“Quem mata uma mulher mata a humanidade”.
(Levante Feminista contra o Feminicídio).
A permanente situação de violência contra as mulheres no Brasil é dessas coisas que tentam fazer parecer normal. Tentam minimizar, relativizar, compreender. Os meios de comunicação de massa atuam cotidianamente para consolidar essa percepção, ignorando o ciclo de violência que recai sobre nós. O Estado é omisso e faz muito pouco para garantir a integridade dos nossos corpos. Quando o assunto vira notícia, em geral já não dá mais tempo: mais uma mulher foi assassinada.
Em 2020, foram 1.350 vidas de mulheres perdidas. Ou seja, uma mulher foi vítima de feminicídio a cada 6,5 horas no país, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP) apontam que os casos de feminicídio aumentaram 50% no estado do Rio de Janeiro nos primeiros quatro meses de 2021. Trinta mulheres foram assassinadas no período.
Os dados do Dossiê Mulher 2021, divulgados pelo ISP, apontam que a morte violenta vitimou mais de 10 mulheres por mês no ano de 2020 na cidade do Rio de Janeiro. Entre as mortes violentas de mulheres, 18 casos foram tipificados como feminicídio - mais de um por mês na cidade que acumula cerca de 23% de todos os casos de feminicídio do estado do Rio de Janeiro. A violência doméstica, que é reconhecidamente início de um ciclo que muitas vezes é fatal e pode resultar no feminicídio, pode ser compreendida como uma pandemia. Mais de 34 mil mulheres foram vítimas de violência doméstica (que considera a violência moral, psicológica, física, sexual e patrimonial em sua conceituação) só na cidade do Rio de Janeiro.
Violência sexual
Ainda não terminou. Quase 12 mil mulheres foram vítimas de violência física, isto é, mais de uma mulher foi agredida por hora. As vítimas de violência sexual atingem mais de 150 mulheres por mês, o que significa que ao menos cinco mulheres foram vítimas de estupro na cidade, por dia, durante o ano de 2020. Aproximadamente 75% dos casos acontecem dentro de suas casas e os criminosos são homens conhecidos da vítima e de sua família.
Essa situação é inaceitável. Por isso, uma das primeiras iniciativas de nossa mandata foi o protocolo do Projeto de Lei 58/2021, que institui o Programa Municipal de Enfrentamento ao Feminicídio na cidade do Rio de Janeiro. Seu objetivo é detectar e impedir o espiral de violência contra mulheres, de modo a impedir o agravamento da situação, preservando vidas. O PL foi construído com a participação de ativistas, pesquisadoras, juristas, organizações e instituições, a partir do entendimento de que o feminicídio é a forma mais extrema de violência contra as mulheres entre todas as desigualdades e violências estruturais vivenciadas pelas mulheres em nossa sociedade.
Ao não garantir políticas públicas que permitam que elas tenham autonomia financeira e social para viverem livres de violências, e quando há falha na proteção das mulheres que denunciam uma situação de violência, o poder público se torna conivente com o assassinato das mulheres que morrem por feminicídio.
Nesse sentido, reafirmo a urgência da atuação do poder público municipal para o enfrentamento do feminicídio, e para isso é necessário que a Câmara dos Vereadores aprove o Programa Municipal de Enfrentamento ao Feminicídio no Município do Rio de Janeiro. Nós, mulheres, queremos cidadania, não controle. Queremos direitos, não perseguição e ameaças. Queremos vida, não política de morte.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.