Uma das maiores vitórias da sociedade brasileira em 2020 foi a aprovação da Emenda Constitucional do Novo Fundeb - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação.
Por se tratar de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), o texto precisava ser aprovado por três quintos dos deputados, o correspondente a 308 votos favoráveis, em dois turnos de votação.
Em julho, foi aprovado em duas votações, na Câmara dos Deputados. No primeiro turno de votação na Câmara foram 499 a favor e apenas 7 contra a proposta. Foi uma vitória tão acachapante da sociedade civil em defesa da educação pública como direito que, no dia seguinte, Bolsonaro (contrário à proposta) se apropriou da nossa vitória e se declarou "pai" do novo Fundeb.
Um dos grandes avanços do novo Fundeb é elevar o aporte feito pelo governo federal para financiar a educação básica a Estados e municípios. O patamar atual é de 10% do total do fundo (cerca de R$ 14,8 bilhões este ano) e o projeto de lei torna o Fundeb constitucional e com aumento gradual de financiamento até o índice de 23% em 2026.
Mas como tudo não são flores neste Congresso de maioria fisiológica, os lobbies contra o Fundeb começaram e o projeto original de autoria da deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO) e outros, para regulamentar a Emenda Constitucional 108, promulgada pelo Congresso em agosto deste ano, sofreu alterações. Na votação da Câmara dos Deputados em 11 de dezembro, deputados a favor dos lobbies incluíram no pacote do Fundeb escolas confessionais e filantrópicas e até mesmo o Sistema S que conta com muitos recursos já garantidos pelo financiamento público.
Sob pressão social, votação no Senado reverteu a malandragem fisiológica da Câmara
O Projeto de Lei (PL) 4.372/2020, que regulamenta, já a partir de janeiro de 2021, como devem ser aplicados os recursos do novo Fundeb, agora de caráter permanente, foi aprovado no Senado na última terça (15/12) com a garantia de que os recursos do Fundo sejam integralmente voltados à educação pública.
O relator do projeto, senador Izalci Lucas (PSDB-DF) após pressão, acabou convencido de que recursos do Fundeb não podem ser transferidos para o mercado privado. Durante a votação ele afirmou: "Aqui preservam-se os recursos para a escola pública. A Câmara distorceu um pouco, colocando recursos do Fundeb para pagamento de folha até de terceirizados de escolas públicas, assim como nas escolas confessionais e comunitárias. Estamos tirando isso, e também o Sistema S. O Sistema S pode fazer convênio com qualquer estado ou município, desde que não seja com recursos do Fundeb. Então vai continuar fazendo o que vem fazendo. Da mesma forma, as escolas comunitárias e confessionais."
O texto de Izalci foi aprovado de forma unânime, em votação simbólica. Desse modo, como o Senado rejeitou os penduricalhos favoráveis aos lobbies ou seja, a possibilidade de escolas privadas, como as vinculadas ao Sistema S, as confessionais, comunitárias e filantrópicas também recebessem recursos do Fundeb, o texto volta à Câmara para ser votado novamente.
Ministério Público Federal se posiciona a favor do Fundeb para educação pública
Após a malandragem fisiológica na Câmara dos Deputados, o Ministério Público, por meio da Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos em Geral do MPF, enviou nota técnica aos 81 senadores, onde apontava as inconstitucionalidades da versão aprovada na Câmara. O documento pode ter ajudado a pressionar o Senado a manter os recursos do Fundeb na íntegra para a educação pública.
Em um trecho da nota técnica o MP deixa bem claro que o Fundeb deve ser para o ensino público e não para financiar o ensino privado: “O que parece motivar tal pretensão é a demanda das próprias instituições privadas de ensino por sustentação econômica da sua capacidade instalada”.
Cálculos da CNTE revelaram o tamanho dos prejuízos ao Fundeb
Durante a votação no Senado, o senador Paulo Paim (PT-RS), apresentou os dados da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE). De acordo com a entidade, se o Fundeb fosse regulamentado como saiu da votação da Câmara no dia 11/12, tiraria, já a partir de 2021, R$ 16 bilhões do ensino público. De acordo com Paim: "Seria um golpe sem precedentes contra a escola pública e seus profissionais. O ensino privado, que já recebe R$ 6,7 bilhões de dinheiro público, teria mais R$ 16 bi do Fundeb, reajustado anualmente. Uma farra. É a escola pública que atende mais de 80% dos estudantes brasileiros. Com menor investimento no Fundeb, os mais pobres pagariam a conta outra vez"
Rodrigo Maia, o presidente da Câmara, diz ser favorável a manutenção do texto original do projeto de regulamentação, sem as emendas inconstitucionais que retiram dinheiro público para instituições privadas. Mas não impediu o ataque ao Fundeb na votação do dia 11/12 na Câmara.
Agora é vigiar a Câmara Federal para que deputados fisiológicos não busquem distorcer novamente o projeto de regulamentação do Fundeb.
Com informações da Câmara e do Senado