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Escolas Comestíveis, que surgiu na Califórnia e se espalhou pelo mundo, envolve alunos no plantio e preparo de alimentos
Do Redação na Rua no Porvir*
A forma que as pessoas produzem e consomem alimentos pode ser determinante na relação que têm com o mundo. A partir da perspectiva da educação integral, as refeições também são capazes de envolver a comunidade na produção e consumo dos alimentos e contribuem para convivência de amigos e familiares durante seu preparo. Aliada a essa perspectiva de alimentação consciente e participativa, surgiu em Berkeley, na Califórnia, a iniciativa Edible School Yard (Escolas Comestíveis, em português), no ano de 1995, em parceria com a Universidade da Califórnia.
O projeto visa a envolver estudantes de escolas públicas de ensino fundamental e médio em todos os aspectos da produção de alimentos, em um projeto de educação alimentar que vai do plantio ao preparo. Há uma preocupação de servir e consumir com consciência, de maneira a encorajar mudanças de valores relacionados à nutrição e ao manejo de terra. Durante as aulas, os estudantes são estimulados a preparar refeições, feitas quase sempre com alimentos orgânicos, enquanto se integram com os colegas e professores, em aulas que ocorrem em “cozinhas sala de aula” ou ao ar livre.
Expansão de sementes
Hoje, em todo o mundo, o projeto abrange 4797 locais. Além de 50 estados dos EUA, a Edible School está presente em outros 30 países, como Canadá, Austrália, México, Portugal, Holanda, Marrocos, Senegal e Guatemala. Os espaços, em sua maioria, são compostos pelas chamadas “salas de aula jardins”; existem 4547 delas, que servem como área para o aprendizado. Há também em torno de 700 salas de aulas acadêmicas e 600 “cozinha sala de aula”. Um plano de expansão vislumbra atingir países da América do Sul, tendo o Chile como um primeiro país possível.
A Edible Schoolyard começou seus trabalhos em um lote localizado dentro da Escola Martin Luther King Jr Middle School, instituição pública de ensino médio, também em Berkeley. Foi concebida por Alice Waters, proprietária e chef do renomado restaurante Chez Panisse, conhecida por ser uma das lideranças do Slow Food, movimento que defende um relacionamento sustentável com a alimentação.
Alice passava todos os dias em frente à escola e percebia a subutilização do terreno. Ela levou esse comentário a um jornal, que publicou sua carta. O diretor da escola, Neil Smith, leu a opinião de Alice e a convidou para uma conversa. A abertura do diálogo permitiu à chef ver a oportunidade de aplicar ali um projeto de educação alimentar. Assim, a escola concedeu ao projeto um espaço de 4 mil m² de área livre. Alice, uma ativista pelos direitos à alimentação saudável, viu ali um terreno fértil para cultivar alimentos dentro da escola que depois poderiam ser consumidos pelas crianças no almoço oferecido pela instituição.
Posteriormente, viu-se a oportunidade de promover aulas com esses estudantes. A Edible School Yard Berkeley tornou-se a semente que germinou e se espalhou pelo mundo. O projeto também possui uma extensão na Universidade da Califórnia. O Edible Education 101 é um curso com duração de 4 semestres oferecido aos alunos de graduação. O programa discute agricultura sustentável, crise ecológica e temas relacionados a uma revolução verde sustentável.
Processo de cultivo do Edible School
Durante o primeiro ano letivo do projeto, os estudantes já começaram a usar as colheitas do jardim que florescia na Edible Schoolyard. Foi também nessa época que foi aberta a Cozinha Sala de Aula, espaço equipado para as aulas gastronômicas.
Em 1999, o Distrito Escolar Unificado de Berkeley adotou uma política de alimentação escolar que enfatizava o uso de alimentos orgânicos na merenda e que possuía outros preceitos já presentes nos cursos que aconteciam nos jardins do projeto. Atualmente, o Edible Schoolyard colhe mais de meia tonelada de frutas e legumes todos os anos, além de centenas de espigas de milho e ovos de galinha.
Metodologias
Desde o início do projeto, o propósito é que as crianças possam conquistar autonomia por meio de suas habilidades eco-gastronômicas, sob os pilares da responsabilidade social, economia e sociologia.
A educação alimentar é entendida como multidisciplinar e transversal, não uma mera atividade extracurricular, e está presente nas disciplinas de Ciências, Matemática, Línguas e História.
Assim, desde a etapa de produção do alimento, colheita, até o momento em que está pronto para ser consumido, surgem na cozinha inúmeros temas de aprendizado: a história da origem das comidas, os sistemas métricos, as reações químicas e físicas, entre outros assuntos.
Os professores da Edible School perceberam que ao misturar esses temas em uma panela só, os estudantes compreendiam de forma vivencial e divertida algumas disciplinas e, ao mesmo tempo, percebiam a alimentação como parte integrada de muitos sistemas operados no planeta.
Currículo
O ESY dialoga com o currículo dos estudantes de ensino médio e fundamental. No 6º ano participam em aulas introdutórias de Cozinha e Jardim; já os de 8º ano participam de aulas mais avançadas, que podem envolver equipamentos que necessitam maiores cuidados no manuseio, como fornos para pizzas. Todos os níveis contemplam os padrões de um currículo escolar, e incluem álgebra para a escala das receitas.
Durante o 6º ano, por exemplo, o programa contempla 18 aulas: 15 trazem o tema da Ciências, 2 são sobre Humanidades e uma se concentra nas abelhas e polinizadores de jardim. Em Humanidades, é apresentada a história da Mesopotâmia, por meio do aprendizado da irrigação e tecnologia agrícola. Na disciplina de Ciências, as crianças entendem sobre erosão do solo, o processo de compostagem e de colheita, além de terem a percepção da água como elemento não renovável. A Matemática está inserida na disciplina de Ciências: em uma aula são apresentados conceitos de volume e deslocamento durante a produção da cidra de maçã.
Além disso, em todos os níveis as crianças produzem poesia a partir de suas vivências em salas de aula.
Principais resultados
O currículo integrado desenvolve nos estudantes a curiosidade, habilidades para trabalhar em grupo e para iniciar e finalizar bem um trabalho; também se exercita o respeito mútuo e a apreciação da diversidade. Um dos aprendizados mais importantes é a percepção de que o ritual de comer em companhia pode conectar famílias e comunidades.
O ciclo de aprendizado passa pelas relações de professor com estudante e é seguido na comunicação destes com os pais, que aprendem sobre o conteúdo vivenciado pelos filhos.
Como medida de aproximação da família, há um encontro semestral que possibilita uma intensa vivência entre pais e filhos. No “Dinner Out”, por exemplo, os estudantes convidam seus pais para jantarem fora de casa, porém, dentro da escola. Nessa noite, eles também ajudam no preparo, com a orientação dos filhos, que apresentam, então, todos os saberes adquiridos.
Já na relação das crianças e jovens perante a sociedade, é percebida uma maior compreensão da responsabilidade para preservar o meio-ambiente, assim como o papel ativo que devem ter na comunidade. Ao compartilhar o aprendizado com as famílias e a comunidade, eles captam o impacto que esse processo teve em suas vidas, quando notam o alcance de seus conhecimentos.
*Fazem parte do Redação na Rua os sites Catraca Livre, Centro de Referências em Educação Integral, Guia de Empregos, Portal Aprendiz, Porvir e VilaMundo.