Venezuela nega que tenha impedido pouso de avião com senadores brasileiros em Caracas

Organizada por Aécio Neves e Aloísio Nunes para “prestar solidariedade a presos políticos”, a missão parlamentar requisitou aeronave da FAB para o deslocamento

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Organizada por Aécio Neves e Aloísio Nunes para “prestar solidariedade a presos políticos”, a missão parlamentar requisitou aeronave da FAB para o deslocamento

Por Vanessa Martina Silva, do Opera Mundi

O governo da Venezuela negou nesta terça-feira (16) que tenha impedido o pouso em Caracas de um avião militar da FAB (Força Aérea Brasileira) levando a bordo parlamentares brasileiros. Fontes da diplomacia venezuelana desmentiram que a aterrisagem não teria sido autorizada, conforme foi noticiado pela imprensa na segunda (15).

A missão, que viajará na quinta-feira (18), está sendo organizada, a convite da oposição venezuelana, pelos senadores Aécio Neves e Aloísio Nunes, ambos do PSDB, para "prestar solidariedade aos presos políticos e às pessoas que são vítimas da repressão", como caracteriza o próprio Nunes.

Procurada, a assessoria do senador Aécio Neves afirmou que interpretou como "uma negativa" a falta de pronunciamento do governo Maduro após o pedido de autorização. Fontes diplomáticas da Venezuela disseram a Opera Mundi, entretanto, que a solicitação só chegou aos meios oficiais às 12h desta terça-feira, período após o qual foi emitida a autorização para o pouso — como trata-se de aeronave militar, é necessário o aval do governo venezuelano para realizar o deslocamento.

A assessoria do senador esclareceu ainda que "o Ministério da Justiça também não havia dado resposta oficial à solicitação do Congresso para utilizar a aeronave do Exército" e que, assim, os parlamentares deveriam viajar em um avião comercial.

"Ingerência"

Na opinião do deputado do PT Rogério Correia, que organiza, como reação à iniciativa tucana, uma delegação rumo à capital venezuelana integrada por pessoas ligadas à esquerda — como o escritor Fernando Morais e o líder do grupo Fora do Eixo, Pablo Capilé —, a atitude dos senadores de oposição é “uma ingerência inoportuna à Venezuela”.

Os senadores do PSDB argumentam que a viagem, de caráter humanitário, tem com objetivo averiguar as condições em que se encontra Leopoldo López, em greve de fome há 22 dias, que consideram ser preso político, solicitar sua libertação, além de pedir o estabelecimento de uma data para a realização das eleições parlamentares no país sul-americano.

"Tratam-se de pessoas que se opõem ao governo e que foram presas por causa disso", ressalta Aloísio Nunes (PSDB-SP) a Opera Mundi, quando questionado sobre o posicionamento em defesa de Leopoldo López e Antonio Ledezma, detidos por incitação à violência nas manifestações de 2014 e por atuação em plano de tentativa de golpe contra o governo de Nicolás Maduro, respectivamente. E continua: "Eles não são os únicos, são vários e não é de hoje que [ocorrem] violações de direitos humanos [na Venezuela] em nossa opinião”.

A posição é contestada pelo mineiro Correia, segundo quem trata-se de uma interferência no país, “que vive seus dilemas e seu processo democrático”. Ele disse ainda que o governo venezuelano “garante liberdade política e tenta resolver os problemas internos”. Para o deputado petista, a visita do ex-presidente espanhol Felipe González — e, de maneira análoga, a viagem dos senadores brasileiros — tem como objetivo “justificar um golpe como o que ocorreu no Paraguai. Eles [tucanos] tentam não só desestabilizar o governo da Venezuela como também o governo [da presidente] Dilma [Rousseff]”. Na visão do deputado, “como agora não há mais como fazer golpes militares, eles querem fazer golpes por meio da judicialização, da intervenção da mídia, das mentiras internacionais. Tudo isso para justificar uma intervenção conservadora”.

