As lives tomaram conta do país.
É uma onda que só faz crescer. São milhares de lives diariamente e estão sendo organizadas em todo o país, inclusive nas favelas e bairros populares.
Cada dia mais gente e instituições estão promovendo esses bate-papos, debates e entrevistas transmitidos por streaming e organizando essas conversas que se consolidaram no Brasil com a denominação de lives.
O formato impõe restrições e tem predominado um nível alto de improvisação, mas certamente irá evoluir rapidamente para produzir conversas e intervenções mais planejadas e elaboradas.
A profusão de lives é um sintoma de que as pessoas estão buscando entender o que está se passando no país e essa onda pode vir a impulsionar a renovação política. Inegavelmente, elas estão cumprindo um papel importante na conexão das pessoas presas em casa ou soltas no mundo, assustadas, confusas e perplexas, desamparadas politicamente desde o afastamento da presidenta Dilma e da prisão do ex-presidente Lula.
O ambiente que está sendo propositalmente criado no Brasil é propício ao pessimismo e à depressão e se eles vencerem, mergulharemos por algum tempo, em uma escuridão profunda.
Eu não tenho dúvida de que essas lives são uma forma de resistência, um formato novo de movimento social, onde todos podem falar, dizer o que pensam. São também uma alternativa à pauta seletiva e superficial dos meios de comunicação tradicionais.
As conversas podem não ser brilhantes e na maioria não são. Mas restabelecem na sociedade o espaço do diálogo, da reflexão, convocam as pessoas a pensarem e a se manifestarem. Ajudam a repor a inteligência e os saberes nos seus devidos lugares.
No conjunto da obra, somando todas as lives, o resultado é muito positivo.
É uma forma de ação muito democrática, que possibilita um enfrentamento coletivo em meio ao isolamento social.
A burrice, o negacionismo mais grosseiro, a ignorância a serviço do que há de pior em termos de projeto político vinham ocupando todos os espaços e criando as condições ideais para que o fascismo tupiniquim se estabeleça e cresça na sociedade brasileira.
O non sense bolsonarista não pode ser tratado apenas como algo ridículo e cômico, pois é perverso e é parte importante de uma estratégia de desmonte do país, de demolição de todas as conquistas sociais, políticas e comportamentais.
É hora de pensar e formular saídas. É hora de fazer frente a essa destruição do Brasil. Tudo tem que ser questionado, tudo dever ser criticado, analisado e reconstruído. Inclusive nós mesmos. Tudo no Brasil tem que ser revisitado pela razão e pela inteligência. Com muito carinho, afeto e generosidade.
O trabalho de demolição da nação brasileira, que a extrema direita associada ao neoliberalismo faz, é avassalador e tem muitas frentes.
Essa quantidade inacreditável de frentes e temas é, na verdade, uma estratégia de guerra híbrida.
É o Brasil como país que está em questão. A demolição do Estado nacional, a destruição da nossa soberania, a anulação das conquistas sociais e a perda das referências culturais e das identidades nacionais.
Se eles forem bem-sucedidos, não haverá, em um futuro não muito distante, uma coesão social que sustente a nação brasileira. Viraremos um entreposto comercial bem-comportado, fornecedor de matérias primas e commodities, ou nos transformaremos em mais uma zona de conflito permanente, uma ferida aberta sem chance de cicatrizar.
É preciso enfrentá-los amplamente, tratar de todos esses temas que emergiram, mesmo os mais banais e que carregam nos argumentos um nível de irracionalidade, ignorância e burrice surpreendentes.
Esse nonsense, que beira a idiotia, presta um grande serviço ao projeto neoliberal de extrema direita criando um clima de fim do mundo, como se não houvesse futuro.
O futuro, para voltar a existir, e voltar a ser uma referência social importante, exige o cerzimento com muito carinho das nossas utopias e crenças e que se recupere e que a esperança contagie o povo brasileiro.
Precisamos de uma plataforma de cidadania que una os brasileiros e se transforme em uma força social poderosa.
As lives estão criando as condições para o renascimento do necessário otimismo.
Através delas, estamos recompondo uma dimensão do tecido social e recuperando o ânimo.
É a reafirmação, nos tempos presentes, do velho ditado popular:
É conversando que a gente se entende!