Escrito en
NOTÍCIAS
el
Segundo ex-ministro, Brasil possui inadimplência histórica com os pobres e essa opção foi levada em conta. "Não se pode atribuir a responsabilidade de todas as falhas operacionais à presidenta"
Por Hylda Cavalcanti, da RBA
Ao prestar depoimento à comissão especial do impeachment, como uma das testemunhas de defesa da presidenta afastada Dilma Rousseff, o deputado e ex-ministro Patrus Ananias (PT-MG) – que foi titular da pasta de Desenvolvimento Agrário e de Desenvolvimento Rural –, afirmou que o pedido de impeachment não poderia ter ocorrido sem considerar uma avaliação dos princípios constitucionais. Segundo ele, "os fatos que integram a denúncia devem ser analisados à luz do interesse público, não isoladamente", uma vez que, conforme explicou, a presidenta cumpriu princípios constitucionais ao garantir recursos para políticas sociais.
"O impedimento com base em um fatozinho específico, ainda que houvesse ocorrido, não poderia ser considerado sem uma avaliação destes princípios constitucionais. Se de um lado temos as responsabilidades fiscais, temos também diretrizes que obrigam políticas que promovam a justiça social e a inclusão", argumentou Patrus.
O ex-ministro afirmou que se os repasses do Tesouro para equalização de juros do Plano Safra junto aos bancos públicos que operam o programa sofreram atraso foi porque para o governo "era mais importante priorizar a continuidade da prestação do programa do que assegurar o reembolso dos bancos". "Essa decisão considera o paradigma do Estado democrático de direito e o bem comum", acrescentou.
Patrus teve sua fala elogiada por vários senadores, principalmente quando disse que o Brasil possui o que chamou de uma "inadimplência histórica com os pobres, os trabalhadores rurais sem-terra, os herdeiros da escravidão, as comunidades indígenas". "A administração pública muitas vezes tem que fazer escolhas entre muitas inadimplências. Entendo que é melhor garantirmos a vida das pessoas e ficarmos com a dívida com bancos, que podem esperar mais", destacou.
O ex-ministro afirmou, ainda, que não existiu responsabilidade ou participação direta da presidenta afastada nas "pedaladas", porque as operações financeiras se dão diretamente entre os bancos e os produtores, e o governo federal entra apenas como "mediador" na equalização de juros. "Não se pode atribuir a responsabilidade de todas as falhas operacionais do governo à presidenta, é preciso considerar a existência de uma estrutura técnica complexa na administração pública".
Ele foi contestado, no entanto, pela senadora Simone Tebet (PMDB-MS), para quem "os atos da presidente devem ser julgados objetivamente" e, pelo que resultaram, na avaliação dela terminaram por prejudicar a assistência social do governo. "Não se faz social sem o orçamento equilibrado. Política fiscal é responsável pela estabilidade econômica, pela distribuição de renda e pelos serviços essenciais", disse Simone.
Já para a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), os depoimentos dados na comissão até agora comprovam que o que está acontecendo é "a pressão de um governo ilegítimo para retirar a presidenta Dilma, justamente pelo projeto desse grupo que o forma, integrado pela equipe interina de Temer e por pessoas que não queriam a continuidade destes projetos sociais".
Ainda hoje é esperado o depoimento, na comissão do impeachment, do ex-ministro Aldo Rebelo, que ocupou as pastas de Esporte e Ciência, Tecnologia e Inovação do governo Dilma Rousseff.
Decretos de crédito suplementar
Os senadores que integram a comissão, mesmo com a tomada de depoimentos das testemunhas estão se dedicando hoje à discussão dos decretos de créditos suplementares, um dos pontos que fundamentam o pedido de afastamento da presidenta Dilma Rousseff.
Como o outro objeto, as pedaladas fiscais, foi descartado pela perícia contábil recentemente realizada e esse resultado foi comemorado pelos que apoiam Dilma Rousseff, o grupo pró impeachment tenta agora argumentar que os decretos contribuiram para que fosse cometida uma fraude fiscal no país. Mas a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), leu documento recente do Ministério da Fazenda do governo provisório, no qual o Executivo afirma que a situação do Brasil é sólida.
"Como estes decretos de crédito suplementar deixaram o país numa situação tão difícil assim se a equipe econômica do governo interino afirma que a situação do país ainda é de solidez?", questionou Kátia. O documento lido por ela foi elaborado pelo Ministério da Fazenda há poucos dias, para avaliar a situação do Brasil diante de impactos a serem observados na economia global, com a saída da Inglaterra da União Europeia, por exemplo. A senadora, que apenas citou trechos desse relatório, afirmou que no seu teor são apresentados fundamentos robustos e detalhados.
Na conclusão da perícia contábil das contas da presidenta afastada, os técnicos disseram que dos quatro decretos de crédito suplementar que constam no pedido de impeachment de Dilma, quatro deveriam ter sido aprovados previamente pelo Congresso Nacional. "Isso tudo é um pano de fundo, a questão que está sendo discutida aqui, já sabemos que é política. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso publicou mais de 100 decretos dessa mesma forma, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também precisou publicar 32 decretos. Agora querem usar isso contra a presidenta Dilma para tirá-la do cargo", afirmou a senadora.
Para o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), que defende o impeachment – e foi ministro da Integração no primeiro governo de Dilma –, os decretos publicados nos governos de FHC e de Lula foram, antes, discutidos e avaliados com muita responsabilidade, assim como aconteceu os primeiros atos do primeiro governo da presidenta Dilma. "O problema foram as mudanças de rumo da condução da economia, já no final do seu primeiro governo", reclamou.
'Farsa desfeita'
A senadora Lúcia Vânia (PSB-GO) disse que a defesa da presidenta estruturou a fala passando de forma paralela no centro do problema, apontado por ela como uma fraude fiscal e econômica feita no país, que acusou ter sido cometida pelos decretos. "Os créditos suplementares e os fundos fiscais se combinam", afirmou Lúcia.
Já para senadores aliados da presidenta, o clima é considerado positivo desde o resultado da perícia entregue ontem, oficialmente, à comissão. Lindbergh Farias (PT-RJ) afirmou que mesmo se o impeachment não for barrado na votação final do Senado, este laudo já dá condições para que ele seja contestado no Supremo Tribunal Federal (STF). "A farsa está sendo desfeita", disse o parlamentar.
Foto: Waldemir Barreto /Agência Senado