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Governo federal deixa de cumprir empenho de dotações orçamentárias para programas de reforma agrária e agricultura familiar, enquanto aumenta verbas para o próprio gabinete e para publicidade oficial
Por Hylda Cavalcanti, na RBA
Levantamento realizado por técnicos legislativos da liderança do PT na Câmara dos Deputados no Ministério do Planejamento e órgãos diversos constatou que, enquanto deixou de cumprir o empenho de dotações orçamentárias para programas sociais previstos para este ano, o governo Michel Temer aumentou em quase R$ 189,1 milhões as dotações para a Presidência da República e R$ 161,5 milhões as verbas para comunicação institucional do Executivo. Ao passo que destinações previstas para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), considerado estratégico para a agricultura familiar e para a concessão do chamado crédito-instalação de famílias assentadas pela reforma agrária, tiveram zero de execução e empenho até hoje.
Estavam previstos e devidamente autorizados para o PAA R$ 200 milhões. E para o crédito- instalação, R$ 946 milhões. Conforme o levantamento, realizado por meio das dotações orçamentárias que constam do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento do Governo (Siop) e divulgadas no Diário Oficial da União (DOU), bem como publicadas pelo Portal da Transparência, a prioridade das ações do presidente que assumiu após o impeachment de Dilma Rousseff praticamente deixa de lado programas de reforma agrária e de agricultura familiar.
Técnicos em orçamento público explicam que, embora aparentemente se imagine que a culpa da falta de execução orçamentária deva ser atribuída aos dois governos – Dilma Rousseff e Michel Temer, uma vez que a presidenta deixou o Palácio do Planalto em maio passado, na verdade, a execução orçamentária dos programas só poderia ter sido iniciada quando Temer já estava no poder. Isso porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LOA) de 2016 – legislação que norteia o Orçamento Geral da União – tramitou com atraso no Congresso Nacional no ano passado. E só foi sancionada em 14 de janeiro deste ano.
Como o orçamento não é uma peça de execução automática, uma vez que depende de prazo razoável para a organização das condições técnicas requeridas para o início da sua operacionalização, os empenhos só começaram a ser autorizados quando Temer já estava ocupando a presidência.
Verbas para a presidência
O governo Temer conseguiu aumentar, no Congresso, as dotações originalmente aprovadas pela LOA para a Presidência da República (PR), de R$ 676,4 milhões, para R$ 866,1 milhões, dos quais 71,5% já empenhados. Essas dotações, conforme o levantamento, incluem verbas para comunicação institucional da PR, originalmente, de R$ 161,9 milhões – e que após a subida de Temer ao poder foram ampliadas para R$ 323,4 milhões – dos quais R$ 238 milhões já empenhados.
A análise dos números mostra, ainda, que em relação às dotações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), além de nada ter saído para o PAA (restando dois meses para o encerramento do exercício, em dezembro), ao mesmo tempo, quando se examina as ações de aquisição e distribuição de alimentos no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, é fácil perceber que dos R$ 473,2 milhões atualmente alocados, R$ 136 milhões foram liquidados. Uma possibilidade, ainda não confirmada pelo ministério sobre a baixa execução é que o Executivo pode ter optado pelas modalidades do PAA que envolvem estados e municípios.
Ainda sob a responsabilidade da Conab, o serviço de abastecimento móvel fluvial, que assiste às comunidades ribeirinhas carentes da Amazônia, igualmente, não teve nem um centavo executado das dotações autorizadas para este ano – da ordem de R$ 14,9 milhões. A ação de formação de estoques públicos, tida como vital para a regulação do mercado de alimentos, teve valor liquidado de R$ 218 milhões (o que corresponde a apenas 7,7% do valor autorizado pela LOA, que foi de R$ 2,4 bilhões).
Os investimentos na ampliação e melhoria da capacidade armazenadora da Conab que contam com dotações atuais de R$ 120,4 milhões, tiveram execução de apenas R$ 8,5 milhões. E quanto à concessão de recursos para o programa de Crédito-Instalação às Famílias Assentadas, já mencionado, do total de R$ 946 milhões autorizados pela LOA, nada foi empenhado ou liquidado.
Quando se avaliam os dados das operações oficiais de crédito para a Agricultura, fica fácil constatar que, tirando o desempenho do governo na ação de subvenção econômica para o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que já executou 78,2% das dotações autorizadas de R$ 5,7 bilhões, para as demais ações o quadro também mostra empenho de zero a, no máximo, 30% do valor previsto pela LOA 2016.
Os números mostram que só são ressalvadas, em relação ao setor de Agricultura, as dotações para o Garantia-Safra, com nível de execução de 75,4% do montante autorizado, de R$ 748,5 milhões.
Conjunto de retrocessos
Para o deputado Patrus Ananias (PT-MG), ministro do Desenvolvimento Social no governo de Luiz Inácio Lula da Silva e do extinto Ministério de Desenvolvimento Agrário na gestão Dilma Rousseff, é muito difícil dizer o que é pior nas ações implementadas pelo atual Executivo, porque elas se complementam.
“O que vemos é um conjunto que vai além do desmonte das políticas sociais. O mais grave, mais urgente, para discutirmos, é que está havendo uma afronta à soberania nacional, na medida em que a soberania de um país como o Brasil pressupõe o desenvolvimento deste país. Desenvolvimento político, fortalecimento das instituições, a consolidação do Estado democrático de direito, desenvolvimento econômico, social, ambiental e cultural”, afirmou.
“Estávamos construindo e queremos ter um país soberano, economicamente forte, com um projeto próprio de nação, socialmente justo, que acolha os direitos e deveres de toda a nação brasileira e comprometido com as gerações futuras. Mas o que estamos vendo com essas operações, é um desmonte do Estado brasileiro como um todo. E isso é muito grave”, acrescentou Ananias.
Segundo o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) a questão é bem mais complexa. De acordo com ele, passa por retrocessos e benefícios para a elite brasileira, observados das mais diversas formas. A deputada Erika Kokay (PR-DF) é da opinião que o governo deixa cada vez mais nítida a opção de privilegiar os mais ricos em detrimento da população mais pobre. O Ministério do Planejamento não se pronunciou a respeito do levantamento.