Outro ponto controverso da viagem é que de acordo com a assessoria de Aécio Neves, a agenda da viagem a Caracas está sendo organizada pela ex-deputada Maria Corina Machado e as esposas de Antonio Ledezma e Leopoldo López, Mitzy Capriles e Lilian Tintori, respectivamente, e não há previsão de encontro com representantes do governo.

A visita, no entanto, que além de Aécio e Nunes terá a presença dos senadores Romero Jucá (PMDB-RR), Sérgio Petecão (PSD-AC) e Fernando Bezerra (PSB-PE), não tem relação com o requerimento 77/2015 de 2 de fevereiro deste ano, como confirmou a assessoria do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que propôs o envio de uma comissão do Senado a Caracas “com o fim de verificar in loco a situação na Venezuela, estabelecer diálogo com membros do parlamento local, e com interlocutores representativos das oposições e da sociedade civil, bem como, se possível, com as autoridades daquele querido país irmão”.

Na comissão liderada por Correia, que apoia o governo venezuelano, estarão, além do próprio deputado, de Fernando Morais e Pablo Capilé, o deputado federal João Daniel (PT-SE), o presidente do sindicato dos jornalistas de Minas Gerais, Kerison Lopes Santos, o blogueiro Miguel do Rosário e o jurista e professor da PUC-MG, José Luiz Quadros de Magalhães.

Direitos humanos

Na visão de Correia, “não há nenhuma legitimidade [por parte dos senadores que integram a comissão] de falar em nome dos direitos humanos. Eles tentaram incentivar movimentos golpistas no Brasil, pediram recontagem de votos e trabalham com uma postura antidemocrática, além de defender temas como a diminuição da maioridade penal. Além disso, em Minas Gerais houve o caso de dois presos políticos: o jornalista [Marco Aurélio] Carone e o [lobista] Nilton Monteiro, que denunciaram a formação de Caixa Dois em Furnas”.

À época da detenção, em janeiro de 2014, Carone, que juntamente com Monteiro tornou pública a “Lista de Furnas”, sobre o esquema de desvio de dinheiro da estatal nos governos tucanos de Minas Gerais, afirmou: “Eu sou um preso político. Estou sendo preso por questões políticas. Quem me conhece sabe do meu trabalho, tenho 30 anos de profissão. Estou tranquilo e vou provar que isso não corresponde à verdade. Fiquei conhecendo o promotor hoje aqui, ele chegou me agredindo verbalmente. Meu passado me defende”.

Já o bloco parlamentar “Minas Sem Censura”, que reunia deputados estaduais de PT, PMDB e PCdoB, acusou os aliados de Aécio Neves, à época candidato à Presidência, de orquestrar a prisão como forma de censura: “Se você estabelece a prisão para evitar a publicação de material jornalístico, está oficializada a censura prévia”, disse Rogério Correia, que era vice-líder do bloco.

Questionada, a assessoria do senador Aécio Neves afirmou que a prisão de Carone não ocorreu durante o governo de Aécio [2003-2010], mas quatro anos depois e que, “apesar das calúnias e difamações sofridas, o senador nunca moveu nenhum processo contra os citados” e que as detenções de ambos "foram pedidas pelo Ministério Público e determinadas pela Justiça”.

Ex-guerrilheiro

Um dos proponentes da comitiva, Aloísio Nunes foi, durante o período da ditadura civil-militar brasileira, integrante do movimento de luta armada ALN (Ação Libertadora Nacional) e lutou, ao lado de Carlos Marighella, contra o regime ditatorial e em defesa da democracia.

Questionado sobre se não haveria constrangimento em mobilizar-se para defender os indivíduos acusados pelo governo venezuelano de desestabilizar o presidente Nicolás Maduro e incitar um golpe de Estado, o senador, antes de desligar o telefone, respondeu: "A opinião da grande maioria das pessoas que observam a cena política venezuelana é o contrário, de que há ações violentas por parte de partidários do governo e vítimas das ações policiais".

(Foto: George Gianni/ PSDB)