O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Brito, declarou em entrevista à Folha de S. Paulo, que o impeachment, a "mais severa sanção", se aplica a governantes que vivem de costas à Constituição.
"Somente se aplica (impeachment) àquele presidente que adota como estilo um ódio governamental de ser, uma incompatibilidade com a Constituição. É um mandato (governo Bolsonaro) de costas para a Constituição, se torna uma ameaça a ela. E aí o país se vê numa encruzilhada. A nação diz, 'olha, ou a Constituição ou o presidente'. E a opção só poder pela Constituição", disse.
Questionado se a conduta do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é digna de um processo de impeachment, Ayres Britto respondeu que o "conjunto da obra sinaliza o cometimento de crime de responsabilidade. Porém, o processo é de ordem parlamentar".
Na sequência, Britto afirmou que a "sociedade civil vai entendendo que regime democrático é para impedir que um governante subjetivamente autoritário possa emplacar um governo objetivamente autoritário. Se o presidente não adota políticas de promoção da saúde, segmentos expressivos da sociedade - a imprensa à frente - passam a adverti-lo de que saúde é direito constitucional. Prioridades na Constituição não estão sendo observadas: demarcação de terra indígena, meio ambiente".
Ainda sobre o desrespeito à Constituição, o ex-ministro do STF afirmou que "salta aos olhos: ele (Bolsonaro) promove aglomeração, não tem usado máscara, não faz distanciamento social. Respostas como "e daí?" ou "não sou coveiro" não sinalizam um caminhar na contramão da Constituição?", questionou.
Carlos Ayres Britto, que foi nomeado ministro do STF durante a primeira gestão do governo Lula (2002-2010), descartou um golpe nos moldes de 1964 e disse que as Forças Armadas "internalizaram o sucesso civilizatório e não embarcarão em nenhuma canoa furada do autoritarismo".
O ex-ministro também comentou sobre análises que inferem riscos de morte às democracias ocidentais e afirmou que todo regime democrático "vive sob risco de morte" e o que varia "é o tamanho do risco".
"Dois poderosos antídotos contra os democraticidas já existem no país: é que ninguém pode impedir que a imprensa fale primeiro sobre as coisas, nem que o Judiciário fale por último. Assim como já existe aquela parelha de antídotos que se lê no pensamento de Thomas Jefferson, o segundo presidente dos EUA: 'O preço da liberdade é a eterna vigilância'; 'a arte de governar consiste exclusivamente na arte de ser honesto'", disse Ayres Britto.