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OPINIÃO
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Future-se é um neologismo imperativo. É ordem, porque supõe um emissor que manda, não um recado, mas um projeto às instituições federais de educação e, talvez, a todas as universidades do país. Como linguagem vinda do ministério de Weintraub o neologismo combina bastante bem com aspirina nazista, guarda-chuva aberto no meio da sala e chocolates contingenciados por percentuais.
Menos com projeto, programa ou política, pois estes devem ser urdidos na experiência vivida pelas instituições a partir de diretrizes federais que também consideram um longo debate entre as instituições reais do país real. No entanto, tem força de oficialidade e, portanto, carece de ser escrutinado em sua gramática de sentidos, pois o lugar de sua criação pode estar longe do MEC e produzir sinergias.
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Agentes de um governo comprometido com a miséria social do país costumam produzir neologismos como enunciação, mas não como enunciado, isto é, o texto completo e suas referências implícitas.
No caso em debate, dá-se um problema grave de autoria porque podem estar ausentes indicações importantes para precisar tempo, espaço, orientação política, atitudes e disposições capazes de conectar o texto do Future-se tanto ao governo como ele é quanto a uma racionalidade histórica e política.
Isso significa que convém à nossa inteligência universitária fazer o debate amplamente coletivo, munida da precisão que oriente a sociedade brasileira sobre o fenômeno. Por certo longe da burocratização, pois a três dias de seu final de exposição pública, consta que o sítio eletrônico do Future-se não recebeu mais do que 25 mil visitas.
Ruim seria, neste momento histórico, dar “tiro para todo lado” e interpretar mundos e fundos do Future-se (tido como projeto em si), pois tais atitudes poderiam se aproximar dos discursos produzidos por parte significativa do governo e já amplamente conhecidos. A universidade, por tradição e competência, porta outra linguagem analítica.
O Future-se é um discurso tardio de documentos do Banco Mundial dos anos 1990 e dos textos de diferentes momentos da OCDE/OECD. Este articulista trabalhou com tais textos entre 2006 e 2007 para caracterizar o que acontecia com a formação e o trabalho da juventude europeia.
Havia clara sinergia entre a precarização do trabalho da juventude estudada e as propostas educacionais dos economistas da dita organização (suporte do G7, G8 e G20). Efetivamente não se dava relação de causa e efeito, mas sinergia de ações entre o liberalismo radical e as receitas dos textos do Banco e da organização com sede em Paris.
No caso do Future-se, há frases inteiras tiradas daqueles documentos. Entre os mais destacados, além do World Bank, são facilmente encontradas as análises de 2005 e de 2017/2018 da OCDE, com certeza conhecidas dos assessores do Sr. Weintraub.
O que significa essa orientação textual e política?
Significa uma homologia discursiva de todas as ações políticas do governo Bolsonaro, que se inicia pelo fingimento de maluquice do presidente, passa por um a um dos programas do Sr. Guedes, pelos encaminhamentos dos ministérios de Ambiente e Agricultura, pelo alinhamento na direção de o país ser recebido pela OCDE/Trump e seu rebatimento em todo o sistema educacional. O Future-se é irmão univitelino da “carta-compromisso” do MEC para a educação básica, que o precedeu. O que é comum e une os programas?
A-Produzir referências (gestão, inovação, empreendedorismo, pesquisa) para os analistas de indicadores da OCDE entre 2019 e 2030;
B-Ampliar o poder da educação a distância nas mãos dos grupos privados de “serviços educacionais”;
C-Mostrar, via OS/Universidades e Colégios Militares, a eficiência expandida do sistema PPP;
D-Reorganizar todo o sistema tributário e as responsabilidades nos investimentos dos entes federados, também exigência da OCDE;
E-Destacar a meritocracia como “modo de produção” radicalizado nas relações entre as instituições educacionais e a sociedade, de que resulta um especial “exército precário de reserva”, quer como usuário de serviços da educação, quer como pretendente a professor, funcionário, aluno etc.
F-Induzir com força “o que já existe pensado em educação básica” e o que parece novidade em educação superior (o futuro em construção) para fazer dom que as duas etapas da educação se “modernizem” e os indicadores surjam como palatáveis para venda externa da receita e assimilação às entidades internacionais.
Quais os erros brutais dos “programas” e quais os possíveis erros no debate e na aceitação pelos sujeitos da educação brasileira?
A-Toda a diversidade, traduzida por desigualdades, do país mestiço de 8 milhões de quilômetros quadrados, é desconsiderada, de cabo a rabo na relação dos programas;
B-Os indicadores dos modos de produção então unificados suscitarão um apagamento das responsabilidades de entes públicos e uma “geleia geral” público-privada será introduzida no sistema;
C-Quantidade significativa dos 45 milhões de estudantes integrados ao sistema inteiro de educação ficará desassistida, será “pescada” pelo poder privado (até na educação infantil) ou desaparecerá nas vielas do esquecimento e da morte;
D-O governo começará imediatamente a usar todas as redes sociais e seus instrumentos oficiais de comunicação para criar contradições, quer na recusa ao Future-se, quer nos obstáculos à “carta-compromisso” da educação básica, de que decorre o desafio altamente mobilizador dos sujeitos comprometidos com a educação de qualidade pública, gratuita e voltada ao país profundo e desigual.
É de se esperar que nossos debates, desde os estritamente acadêmicos às audiências públicas do Congresso Nacional, das uniões de estudantes às conversas da rapaziada que pensa a educação, seus pais e todos os colaboradores do sistema escolar, tenham direção essencial, produzam documentos firmes e fortes, construam mobilização social e deem respostas INCONFUNDÍVEIS ao projeto turboliberal ora proposto, do ensino infantil ao pós-doutorado. Ser urgente e eficiente ao mesmo tempo é preciso.