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A tentativa de homicídio foi registrada na Polícia Civil da cidade. O atentado é atribuido a produtores rurais da região, em disputa pela posse de territórios reivindicados como tradicionais pelos
Por Ruy Sposati, de Dourados (MS), no Cimi
[caption id="attachment_37571" align="alignleft" width="300"] Carro incendiado (Foto: Ruy Sposati)[/caption]
Quatro homens encapuzados atearam fogo no carro do indígena Paulino Terena (na foto abaixo), liderança da retomada Pillad Rebuá, no município de Miranda (MS), região do Pantanal, na madrugada desta sexta-feira, 6. Paulino estava dentro do carro, teve algumas lesões e fará exame de corpo de delito hoje, mas passa bem. A tentativa de homicídio foi registrada na Polícia Civil da cidade. O atentado é atribuido a produtores rurais da região, em disputa pela posse de territórios reivindicados como tradicionais pelos Terena. As informações são da liderança indígena. Na foto ao lado, o carro incendiado.
Por volta das três horas da manhã, Paulino se deslocava dentro da aldeia Moreira em seu veículo, quando avistou uma caminhonete desconhecida dentro da área retomada. Seguiu na direção do veículo. Ao se aproximar, dois homens encapuzados desceram da caminhonete e jogaram combustível no carro de Paulino. "Quando vi um deles riscando o fósforo, eu saí imediatamente do carro. Fiquei molhado de gasolina", conta o indígena.
"Eles me seguraram e tentaram por fogo em mim. Mas os fósforos quebravam. Eles só conseguiram colocar fogo no carro, que queimou todo. Na sequência, uma moto se aproximou. Eu consegui me livrar deles e saí correndo para o mato. Um deles gritava: 'eu vou matar esse cara!'. 'Tem que queimar tudo esses bugres', um outro falou", relata. Os indígenas informaram a Polícia Militar sobre o caso, que não atendeu a ocorrência. Por volta das seis da manhã, o delegado da Polícia Civil esteve no local parar apurar o caso.
Ameaça de morte
Paulino vem denunciando as sucessivas ameaças de morte que tem recebido. No último mês, durante a 4a. Assembleia do Povo Terena, a comunidade de Pillad entregou uma carta ao Conselho Terena, relatando que "[fazendeiros] querem a cabeça dele [Paulino] como troféu".
Segundo o documento, um ex-empregado de uma fazenda que incide sobre o território reivindicado pagaria dinheiro a dois jovens indígenas "para passarem informação de tudo que está sendo articulado naquele lugar", e que estes jovens teriam levado um "recado" de fazendeiros para Paulino: "ele quer tirar a sua cabeça fora".
Também em Miranda, um ônibus que realizava transporte de alunos Terena foi incendiado durante a madrugada do dia 28 de novembro. O veículo, que estava vazio, levava diariamente cerca de 30 estudantes do ensino fundamental e médio de toda a Terra Indígena Cachoeirinha, onde também há conflito com fazendeiros.
Em 4 de junho de 2011, um ônibus que transportava cerca de 30 estudantes Terena, a maioria entre 15 e 17 anos, foi atacado com pedras e coquetéis molotov. Seis pessoas, incluindo o motorista, sofreram queimaduras. Quatro foram internadas em estado grave. A estudante Lurdesvoni Pires, de 28 anos, faleceu, vítima de ferimentos causados pelas queimaduras. Na época, lideranças Terena creditaram o ataque a proprietários rurais da região, no contexto da disputa pela demarcação das terras indígenas.
Decisão favorável
No último dia 4, a Justiça Federal em Campo Grande suspendeu o processo de reintegração de posse da Chácara Boa Esperança, umas das propriedades rurais que incidem sobre o território reinvindicado pelos indígenas como Pillad Rebuá, e que em outubro foi ocupado por famílias da aldeia Moreira. Ernesto Milani, proprietário da fazenda, entrou com pedido de reintegração de posse contra comunidade. Além de ter suspendido a reintegração por seis meses até que a Fundação Nacional do Índio (Funai) conclua o laudo antropológico da área, a juiza Janete Lima Miguel, da 2a. Vara de Campo Grande da Justiça Federal, determinou que os indígenas permaneçam na área retomada, liberando apenas a sede da fazenda para o proprietário.
Durante a audiência, os advogados de defesa da comunidade indígena relatam que Ernesto Milani teria dito à juíza que, em Miranda, "há 80 homens prontos para entrar e matar os índios", e que somente não teriam executado esta ação porque ele não havia dando autorização, mas que "eles estão lá reunidos, estão à disposição".
Histórico
Os 2,2 mil indígenas Terena de Pillad Rebuá, até as retomadas, viviam em 94 hectares, divididos em duas aldeias, Moreira e Passarinho. Pillad teve o primeiro registro de reconhecimento pelo Estado em 1904. Um processo de demarcação teve início em 1950, mas não seguiu.
Em outubro, cerca de 300 indígenas do povo Terena retomaram duas propriedades localizadas dentro de Pillad, exigindo que fosse instituído o Grupo de Trabalho (GT) para finalizar o processo de identificação e demarcação da terra indígena, cuja dimensão apontada nos laudos iniciais da Fundação Nacional do Índio (Funai) é de 10.400 hectares.
Em 10 de novembro, cerca de 300 indígenas Terena foram atacados por homens armados em caminhonetes depois de terem ocupado a fazenda. Cápsulas de 9mm foram encontradas no local e entregues à Polícia Federal. Na sede da propriedade foram encontrados diversos buracos de bala no telhado, paredes e em um bebedouro.
Dois dias depois, fazendeiros expulsaram à tiros indígenas que haviam retomado a área de uma outra fazenda que incide sobre a área reivindicada como terra indígena Pillad Rebuá. Um trator pertencente à comunidade também foi incendiado. Ninguém ficou ferido.