A jornalista Vanessa Ricarte, de 42 anos, vítima de feminicídio pelo ex-noivo Caio Nascimento na última quarta-feira (12) em Campo Grande (MS), relatou descaso da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) horas antes de ser morta a facadas. O áudio de Vanessa foi divulgado pelo g1.
Na gravação, a jornalista afirma ter ficado "bem impactada" com o atendimento da Deam, um dos serviços disponibilizados pela Casa da Mulher Brasileira, e relatou que a delegada a tratou de forma prolixa, fria e seca.
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"Eu to bem impactada com o atendimento da Casa da Mulher Brasileira. Eu que tenho toda instrução, escolaridade, fui tratada dessa maneira, imagine uma mulher vulnerável, sem ter uma rede de apoio nenhuma. Essas que são mortas, essas que vão para estatística do feminicídio", disse Vanessa.
“Fui falar com a delegada, fui tentar explicar toda a situação, ela me tratou bem prolixa, bem fria, seca. Toda hora me cortava", acrescentou.
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Vanessa tinha ido à delegacia especializada registrar boletim de ocorrência contra Caio. Além disso, ela também tentou pedir à delegada o histórico do ex-noivo, pois havia descoberto que ele teria outras denúncias de violência à mulher. A delegada, porém, afirmou que os documentos eram sigilosos.
“Parece que tudo protege o cara, o agressor. Ela passou aqui o telefone da oficial de justiça, passou a senha do processo pra eu ficar consultado, e do boletim de ocorrência ela disse que não adianta acrescentar, que não vai mudar muita coisa porque já foi para o judiciário", diz a jornalista no áudio.
Vanessa ainda acrescenta que a delegada não tinha entendido a gravidade da situação, tendo mandado a jornalista voltar para a casa mesmo com o agressor na residência.
“Falei que precisava ir pra minha casa, faz dois dias que eu não tomo banho, não troco de roupa. Aí ela: então vai pra sua casa. Você já avisou ele? manda mensagem falando pra ele deixar a casa. Eles não entendem a dimensão do negócio”.
“Eu estou esgotada mentalmente falando, perdida. Sabe quando você está decepcionada. Me sentindo culpada porque eu fui registrar o BO hoje de madrugada”, desabafou.
Horas depois, Vanessa foi morta com três facadas no tórax.
A jornalista era chefe da assessoria de imprensa do Ministério Público do Trabalho (MPT) e foi a segunda vítima de feminicídio em Mato Grosso do Sul em 2025. Seu velório foi realizado na quinta-feira (13) na Câmara Municipal de Campo Grande.
Apuração do atendimento da Deam
O Ministério das Mulheres se pronunciou sobre o caso e afirmou que encaminhou um ofício à Corregedoria da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul solicitando a abertura de procedimento investigativo para apurar o atendimento prestado à Vanessa.
A pasta ainda informou que a Patrulha Maria da Penha deveria ter acompanhado a jornalista até em casa "de acordo com o protocolo de avaliação de risco para mulheres em situação de violência e que orienta o atendimento na Casa da Mulher Brasileira".
Uma equipe do Ministério também viajou até Campo Grande para intensificar a apuração.
"O órgão se solidariza com familiares, amigos e amigas de Vanessa e reafirma o compromisso de atuar pela prevenção e enfrentamento a todos os tipos de violência contra as mulheres, em especial o feminicídio, com investimentos em diversas políticas públicas focadas em informação e em atendimento. Nenhuma violência contra a mulher deve ser tolerada", escreveu o órgão.
O delegado-geral da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul, Lupérsio Degeroni Lúcio, também informou que uma investigação será aberta para apurar o atendimento da Deam.
“Quero ressaltar que, por orientação do governo do Estado e do secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, determinei um procedimento apuratório para verificar eventuais falhas nesse atendimento, no âmbito da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher. A Polícia Civil está e estará sempre do lado da vítima e dos familiares. Externamos a nossa solidariedade”, disse o delegado-geral.