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A escritora Cidinha da Silva comenta a portaria que garante às mulheres 30% de vagas de trabalho nas empresas prestadoras de serviço de ônibus em São Paulo
Por Cidinha da Silva*
É uma afirmação romântica a de que o prefeito Fernando Haddad determinou cota de 30% para as mulheres nas empresas de ônibus prestadoras do serviço à cidade de São Paulo porque uma motorista solicitou. Ou porque ele ficou impressionado com o quanto a solicitante dirigia bem.
Pode ser que a conversa inicial tenha motivado estudos técnicos que duraram seis meses até chegarem à portaria da administração municipal de dezembro de 2015 sobre o tema. A real é que as mulheres são um fenômeno crescente na direção de máquinas pesadas, caminhões, carretas, empilhadeiras. E isso tende a acontecer também com os ônibus.
Registre-se que o competitivo mercado de trabalho para motoristas no transporte rodoviário de cargas brasileiro tem apresentado dados interessantes quanto às questões de gênero.
O mercado é grande e carece cada vez mais de mão de obra qualificada para lidar com equipamentos e a elaboração de projetos logísticos cada vez mais complexos.
As mulheres, figuras raras nas transportadoras há dez anos, agora têm preenchido uma lacuna importante no setor. Na empresa Braspress, uma das líderes nacionais na distribuição de encomendas expressas, as mulheres são um quadro crescente nas operações, seja como motoristas, seja como encarregadas de postos importantes nas etapas da gigantesca produção da empresa.
Nessa transportadora, 209 motoristas urbanas e 8 de carretas formam o time de 217 mulheres atrás do volante dos caminhões. Isso mesmo, 217 mulheres em uma única empresa dirigindo máquinas pesadas (42% do total de motoristas da empresa). Os homens contabilizam 341.
O programa de contratação de mulheres motoristas começou em 2004 e, segundo a Braspress, o dia a dia das atividades mostrou que a empresa havia encontrado nessa ação afirmativa um dos caminhos para o aumento da produtividade e da melhoria da capacitação profissional no setor de transporte rodoviário de cargas.
Os registros de manutenção das máquinas na empresa demonstram que as motoristas mulheres têm maiores cuidados operacionais com os veículos, colaborando para a manutenção dos caminhões. Demonstram polidez no relacionamento com os clientes e no trânsito. São pacientes, praticam direção defensiva, pouco se envolvem em acidentes nos trajetos, o que levou à redução de batidas e dos custos de manutenção, incluindo funilaria, um custo alto para as empresas de transporte.
As mulheres enfrentam com galhardia o mito machista de que não teriam qualificações intrínsecas para dirigir ônibus, caminhões, carretas e empilhadeiras, entre outras máquinas pesadas. As ações afirmativas do poder público devem mesmo reforçar sua atuação e prover condições para que elas ocupem todos os espaços que quiserem.
*Cidinha da Silva é escritora. Publicou, entre outros, Racismo no Brasil e afetos correlatos (Conversê, 2013) e Africanidades e relações raciais: insumos para políticas públicas na área do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil (FCP, 2014). Despacha diariamente em sua fanpage
Foto de capa: Divulgação/Braspress