Alinhado à pesquisa da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), um estudo realizado pela Associação de Gestores da Caixa no Rio de Janeiro (Agecef-Rio) e o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela o adoecimento dos empregados do banco público em consequência da sobrecarga de trabalho e da cobrança de metas desumanas no contexto da pandemia. Segundo o levantamento, 88% dos trabalhadores ouvidos declararam ter tido sentimentos negativos, como ansiedade, depressão, angústia e pânico.
Já a pesquisa da Fenae/UnB apontou que mais da metade dos empregados entrevistados (53%) sofreu assédio moral. O levantamento também mostrou que 20% dos trabalhadores ativos da Caixa apresentam depressão ou ansiedade. E 47% dos bancários já tiveram conhecimento de algum episódio de suicídio entre colegas. Responsáveis em 2020 pelo pagamento do auxílio emergencial e de outros benefícios a cerca de 160 milhões de brasileiros, os empregados da empresa retornarão à linha de frente deste atendimento à população a partir da próxima semana, quando, segundo o governo, o auxílio volta a ser pago e novamente de forma exclusiva pela Caixa Econômica.
“Os trabalhadores estão atuando sob um grande estresse devido às jornadas exaustivas, ao trabalho em ambientes com alto risco de exposição ao coronavírus e à cobrança por metas desumanas”, ressalta o presidente da Fenae, Sergio Takemoto.
De acordo com o levantamento da Agecef/Dieese, que ouviu 900 gestores da estatal no Rio, 70% responderam que, durante a pandemia, trabalharam mais do que a jornada contratual. Apenas 12% dos bancários declararam não ter tido sentimentos negativos. Do total, cerca de 30% afirmaram que nunca tinham antes sofrido de ansiedade, depressão, angústia e pânico. E 38% já haviam vivenciado experiências como estas, mas consideraram que foram agravadas.
“Há casos de colegas que se demitiram para não comprometerem ainda mais a saúde. Outros ficam de licença meses a fio e não conseguem segurar o choro só de pensar em entrar numa agência”, conta o presidente da Agecef-Rio, Rogério Campanate. Segundo ele, o déficit crescente no quadro de pessoal da Caixa também contribuiu para as dificuldades enfrentadas pelos empregados, durante o ano passado.
"Nos últimos cinco anos, a Caixa perdeu quase 20 mil empregados em sucessivos planos de demissão voluntária sem reposição e isso vem prejudicando muito a qualidade do atendimento à sociedade”, observa Campanate. “Com a pandemia, além dessas demissões, temos os trabalhadores que pertencem a grupos de risco e que, por isso, não podem atuar no trabalho presencial", acrescenta.
Conforme a Fenae mostrou nas últimas semanas, as contratações anunciadas pela direção do banco — que confirmou a abertura de 76 agências para o aumento da rede de atendimento — não suprem nem 15% da falta de empregados. De acordo com a Caixa, serão convocados 2.766 aprovados no concurso de 2014, o que representa apenas 13,83% da atual carência.
Este quantitativo de novos bancários que deverão ser admitidos (2.766) corresponde a menos da metade (36%) do total de vagas anunciadas pela empresa, que também incluem 1.162 estagiários, 2.320 vigilantes e 1.456 recepcionistas. O presidente da Fenae chama atenção para o fato de que nas 2.766 futuras convocações de concursados já estão incluídas as 566 contratações anteriormente informadas pela Caixa.
Cobranças desumanas — O levantamento feito pela Agecef-Rio ainda aponta que 74% dos entrevistados avaliaram que metas internas interferiram de forma negativa sobre sua saúde mental dos bancários da Caixa. "A direção da empresa atribui metas absurdas de vendas de produtos bancários, ameaçando com a retirada da função de confiança os empregados que não atingirem tais metas, o que pode ensejar reduções salariais superiores a 50%”, avalia Laura Benevides, analista-técnica do Dieese. “O empregado se vê encurralado entre o atendimento à população e o atingimento de metas em plena pandemia", completa.
Na avaliação da diretora de Saúde e Previdência da Fenae, Fabiana Matheus, é urgente que a estatal reveja as práticas de gestão, reconhecendo o quanto o adoecimento dos bancários impacta negativamente na produtividade. “O modelo de gestão da Caixa empurra os empregados para o adoecimento. Os trabalhadores precisam de um ambiente saudável, sem sobrecarga e assédio moral e sem o medo constante de perder o emprego”, afirma a diretora.
Assédio — Levantamento divulgado na última semana pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no Distrito Federal revelou que o número de denúncias de assédio moral em órgãos públicos federais aumentou 80%, em 2020. Foram 54 no ano passado contra 30 em 2019. A Caixa Econômica Federal ficou em segundo lugar no ranking do MPT-DF. A pressão para o retorno ao trabalho presencial, apesar do recrudescimento da pandemia, apareceu entre os registros atribuídos ao banco público.
A Fenae, a Comissão Executiva dos Empregados (CEE) e outras representações dos trabalhadores do banco intensificaram as denúncias relacionadas à cobrança, por parte da direção da estatal, de metas incompatíveis com o contexto da pandemia da covid-19. As entidades também vêm alertando para o afrouxamento de normas de proteção à saúde dos trabalhadores e a pressão para o retorno presencial, apesar do aumento exponencial dos casos de contaminação pelo coronavírus em diferentes locais do país.
“O governo não tem plano de vacinação em massa e quer jogar a responsabilidade desse caos para a sociedade. Não tem a mínima consideração com a vida das pessoas”, analisa o presidente da Fenae, Sergio Takemoto, ao reforçar a defesa para que os bancários da Caixa sejam incluídos no grupo prioritário de imunização em virtude da alta exposição ao coronavírus e ao risco constante de contaminação pela doença.