O discurso de filiação do ex-juiz Sergio Moro no Podemos deve ser observado por algumas lacunas gritantes, entre elas, o fato de que Moro, que se vendeu como alguém que vai defender a Justiça para todos os cidadãos, não falou sobre os direitos e as violências contra as mulheres, LGBT e pessoas negras no Brasil.
Pelo contrário, ao longo de seu discurso defendeu a chamada “guerra às drogas”, que no Brasil mata, diariamente, jovens negros. Se gabou de ter “combatido o tráfico de drogas”, mas foi incapaz de falar da violência contra as mulheres no Brasil.
Afirmou que se coloca à disposição dos brasileiros para construir uma país mais justo, mas, pelo visto, nesse país que ele sonha não existem LGBT, visto que foram ocultados do seu sonho de Brasil, sendo que este é o país que mais mata lésbicas, gays, bissexuais, trasvestis e transexuais no mundo, segndo a ILGA e o GGB.
Além disso, em momento algum, Moro, que se vende como o arauto da Justiça, não falou especificamente os casos de feminicídios no Brasil, que tem um piores índices do mundo.
Em quase 1h de fala ou dez páginas de discurso, Moro reconheceu que não tem traquejo político em sua fala, mas afirmou que é "alguém que todos podem confiar". Será?
Moro e o populismo penal
A única diferença objetiva entre Moro e o seu ex-patrão, o presidente Bolsonaro, é o sapatênis, pois, de resto o pré-candidato do Podemos à presidência da República é um lugar comum para disputar votos na extrema direita.
Mas, para se distanciar de Bolsonaro, afirmou que foi traído por este e exaltou os feitos enquanto juiz.
Destacou o fato de ter julgado e processado "grandes traficantes de drogas, ladrões de banco e de pessoas que pagaram ou receberam suborno. Tudo para proteger as pessoas, as vítimas e o povo brasileiro".
Provavelmente inspirado pelos memes que o vendem como "Super Moro", o ex-juiz vestiu a capa de herói e afirmou que fez história à frente da Lava Jato.
"Fui juiz da Operação Lava Jato em Curitiba. Foi um momento histórico: quebramos a impunidade da grande corrupção de uma forma e com números sem precedentes", disse.
Mas, sobre ter sido considerado imparcial e suspeito nas ações contra o ex-presidente Lula, nem um pio.
Moro: a vida política se degenerou
Reproduzindo discursos que já foram utilizados em momentos recentes da política brasileira, o ex-juiz declarou que "a vida política" no Brasil está degenerada e, novamente se colocando como um herói, afirmou que se pudesse, lutaria sozinho pelo Brasil.
"Se necessário, eu lutaria sozinho pelo Brasil e pela Justiça. Seria Davi contra Golias. Mas, ao ver esse auditório, tenho certeza de que não estou sozinho", disse.
Moro declara "guerra às drogas"
A questão das drogas e da segurança pública não ficariam de fora do discurso de Moro, e as promessas do pré-candidato não fogem daquelas defendias pela extrema direita, ou seja, "guerra às drogas" e repressão policial.
"Precisamos proteger a família brasileira contra a violência, contra a desagregação e contra as drogas que ameaçam nossas crianças, jovens e adultos. Propomos incentivar a virtude e não o vício, uma sólida formação moral e cidadã".
O que seria incentivar a virtude? E o que o juiz quer dizer com uma formação sólida de moral e cidadã? Quem seriam os imorais? O que caracterizaria uma pessoa como não cidadã?
Em seguida, mais populismo penal: "Nosso projeto de redução da criminalidade violenta, do combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas precisa ser retomado com todo o vigor, sempre na forma da Lei, e buscando recuperar aqueles que se desviaram do bom caminho".
Atualmente as polícias atuam fora lei? Quem são as pessoas que se desviaram do bom caminho: usuários de drogas?
Os buracos do discurso de Moro mostram que, na verdade, há um lastro persecutório e punitivista que dá base para as suas ideias.
E um discurso punitivista, quanto mais vago e genérico, mais perigoso é, pois, qualquer um, como diz o ex-juiz, pode estar desviado do bom caminho.
Será que ele vai propor a reedição a Lei da Vadiagem?
Moro repete Bolsonaro e defende fim dos privilégios da classe política
Assim como Bolsonaro o fez em sua campanha, Moro quer se vender como um outsider da política e como uma figura que vai combater "os privilégios da classe política". Só não falou com vai fazer isso, visto que se filiou em um partido pequeno com baixa representação parlamentar.
"Proponho, desde o início, a eliminação de dois privilégios da classe dirigente: o fim do foro privilegiado que trata o político ou a autoridade como alguém superior ao cidadão comum e o fim da reeleição para cargos no poder executivo", disse o ex-juiz reproduzindo jargões que Bolsonaro usou em 2018.
Como se vê, Moro entra na disputa presidencial para disputar o eleitorado de extrema direita que exige uma sociedade cada vez mais punitivistas, racista, moralista e que tenha como base, em temos de segurança pública, a chamada "guerra às drogas".
Sergio Moro é um Bolsonaro de sapatênis.