucuras, é o mais característico dos integrantes da seita bolsonarista. A insistência numa visão de mundo totalmente distorcida, com “convicções” esdrúxulas e “opiniões” aberrativas é típica do presidente, de seus ministros de Estado, deputados, senadores, prefeitos, vereadores e entusiastas membros dessa espécie de religião que cultua o mau-caratismo assumido, mas no caso em que passa a ser o padrão de ação de um juiz da Suprema Corte, a coisa torna-se muito mais preocupante.
Nunes Marques não é exatamente um babaca pleno, um salafrário que saiu do armário. Não, não é isso. Ele é parte de um outro grupo de bolsonaristas formado por aqueles que foram pinçados por Jair Bolsonaro e saíram de um relativo anonimato para o estrelato do primeiro escalão e que, depois de assumirem seus poderosos cargos, embarcam nas quimeras do símio do Planalto como forma de retribuir e agradecer a nomeação. Faz a linha de André Mendonça e Augusto Aras.
Seus textos e votos, que embasam suas decisões como ministro, são pobres e mal formulados. Recheados de conclusões genéricas, constrangem e provocam vergonha alheia nos outros membros do STF e em personalidades do mundo jurídico. A impressão que fica é de um ministro que apenas redige uma desculpa para tomar decisões importantíssimas que são totalmente desconectadas da realidade, sem fundo legal.
Sobre a autorização de funcionamento das igrejas em meio ao caos da peste, devemos levar em consideração que significativa parte dos frequentadores desses locais é de gente muito simples e humilde, desesperada, sobretudo de idosos. Esses cidadãos deveriam ter sua integridade e vida protegidas por decisões do Supremo Tribunal Federal e não serem encaminhados para a contaminação pelo vírus mortal que se alastra pelo país.
Kássio Nunes Marques descaradamente atendeu ao chamado dos vendilhões do templo, dos traders da ingenuidade alheia, e conferiu um verniz jurídico a uma maluquice que trará resultados catastróficos.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.