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Casal fotografa mulheres amamentando seus filhos em espaços públicos para disseminar a ideia de que nutrir um bebê não deve ser nenhum constrangimento para a mãe
Por Andreia Verdélio, da Agência Brasil
O casal de fotógrafos de Brasília Irmina Walczak e Sávio Freire já encontraram uma forma de contribuir para a construção de um mundo melhor. Por meio da fotografia, os dois ajudam a naturalizar o ato da amamentação. Eles desenvolvem o projeto Mamaço no Espaço e fotografam mulheres amamentando seus filhos em espaços de frequentação pública para disseminar a ideia de que nutrir um bebê não deve ser nenhum constrangimento para a mãe.
Em agosto, durante a Semana Mundial de Amamentação e por estarem vivendo a experiência do nascimento do segundo filho, os fotógrafos tiveram a ideia. Eles fizeram uma chamada, via Facebook, e receberam mais de 100 e-mails de mulheres querendo participar. O que era para ser uma atividade de apenas uma semana, acabou virando um projeto de longo prazo. Irmina e Sávio abriram, então, a conta mamaço_no_espaco, no Instagram, para divulgar as fotos e fazer contato com as mães.
Mas o objetivo, segundo eles, é chegar àqueles que ainda têm algum preconceito ou estranham a situação de alguém amamentar em público, por isso querem fazer algum tipo de intervenção permanente como fixar as fotografias nos locais onde foram tiradas para marcar aqueles espaços. “Fazer um mapa mamaço de Brasília”, simplificou Irmina.
Quinze mães já foram fotografadas. A antropóloga e professora de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília, Rosa Carneiro, apoiadora do projeto e mãe do Bento, de 2 meses, disse que algumas mulheres contam que são assediadas, em alguma medida, por outros homens pelo simples fato de estarem com o seio à mostra. “É uma total confusão do que é a sexualidade feminina e o processo de nutrição do bebê. Como se o corpo da mulher continuasse a ter só uma visão, que é essa perspectiva da sexualidade para o outro, e não uma outra leitura, que é a amamentação e a nutrição dos bebês”, explicou.
Na percepção de Rosa, há um movimento, dos anos 2.000 para cá, de mulheres reagindo a isso, de recuperação do parto normal e do processo de amamentação prolongado. Diferente do que acontecia entre os anos 1960 e 80, quando “o leite em pó era veiculado como o melhor alimento para os bebês”. “Esse é um papel social das mulheres, mas as pessoas tendem a alocar isso [a amamentação] no âmbito do privado e do doméstico. Precisamos romper com esse pensamento porque estamos formando crianças que amanhã cuidarão do mundo”, disse.
Para o professor de Ciências Políticas do Centro Universitário UDF, Anderson Nascimento, pai do Bento, as políticas públicas estão tentando se adaptar a isso, mas ainda existe muita resistência corporativa e visões estigmatizadas. “Se uma mulher é assediada em um espaço público, por exemplo, ainda falta uma capacidade ao ente público, um policial ou algum funcionário do local, de defender a posição da mulher e proteger ela daquilo [o assédio]. Até que ponto uma norma, uma lei consegue alterar essa realidade? É um processo mais lento e histórico que vai depender da própria concepção das pessoas, mas temos que começar do pequeno”, disse.
Para Irmina, além do machismo e conservadorismo tradicionais, existe também o preconceito. “As mulheres saíram de casa, elas trabalham e se realizam profissionalmente, então tem as pessoas que não curtem a ideia dessa mulher abandonar isso [essas conquistas] para ficar com o filho e dar o peito, voltar a ser só mãe”, disse.
Pelo projeto Mamaço no Espaço, já foram fotografadas mamães e bebês em lugares como a Torre de TV, o Buraco do Tatu, a Universidade de Brasília, o Aeroporto Juscelino Kubitschek, a Praça dos Três Poderes, um supermercado e um café. Durante a entrevista à Agência Brasil, a doula Nina de Carvalho Schubart foi fotografada amamentando seu filho Martim, de 1 ano e 3 meses, na Feira dos Importados.
“Uma vez estava na área de desembarque do TST [Tribunal Superior do Trabalho], onde sempre fiquei esperando meu marido e sempre tem carros que ficam meia hora, uma hora. Sentei no banco de trás com a porta aberta e estava amamentando. Então, veio um rapaz, sem crachá, sem identificação, e disse que eu não poderia ficar ali esperando. Eu acho que foi uma situação que aconteceu pelo fato de eu estar amamentando. Fiquei muito nervosa mas continuei lá”, contou Nina.
Ela diz ainda que existem momentos em que ninguém pede para ela se retirar ou se cobrir enquanto amamenta, mas mesmo assim ela se sente desconfortável pelos olhares das pessoas em volta. Para Nina, o próprio incentivo a amamentação, o apoio dos bancos de leite e das famílias, além das salas de amamentação implementadas em várias empresas, podem ajudar a naturalizar o ato. “Talvez colocar mais na mídia também, em novelas, filmes e tudo que atinja o grande público, e não só quem está voltado para a maternidade”, disse Nina.
Este é o terceiro projeto fotográfico que Irmina e Sávio desenvolvem. O primeiro, Retratos para Yayá, veio com o nascimento da primeira filha, Yasmin, hoje com 4 anos, e incentiva o contato das crianças com a natureza. “Nós fotografamos ela em um conceito de infância livre, sem tecnologia, sem televisão. Moramos em uma chácara e ali ela se desenvolve e interage com o ambiente”, contou Irmina.
A fotógrafa explica que o segundo projeto, chamado De Dentro, foi como uma arteterapia para ela. Irmina planejava um parto normal para Yasmin, mas acabou sendo submetida a uma cesárea de emergência. “Então tive esse ressentimento, essa frustração e essa incerteza. Como no Brasil estamos nessa ambiguidade recentemente entre parto normal e cesárea, eu estava na dúvida se realmente tinha que ser cesária. Aí fui fotografando as grávidas, eram mulheres no fim de gestação e elas contavam as suas experiências e seus medos”, explicou. “É um projeto que já acabou porque eu senti que curei. Ele [o filho mais novo, Kajetan, de 3 meses] nasceu de parto normal. Consegui superar”, finalizou Irmina.
Foto de capa: Elza Fiúza/Agência Brasil