Carta aberta à OAB, STF, Representações Políticas, Sociedade Civil e à inteligência que persiste no país.
Em nome da subnotificação de 10 mil mortos pela Covid-19 e suas famílias; em nome dos mais de um milhão de infectados, segundo cálculos científicos; em nome de todas as pessoas que sofrem perdas humanas e materiais; em nome de todos os novos órfãos.
Proponho pelo menos um símbolo, um valor de consenso mínimo neste momento de dor geral: que o presidente, ainda tido como cidadão brasileiro sujeito a leis e sua expressão fática e moral, seja impedido e, se necessário, preso – ao lado dos comensais e peladeiros – se persistir na sanha de churrasquear neste fim de semana. Oxalá desista*.
Lembro que, em face das intervenções já feitas pela segurança pública no caso de festas e comemorações de cidadãos comuns, não cabe outra atitude da estrutura democrática do país diante do propalado acinte, visto que em concretizado o crime no tempo de pandemia, nenhum valor simbólico nos restará nas mãos, como cidadãos, como autoridades, como sociedade. Sobrará pouco de nós como seres constituintes de sensibilidade e, portanto, de humanidade. Menos ainda como autoridade ética.
Todo mundo sabe que o projeto da pelada com churrasco nos jardins do palácio brasiliense é um tapa na cara do país, uma bofetada intencional nas autoridades constituídas, inclusive algumas de bom senso que ainda servem, por grave engano pessoal e histórico, o governo central, sejam civis, sejam militares.
Sendo assim, não há que esperar pela segunda-feira e voltar à cantilena processional de lastimar os atos antissociais da pessoa desgraçadamente eleita e que se encontra no poder da República. Tal cantilena é velha conhecida na história republicana e também já foi culpada, por omissão ou retórica, dos atrasos e retrocessos em nosso regime democrático.
Carece impedir a tal pelada com churrasco. Imediatamente. Nada a ver com o direito constitucional de ir e vir. Ao contrário, trata-se de garantir a dignidade constitucional de leis e normas de saúde e vida para todos e todas, em igualdade de condições. A morte de um é, simbolicamente, a morte de todos. Somos conterrâneos. Não se pode imaginar que o direito e a justiça prevariquem no interior da dor comum.
A ver. Não tenho poder, mas muita ira. Este país tem o direito de ser sério e respeitado, especialmente pelas suas culturas e pelo seu sofrimento histórico.
Se nem os meninos da periferia estão tendo direito à peladinha, por que um poderoso quer fazê-la impunemente, com vaquinha ou sem vaquinha?
*O texto foi escrito antes de Bolsonaro desistir do churrasco
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum